Diego Galbinski
Prezado(s) Senhor(es),
- Em 31/03/2025, Companhia X (“Consulente“) registrava o valor de R$ 12.243.950,00 (doze milhões, duzentos e quarenta e três mil e novecentos e cinquenta reais), no Ativo – Não Circulante, a título de “ICMS a Recuperar”. Esta quantia foi acumulada pela Consulente em decorrência da manutenção dos créditos fiscais de ICMS destacados nas notas fiscais de aquisição de matérias-primas e embalagens, conforme o Anexo X, Item 12.3, ‘b’, do Decreto n. 48.589, de 22 de março de 2023 (“RICMS/MG“). No Estado de Minas Gerais, as operações de saída interna de ovo in natura praticadas pela Consulente são isentas do ICMS (RICMS/MG, Anexo X, Item 12.h).
1.1 Dado o acúmulo de créditos fiscais de ICMS, foram elaborados memorandos sucessivos, a fim de que fossem avaliadas hipóteses de sua realização. Em 20/12/2024, sobreveio a Lei n. 25.071 (“Lei n. 25.071/2024“), que instituiu leilão reverso para aquisição pelo Estado de Minas Gerais de créditos fiscais acumulados de ICMS por estabelecimento criador de aves, com deságio mínimo de 25 % (vinte e cinco por cento).
1.2 Sendo assim, a Consulente questiona:
1.2.1 Quais são as alternativas legais que permitem a conversão dos créditos fiscais acumulados de ICMS em caixa ou redução de obrigações tributárias?
1.2.2 Caso a Consulente delibere pela baixa total ou parcial dos créditos fiscais acumulados de ICMS, quais serão os seus efeitos contábeis e fiscais?
1.2.3 Quais são as providências para evitar a acumulação, no futuro, de créditos fiscais de ICMS?
- Com relação às alternativas legais que permitem a conversão dos créditos fiscais acumulados de ICMS em caixa ou redução de obrigações tributárias, destacamos as seguintes:
2.1 Transferência direta a terceiros (RICMS/MG, Anexo III, Art. 28):
2.1.1 A título de pagamento pela aquisição de caminhonete destinada ao transporte exclusivo de carga, com carroceria aberta ou furgão, de caminhão, de trator, de locomotiva, de máquina ou equipamento, novos, destinados a integrar o ativo imobilizado da Consulente, mediante regime especial concedido pelo Superintendente de Tributação (RICMS/MG, Anexo III, Art. 28, I, § 1.º);
2.1.2 Cessão a centro de distribuição de rede varejista de medicamentos, limitada a 5% (cinco por cento) do faturamento do adquirente dos créditos fiscais acumulados de ICMS, mediante regime especial concedido pelo Superintendente de Tributação (RICMS/MG, Anexo III, Art. 36);
2.2 Leilão reverso do Estado de Minas Gerais, com deságio mínimo de 25% (vinte e cinco por cento) (Lei n. 25.071/2024); e
2.3 Compensação com débitos próprios, gerados por operações sujeitas à tributação pelo ICMS (por exemplo, caso Contratante y).
- No que diz respeito à segunda pergunta, a deliberação da Consulente pela baixa total ou parcial dos créditos fiscais acumulados de ICMS depende do teste de recuperabilidade, previsto pelo CPC 01. De acordo com este teste, a Consulente deverá estimar o valor recuperável do ativo registrado em “ICMS a Recuperar”, com base em cash flows esperados de realização (transferência(s), leilão(ões) ou compensação(ões)). Caso o valor contábil exceda o valor recuperável, a Consulente poderá reconhecer a perda por impairment, a fim de ajustar o valor do ativo ao montante estimado de recuperação.
3.1 A decisão da Consulente pela baixa total ou parcial dos créditos fiscais acumulados de ICMS deverá ser formalizada por ata do Conselho de Administração e suportada por parecer (jurídico ou contábil) e documentação comprobatória (tentativas de transferência, indeferimentos dos pedidos de concessão de regime especial, etc.).
3.2 Deliberada a baixa total ou parcial dos créditos fiscais acumulados de ICMS, sugerimos os seguintes lançamentos contábeis:
3.2.1 Baixa direta (se se concluir pela irrecuperabilidade total):
3.2.1.1 D Despesa com Baixa de Créditos Fiscais (resultado) R$ 12.243.950,00;
3.2.1.2 C ICMS a Recuperar (ativo não‑circulante) R$ 12.243.950,00;
3.2.1.3 Efeitos: redução imediata do ativo e impacto sobre o resultado;
3.2.2 Baixa por provisão (irrecuperabilidade parcial ou sujeita à confirmação):
3.2.2.1 Constituição da provisão (fim do exercício):
3.2.2.1.1 D Despesa com Perdas Estimadas de Créditos Fiscais R$ 12.243.950,00 (ou valor estimado);
3.2.2.1.2 C Provisão para Perdas – Créditos de ICMS (conta redutora do ativo) R$ 12.243.950,00 (ou valor estimado);
3.2.2.2 Efetivação da baixa no exercício subsequente:
3.2.2.2.1 D Provisão para Perdas – Créditos de ICMS (conta redutora do ativo) R$ 12.243.950,00 (ou valor estimado);
3.2.2.2.2 C ICMS a Recuperar R$ 12.243.950,00 (ou valor estimado);
3.2.2.3 Reversão (se parte do crédito for posteriormente realizada):
3.2.2.3.1 D ICMS a Recuperar R$ (parte do crédito posteriormente realizada);
3.2.2.3.2 C Reversão de Perdas em Créditos Fiscais (resultado) R$ (parte do crédito posteriormente realizada).
3.3 Quanto aos efeitos fiscais da deliberação da Consulente pela baixa total ou parcial dos créditos fiscais acumulados de ICMS, pontuamos os seguintes:
3.3.1 IRPJ/CSLL:
3.3.1.1 As despesas de provisão são indedutíveis (Decreto n. 9.580, de 22 de novembro de 2018, Art. 339), enquanto as despesas de baixa são dedutíveis para a apuração do lucro real (Decreto-lei n. 1.598, de 26 de dezembro de 1977, na redação da Lei n. 12.973, de 13 de maio de 2014, Art. 31).
3.3.1.2 Porém, a dedutibilidade das despesas de baixa está condicionada à prova produzida pela Consulente a respeito da impossibilidade de recuperação dos créditos fiscais acumulados de ICMS.
3.3.2 PIS/COFINS:
3.3.2.1 No regime não cumulativo, a base de cálculo do PIS e COFINS é a receita bruta (Lei n. 10.637, de 30 de dezembro de 2002, Art. 1.º; Lei n. 10.833, de 29 de dezembro de 2003, Art. 1.º). Despesas ou perdas — como a baixa dos créditos fiscais acumulados de ICMS — não reduzem a base de cálculo do PIS e COFINS, portanto.
3.3.2.2 Tampouco a baixa dos créditos fiscais acumulados de ICMS gerará créditos não cumulativos de PIS e COFINS. Como os créditos não cumulativos do PIS e COFINS são apurados no momento da aquisição do bem ou serviço, a baixa posterior do ICMS a recuperar não alterará o custo originalmente registrado.
3.3.2.3 Haverá, porém, o seguinte reflexo assimétrico: se, após a baixa, parte do crédito for realizada (por exemplo, transferência a terceiros ou leilão reverso), o valor recuperado será registrado como receita e integrará a base de cálculo do PIS e COFINS (Lei n. 10.637, de 30 de dezembro de 2002, Art. 1.º, § 3.º, V, ‘b’; Lei n. 10.833, de 29 de dezembro de 2003, Art. 1.º,§ 3.º, V, ‘b’).
3.3.2.4 Na EFD Contribuições, eventuais reversões deverão ser informadas no registro F600 como “outras receitas” sujeitas ao PIS e COFINS.
3.3.3 ICMS
3.3.3.1 A baixa dos créditos fiscais acumulados de ICMS deverá ser registrada como estorno do crédito na EFD ICMS/IPI, bloco E, registro E111 (ajuste de apuração) com código MG‑AJUSTE‑BAIXA.
3.3.3.2 Também é recomendável o arquivamento de pedido de cancelamento do crédito na Secretaria de Estado da Fazenda do Estado de Minas Gerais (SEF/MF), a respeito da baixa do crédito acumulado.
- No que diz respeito às providências para evitar a acumulação, no futuro, de créditos fiscais de ICMS, caso se conclua pela irrecuperabilidade definitiva do saldo, é possível tratar o ICMS não recuperável como parte integrante do custo de aquisição das matérias primas (RIR/2018, Art. 301, § 3.º).
4.1 Sua adoção, porém, exigirá a seguinte mudança: o ICMS destacado nas novas aquisições – na medida em que não seja recuperável – deverá ser apropriado diretamente a custos ou estoques.
4.2 Como esse procedimento reduz o lucro bruto e, por via de consequência lógica, a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB) poderá glosar o acréscimo ao custo de aquisição de matérias-primas que resulte de tributos passíveis de compensação, como o ICMS.
S.m.j, é a opinião legal.