Companhia X, na pessoa de sua Gerente Administrativa e Financeira, Sr.ª Y, formula consulta a respeito dos impactos tributários das principais alternativas disponíveis à baixa contábil da conta de créditos de sócios e acionistas que registra a dívida da Sociedade Z, no valor de R$ 7.777.276,04 (sete milhões e setecentos e setenta e sete mil e duzentos e setenta e seis reais e quatro centavos), em 30/06/2024.
2. Do nosso ponto de vista, a primeira opção que estaria disponível para Companhia X baixar contabilmente a conta mencionada seria o perdão da dívida registrada em nome da Sociedade Z.
2.1 Esta alternativa, porém, não é fiscalmente eficiente: quando uma pessoa jurídica recebe perdão de dívida de outra pessoa jurídica, o valor perdoado é receita tributável para a primeira, e despesa indedutível para a segunda.
2.2 De uma maneira geral, a racionalidade do efeito tributário imputado à pessoa jurídica que tem a dívida perdoada (no caso, a Sociedade Y) repousa sobre o argumento de que o perdão de dívida acarretaria um acréscimo patrimonial, decorrente da extinção definitiva da obrigação. A respeito, ensina, por exemplo, Mariz de Oliveira que “redução ou extinção da obrigação, sem pagamento ou qualquer outro comprometimento de ativos, também pode ser considerada receita“(1).
2.3 Este é o entendimento da jurisprudência (administrativa):
IRPJ E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO – PERDÃO DE DIVIDA – ACRÉSCIMO PATRIMONIAL – TRIBUTAÇÃO DO GANHO. A baixa de obrigação do passivo, pelo perdão da divida pelo credor, representa acréscimo ao Patrimônio Líquido da devedora, que deve ter como contrapartida o resultado do período-base da data do evento, onde o ganho deve ser submetido à tributação […]. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO(2).
3. Para nós, a melhor alternativa à disposição da Companhia X para baixar contabilmente a conta referida, no que diz respeito aos efeitos tributários, seria a conversão da dívida da Sociedade Z em participação societária.
3.1 Para exercer esta opção, recomendamos que Companhia X e Sociedade Z formalizem entre si, nas condições jurídicas de Mutuante e Mutuária, respectivamente, Contrato de Mútuo Conversível em Participação Societária, com a anuência dos sócios da Sociedade Z, na condição jurídica de Intervenientes Anuentes.
3.2 No Contrato de Mútuo Conversível em Participação Societária, deverão ser estipulados pelas Partes o valor do mútuo; a data do seu vencimento; e, no caso de conversão, o percentual da participação societária, que poderá ser predeterminado, com base na sua avaliação (valuation), à época da celebração do contrato.
3.3 O mútuo conversível em participação societária elidirá a incidência do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, se e somente se for gratuito, isto é, sem o acréscimo de juros e correção monetária. Caso contrário, o IRPJ, a CSLL, o PIS e a COFINS incidirão sobre as receitas financeiras que deverão ser auferidas pela Companhia X, quando converter o mútuo em participação societária da Sociedade Z. Em ambos os casos (mútuo gratuito e mútuo oneroso), porém, incidirá IOF calculado à alíquota de 0,0041% ao dia, limitada a 1,5% ao ano, por ser o mútuo (a dívida) aparentemente anterior a 20/09/2021. Além disso, será devido IOF calculado à alíquota adicional e fixa de 0,38% (zero vírgula trinta e oito por cento), independentemente do prazo da operação.
3.4 Por fim, chamamos a atenção que o Contrato de Mútuo Conversível em Participação Societária que Companhia X e Sociedade Z deverão firmar entre si não poderá ser gratuito, caso Companhia X incorra em qualquer tipo ou espécie de despesa financeira. Dada a ligação entre as pessoas jurídicas (RIR/2018, Art. 529, I)(3), é presumida a distribuição disfarçada de lucros, toda vez que Companhia X realizar negócio com Sociedade Y em condições de favorecimento, assim entendidas condições mais vantajosas do que as em que Companhia X contrataria com terceiros (RIR/2018, Art. 528, VI)(4).
3.5 A nossa conclusão pressupõe que os recursos financeiros emprestados pela Companhia X para Sociedade Z não apenas tenham sido efetivamente entregues, mas também já não tenham sido pagos. Caso contrário, implicará a aplicação da presunção de omissão de receitas, prevista pelo art. 293, III, do RIR/2018(5). Nesse caso, “a autoridade determinará o valor do imposto sobre a renda e o valor do adicional a serem lançados de acordo com o regime de tributação a que estiver submetida a pessoa jurídica no período de apuração a que corresponder a omissão” (RIR/2018, Art. 300).
(1)Mariz de Oliveira, Ricardo. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 104.
(2) Ac. 108-04.805, 1. CC, 8.ª Câmara, Rel. Cons. José Antonio Minatel, vu, j. 08/01/1998, DJ 10/12/1997.
(3) “Art. 529. Considera-se pessoa ligada à pessoa jurídica (Decreto-Lei n. 1.598, de 1977, art. 60, § 3.º): I – o sócio ou o acionista desta, mesmo quando for outra pessoa jurídica”.
(4)“Art. 528. Presume-se distribuição disfarçada de lucros no negócio pelo qual a pessoa jurídica (Decreto-Lei n. 1.598, de 1977, art. 60, caput, incisos I ao IV, VI e VII): […] VI – realiza com pessoa ligada qualquer outro negócio em condições de favorecimento, assim entendidas condições mais vantajosas para a pessoa ligada do que as que prevaleçam no mercado ou em que a pessoa jurídica contrataria com terceiros.”
(5)“Art. 293. Caracteriza-se como omissão no registro de receita, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção, a ocorrência das seguintes hipóteses (Decreto-Lei n. 1.598, de 1977, art. 12, § 2.º; e Lei n. 9.430, de 1996, art. 40): […] III – a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou cuja exigibilidade não seja comprovada.”