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Execução Fiscal. Prescrição Tributária (Ordinária e Intercorrente). Ocorrência

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Em 01/06/2004, Estado do Rio Grande do Sul (Exequente) propôs contra Company x (Executada) a Execução Fiscal n. (…) (“execução fiscal”), que tramita na MM.ª 14.ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central da Comarca de Porto Alegre/RS (“Juízo da Execução”) (Evento 5, ProcJudic1, p. 1-16).

1.1         A petição inicial da execução fiscal foi instruída pelas Certidões de Dívida Ativa (CDA) n. 01271/04, 01272/04, 01273/04, 01274/04, 01275/04, 01276/04, 01277/04, 01278/04, 01279/04, 01280/04, 01281/04, 01282/04, 01283/04 e 01284/04, que formalizaram créditos tributários, a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), constituídos em 14/07/1997, 05/08/1997, 12/08/1997, 12/09/1997, 06/10/1997, 13/10/1997, 05/11/1997, 12/11/1997, 12/12/1997, 05/01/1998, 12/01/1998, 12/02/1998 e 13/04/1998, respectivamente (Evento 5, ProcJudic1, p. 3-16).

1.2       Deferida a petição inicial da execução fiscal (Evento 5, ProcJudic1, p. 17), a Executada, Company x, foi citada, em 03/10/2004 (Evento 5, ProcJudic1, p. 21). Após o prazo de 5 (dias) para o pagamento da dívida ou garantia da execução (Lei n. 6.830, de 22 de setembro de 1980, Art. 8.º, caput), porém, a execução fiscal foi extinta, por razões de prescrição (CTN, Art. 174) (Evento 5, ProcJudic1, p. 24-29).

1.3         Irresignado, o Exequente, Estado do Rio Grande do Sul, interpôs a Apelação Cível n. (…), que foi provida, monocraticamente, pela Relatora, Des.ª Rejane Maria Dias de Castros Bins (Evento, 5, ProcJudic2, p. 42-50; Evento 5, ProcJudic3, p. 1-2), integrada, posteriormente, pela col. 22.ª Câmara Cível do eg. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, no julgamento dos Embargos de Declaração n. (…) (Evento 5, ProcJudic3, p. 28-31).

1.4         Após o seu trânsito em julgado, foi expedido mandado de arrolamento de bens (Evento 5, ProcJudic6, p. 24). Em 01/08/2012, o oficial de justiça certificou o seguinte:

“Certificado e dou fé que deixei de efetuar a medida determinada em face de constatar que no endereço indicado está sediada atualmente a firma Central de Serviços e Diligências Ltda. de propriedade do Sr. Y. Segundo informação obtida no local a firma executada teria fechada há cinco anos. Face ao exposto, devolvo o mandado para novas determinações.” (Evento 5, ProcJudic5, p. 1)

1.5         Dado o teor da certidão do oficial de justiça, o Exequente, Estado do Rio Grande do Sul, requereu o redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-administrador da Executada, Sr. Y (Evento 5, ProcJudic6, p. 33-35).

1.6         Em 13/12/2012, o pedido foi deferido pelo Juízo da Execução, com base nos seguintes fundamentos:

“Segundo informa o exequente, a sociedade empresarial encontra-se desativada, bem como não há bens suficientes para garantia do débito, o que somado ao fato da inexistência de distrato social e comunicação ao Fisco, caracteriza a dissolução irregular.

Assim, acolho o requerimento de responsabilização pessoal do sócio indicados às fls. 232/2333 – Sr. Y, nos termos do art. 135, III, do CTN.

[…].” (Evento 5, ProcJudic7, p. 18)

1.7         Todavia, expedido mandado de citação, penhora, registro e avaliação (Evento 5, ProcJudic7, p. 34), o sócio-administrador da Executada, Sr. Y, não foi localizado (Evento 5, ProcJudic7, p. 37). Intimado, em 16/05/2013 (Evento 5, ProcJudic7, p. 43), o Exequente, Estado do Rio Grande do Sul, requereu a expedição de outro mandado de citação, penhora, registro e avaliação (Evento 5, ProcJudic7, p. 44); não localizado outra vez o sócio-administrador da Executada, Sr. Y (Evento 5, ProcJudic8, p. 3 e 6), requereu a expedição de carta de citação (Evento 5, ProcJudic8, p. 10).

1.8         Citado, finalmente, em 26/08/2015 (Evento 5, ProcJudic8, p. 22), o sócio-administrador da Executada, Sr. Y, arguiu exceção de pré-executividade (Evento 5, ProcJudic8, p. 23-30), que foi rejeitada pelo Juízo da Execução, nos seguintes termos:

“[…]

Em primeiro lugar, não há que considerar que a presente ação foi distribuída em 01.06.2004, antes, portanto, da entrada em vigor da LC 118/2005 de 09.06.2005, pelo que a prescrição restou interrompida com a citação da empresa executada.

[…]

Dessa forma, inicia-se a contagem do prazo prescricional na data da constituição definitiva do crédito tributário, interrompendo-se com a citação, que retroage à data da distribuição do feito.

In casu, como os autos de lançamentos são datados de 1997 e 1998, o processo foi distribuído em 2004, a empresa citada em 07.10.2004 (fl. 19v) e o último pagamento do parcelamento do crédito tributário em 31/01/00 (fl. 106v), não há que se falar em prescrição direta.

Já a prescrição intercorrente tem como termo inicial a citação da pessoa jurídica – momento em que se inicia, novamente, a contagem do prazo prescricional.

Neste sentido:

[…]

Da análise dos autos, verifica-se que a empresa foi citada em 07.10.2004, o pedido de redirecionamento do feito ao sócio foi feito pelo excepto em 21.08.2012 (fls. 232/233), tendo ocorrido a citação do excipiente em 26.08.2015 (fls. 308), via postal.

É verdade, pois, que decorreram mais de cinco anos entre a citação da empresa e o pedido de redirecionamento. Todavia, há que se ter em conta que o processo não permaneceu paralisado durante este período. Pelo contrário, observa-se que o exequente foi diligente na busca da satisfação do crédito fiscal, não tendo havido inércia para impulsionar o feito.

Não houve manifesto desinteresse, mas sim falta de eficácia nas diligências utilizadas para satisfação da dívida.

Enfatiza-se que a demora no cumprimento dos atos processuais não pode ser computado no prazo prescricional, conforme enunciado da súmula 106 do STJ.

Por outro lado, também não prospera o argumento da excipiente de que não houve dissolução irregular da empresa, isto porque a certidão da oficial da justiça de fl. 229 é clara ao informar que ‘a firma executada teria fechado há mais de cinco anos‘ e que naquele local se encontra a empresa (…) também de propriedade do excipiente.

Neste contexto, merece ser mantida a decisão que determinou o redirecionamento, não havendo que se falar em prescrição intercorrente.

Por derradeiro, indefiro, por ora, o pedido de suspensão do feito em decorrência do parcelamento. Porém, o Estado do Rio Grande do Sul deverá ser intimado para apresentar planilha de cálculo do valor atualizado da dívida, com o abatimento dos valores depositados pela executada, a fim de que se possa aferir o valor do saldo devedor.

Em face do exposto, desacolho a exceção de pré-executividade.

Sem custas e honorários advocatícios, pois o feito terá prosseguimento.

Determino a intimação do Estado do Rio Grande do Sul para apresentar planilha de cálculo do valor atualizado da dívida, com o abatimento dos valores depositados pela executada.

Intimem-se.” (Evento 5, ProcJudic9, p. 48-50, grifos do original; Evento 5, ProcJudic10, p. 1-4, grifos do original)

1.9         A r. decisão interlocutória que rejeitou a exceção de pré-executividade arguida pelo sócio-administrador da Executada, Sr. Y, foi mantida pela col. 2.ª Câmara Cível do eg. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJRS), no julgamento do Agravo de Instrumento n. (…):

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO TRIBUTÁRIO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. ICMS. Redirecionamento da execução. Actio nata.  É de se aplicar a teoria do actio nata, a qual reza que a prescrição de débitos tributários em relação aos devedores subsidiários flui a partir do momento em que o credor toma ciência de indícios de dissolução societária irregular e não a partir da citação da pessoa jurídica. No caso, o pedido de redirecionamento foi realizado dentro do prazo quinquenal, contado do momento em que o exequente tomou conhecimento dos indícios da dissolução irregular da empresa executada. NEGADO PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. UNÂNIME.”

1.10       Dado prosseguimento à execução fiscal, não foram encontrados bens da Executada, Companhia X, e do seu sócio-administrador, Sr. Y (Evento 5, ProcJudic10, p. 37-50; Evento 5, ProcJudic11, p. 1-8). Intimado, em 04/11/2016 (Evento 5, ProcJudic11, p. 10), o Exequente, Estado do Rio Grande do Sul, requereu, então, fosse decretada a indisponibilidade dos bens da Executada, Companhia X, e do seu sócio-administrador, Sr. Y (Evento 2, ProcJudic11, p. 28).

1.11       Deferido o pedido pelo Juízo da Execução (Evento 5, ProcJudic11, p. 30), foram cadastrados bens imóveis, em nome do sócio-administrador da executada, Sr. Y, na Central Nacional de Indisponibilidade de Bens (CNIB), em 05/12/2017 (Evento 5, ProcJudic22, p. 35). Intimado, em 24/04/2018 (Evento 5, ProcJudic11, p. 36), o Exequente, Estado do Rio Grande do Sul, requereu, em 12/11/2021, a penhora da fração de 33,33% (trinta e três por cento) dos bens imóveis, titularizada pelo sócio-administrador da Executada, Sr. Y (Evento 5, ProcJudic12, p. 23). Porém, deferida pelo Juízo da Execução, em 11/01/2023 (Evento 180, DespaDec1, p. 1), a penhora, até o momento, não foi formalizada, através da lavratura do seu auto ou termo, a teor do art. 839 do Código de Processo Civil (CPC) ([1]).

1.12       Lavrado o auto ou termo de penhora, o sócio-administrador da Executada, Senhor Y, será intimado, para oferecer, querendo,  embargos à execução, no prazo de 30 (trinta) dias, conforme o art. 16, III, da Lei n. 6.830, de 22 de setembro de 1980 ([2]).

  1. Relatados os eventos da execução fiscal, o sócio-administrador da Executada, Sr. Y, formula a seguinte consulta: “Nos autos da execução fiscal, ocorreu a prescrição (ordinária ou intercorrente) da ação para a cobrança dos créditos tributários?”

2.1         No julgamento do RE 636.562/SC, o eg. Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu que a prescrição da ação para a cobrança dos créditos tributários (“prescrição tributária”) pode ser ordinária (Código Tributário Nacional, Art. 174) ou intercorrente (Lei n. 6.830, de 22 de setembro de 1980, Art. 40) ([3]).

2.2         A prescrição tributária ordinária é estabelecida pelo art. 174 do Código Tributário Nacional (CTN), que dispõe o seguinte:

“Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.

Parágrafo único. A prescrição se interrompe:

I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal;

II – pelo protesto judicial;

III – por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;

IV – por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor.”            

2.3         Nos autos da execução fiscal, a prescrição tributária ordinária já foi arguida duas vezes. A primeira, quando o Juízo da Execução extinguiu a execução fiscal, por razões de prescrição (Evento 5, ProcJudic1, p. 24-29). A segunda, quando o sócio-administrador da Executada Sr. Y, suscitou a exceção de pré-executividade (Evento 5, ProcJudic8, p. 23-30).

2.4         Tanto a primeira quanto a segunda, entretanto, foram rejeitadas por decisões transitadas em julgado. A primeira, no julgamento da Apelação Cível n. (…), provida, monocraticamente, pela Relatora, Des.ª Rejane Maria Dias de Castros Bins (Evento, 5, ProcJudic2, p. 42-50; Evento 5, ProcJudic3, p. 1-2), integrada, posteriormente, pela col. 22.ª Câmara Cível do eg. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, no julgamento dos Embargos de Declaração n. (…) (Evento 5, ProcJudic3, p. 28-31). A segunda, no julgamento do Agravo de Instrumento n. (…), que não foi provido pela col. 2.ª Câmara Cível do eg. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJRS), de modo que foi mantida a r. decisão interlocutória que havia desacolhido a exceção de pré-executividade arguida pelo sócio-administrador da Executada, Sr. Y (Evento 5, ProcJudic9, p. 48-50, grifos do original; Evento 5, ProcJudic10, p. 1-4, grifos do original).

2.5         Portanto, se há resolução do mérito quando o juiz decide, de ofício ou não, sobre a ocorrência de decadência ou prescrição (CPC, Art. 487, II) ([4]), então as duas decisões transitadas em julgado que rejeitaram as arguições de prescrição tributária ordinária nos autos da execução fiscal são coisas julgadas materiais, no sentido de que são imutáveis e indiscutíveis (CPC, Art. 502) ([5]); têm força de lei entre as partes (CPC, Art. 503, caput) ([6]); proíbem o juiz de decidir novamente a questão (CPC, Art. 505) ([7]); e proíbem às partes de discutirem outra vez a questão no processo (CPC, Art. 507) ([8]).

2.6         Porém, se é certo que não ocorreu a prescrição tributária ordinária, é certo que  ocorreu a prescrição tributária intercorrente. A respeito, prescreve o art. 40 da Lei n. 6.830, de 22 de setembro de 1980:

“Art. 40. O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição.

  • 1.º Suspenso o curso da execução, será aberta vista dos autos ao representante judicial da Fazenda Pública.
  • 2.º Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o arquivamento dos autos.
  • 3.º Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução.
  • 4.º Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato.
  • 5.º  A manifestação prévia da Fazenda Pública prevista no § 4.º deste artigo será dispensada no caso de cobranças judiciais cujo valor seja inferior ao mínimo fixado por ato do Ministro de Estado da Fazenda.”

2.7         Recentemente, no julgamento do RE 636.652/SC, o art. 40 da Lei n. 6.830, de 22 de setembro de 1980, foi declarado constitucional pelo eg. Supremo Tribunal Federal (STF), que fixou a seguinte tese de repercussão geral: “É constitucional o art. 40 da Lei no 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais – LEF), tendo natureza processual o prazo de 1 (um) ano de suspensão da execução fiscal. Após o decurso desse prazo, inicia-se automaticamente a contagem do prazo prescricional tributário de 5 (cinco) anos” ([9]).

2.8         Do nosso ponto de vista, a conclusão de que ocorreu a prescrição tributária intercorrente nos autos da execução fiscal decorre de uma cadeia argumentativa que inicia a partir do deferimento do pedido de redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-administrador da Executada, Sr. Y, em 13/12/2012 (Evento 5, ProcJudic7, p. 18). Naquela ocasião, foi expedido mandado de citação, penhora, registro e avaliação (Evento 5, ProcJudic7, p. 34). Porém, o mandado de citação, penhora, registro e avaliação não foi cumprido, haja vista que o oficial de justiça não localizou o sócio-administrador da Executada, Sr. Y (Evento 5, ProcJudic7, p. 37).

2.9         O Exequente, Estado do Rio Grande do Sul, foi intimado da certidão do oficial de justiça, de que não havia localizado o sócio-administrador da Executada, Sr. Y, em 16/05/2013 (Evento 5, ProcJudic7, p. 43). Naquela data, iniciou, então, o prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo, conforme o item n. 1 da tese fixada pelo eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp 1.340.553/RS:

O prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo e do respectivo prazo prescricional previsto no art. 40, §§ 1º e 2º da Lei n. 6.830/80 – LEF tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido, havendo, sem prejuízo dessa contagem automática, o dever de o magistrado declarar ter ocorrido a suspensão da execução” ([10]). 

2.9.1 A título elucidativo, a tese fixada pelo eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp 1.340.553/RS, é um precedente obrigatório, que vincula juízes e tribunais. Dispõe o inciso III do art. 927 do Código de Processo Civil (CPC) que “Os juízes e tribunais observarão: […] os acórdãos […] em julgamento de recursos […] especial repetitivos”.

2.10   Depois, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo, em 16/05/2014, iniciou o prazo da prescrição tributária intercorrente, à luz do item n. 2 da tese fixada pelo eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp 1.340.553/RS:

“Havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não pronunciamento judicial nesse sentido, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável” ([11]).

2.11       Entretanto, o prazo da prescrição tributária intercorrente foi interrompido, quando o sócio-administrador da Executada, Sr. Y, foi citado em 26/08/2015 (Evento 5, ProcJudic8, p. 22). Segundo o item n. 3 da tese fixada pelo eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp 1.340.553/RS,  “a efetivação citação (ainda que por edital)” é apta para “interromper o curso da prescrição intercorrente”  ([12]).

2.12       Contudo, interrompido, em 26/08/2015 (Evento 5, ProcJudic8, p. 22), o prazo da prescrição tributária intercorrente reiniciou, em 04/11/2016, quando, não encontrados bens da Executada, Companhia X, e do seu sócio-administrador, Sr. Y (Evento 5, ProcJudic10, p. 37-50; Evento 5, ProcJudic11, p. 1-8), o Exequente, Estado do Rio Grande do Sul, foi intimado a respeito (Evento 5, ProcJudic11, p. 10). Consoante o item n. 1 da tese fixada pelo eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp 1.340.553/RS, o prazo da prescrição tributária intercorrente “tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis” ([13]).

2.13       Portanto, reiniciado, em 04/11/2016 (Evento 5, ProcJudic11, p. 10), o prazo da prescrição tributária intercorrente terminou em 04/11/2021. Até aquela data, porém, não fora formalizada, seja através da lavratura de auto, seja através da lavratura de termo, a penhora. Entretanto, apenas a sua formalização, nos autos da execução fiscal, interromperia o prazo da prescrição tributária intercorrente: “A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente” ([14]), diz o item n. 3 da tese fixada pelo eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp 1.340.553/RS.

2.14       O Exequente, Estado do Rio Grande do Sul, todavia, poderá contrapor que requereu a decretação da indisponibilidade dos bens da Executada, Companhia X, e do seu sócio-administrador, Sr. Y, em 14/09/2017 (Evento 2, ProcJudic11, p. 28). Deferido o pedido pelo Juízo da Execução (Evento 5, ProcJudic11, p. 30), foram cadastrados bens imóveis, em nome do sócio-administrador da Executada, Sr. Y, na Central Nacional de Indisponibilidade de Bens (CNIB), em 05/12/2017 (Evento 5, ProcJudic22, p. 35).

2.15       Contudo, tanto a decretação da indisponibilidade dos bens da Executada, Companhia X, e do seu sócio-administrador, Sr. Y, quanto o cadastro de bens imóveis, em nome do sócio-administrador da Executada, Sr. Y, na Central Nacional de Indisponibilidade de Bens (CNIB), não eram aptos para causar a interrupção do prazo da prescrição tributária intercorrente. No item n. 3, a tese fixada pelo eg. STJ, por ocasião do julgamento do REsp 1.340.553/RS (Tema 566), enuncia que apenas “A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando para tal o mero peticionamento em juízo, requerendo, v.g., a feitura da penhora sobre ativos financeiros ou sobre outros bens” ([15]).

2.16       Como o Exequente, Estado do Rio Grande do Sul, requereu, apenas em 12/11/2021, a penhora da fração de 33,33% (trinta e três por cento) dos bens imóveis, titularizada pelo sócio da Executada, Sr. Y (Evento 5, ProcJudic12, p. 23), a (futura) lavratura do seu termo ou auto também não seria suficiente para causar a interrupção retroativa do prazo da prescrição tributária intercorrente, pois a penhora da fração de 33,33% (trinta e três por cento) dos bens imóveis, titularizada pelo sócio da Executada, Sr. Y, foi requerida pelo Exequente, Estado do Grande do Sul, fora do prazo da prescrição tributária intercorrente (de 04/11/2016 a 04/11/2021). Segundo o item n. 3 da tese fixada pelo eg. STJ, no julgamento do REsp 1.340.553/RS, “Os requerimentos feitos pelo exequente, dentro da soma do prazo máximo de 1 (um) ano de suspensão mais o prazo de prescrição aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) deverão ser processados, ainda que para além da soma desses dois prazos, pois, citados (ainda que por edital) os devedores e penhorados os bens, a qualquer tempo – mesmo depois de escoados os referidos prazos –, considera-se interrompida a prescrição intercorrente, retroativamente, na data do protocolo da petição que requereu a providência frutífera” ([16]).

2.17       No caso, o prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo não poderia ser computado novamente, porque ele já havia sido contado quando o Exequente, Estado do Rio Grande do Sul, fora intimado da certidão oficial de justiça, de que não localizara o sócio-administrador da Executada, Sr. Y, em 16/05/2013 (Evento 5, ProcJudic7, p. 43). No julgamento do REsp 1.340.553/RS, o eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou o entendimento de que “O espírito do art. 40, da Lei n. 6.830/80 é o de que nenhuma execução fiscal já ajuizada poderá permanecer eternamente nos escaninhos do Poder Judiciário ou da Procuradoria Fazendária encarregada da execução das respectivas dívidas fiscais” ([17]). Por isso, o prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo só pode ser computado uma vez, conforme o art. 921, § 4.º, do Código de Processo Civil (CPC) ([18]), aplicável, subsidiariamente, à execução fiscal, a teor do art. 1.º da Lei n. 6.830, de 22 de setembro de 1980 ([19]).

  1. Ante ao exposto, respondemos à consulta formulada pelo sócio-administrador da Executada, Sr. Y, da seguinte forma: nos autos da execução fiscal, ocorreu a prescrição intercorrente da ação para a cobrança dos créditos tributários (“prescrição tributária intercorrente”), conforme a tese fixada pelo eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp 1.340.553/RS ([20]).

3.1         O termo inicial do prazo da prescrição tributária intercorrente foi a data da intimação (04/11/2016) do Exequente, Estado do Rio Grande Sul do Sul, a respeito de que não haviam sido encontrados bens da Executada, Companhia X, e do seu sócio-administrador, Sr. Y (Evento 5, ProcJudic10, p. 37-50; Evento 5, ProcJudic11, p. 1-8). Segundo o item n. 1 da tese fixada pelo eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp 1.340.553/RS, o prazo da prescrição tributária intercorrente “tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis” ([21]).

3.2         Passados 5 (cinco) anos sem a lavratura do termo ou auto de penhora, o termo final do prazo da prescrição tributária intercorrente foi 04/11/2021: apenas “A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente” ([22]), diz o item n. 3 da tese fixada pelo eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp 1.340.553/RS.

3.3        Como o Exequente, Estado do Rio Grande do Sul, requereu, apenas em 12/11/2021, a penhora da fração de 33,33% (trinta e três por cento) dos bens imóveis, titularizada pelo sócio da Executada, Sr. Y (Evento 5, ProcJudic12, p. 23), a (futura) lavratura do termo ou auto de penhora também não seria suficiente para causar a interrupção retroativa do prazo da prescrição tributária intercorrente, pois a penhora da fração de 33,33% (trinta e três por cento) dos bens imóveis, titularizada pelo sócio da Executada, Sr. Y, foi requerida pelo Exequente, Estado do Grande do Sul, fora do prazo da prescrição tributária intercorrente (de 04/11/2016 a 04/11/2021). Segundo o item n. 3 da tese fixada pelo eg. STJ, no julgamento do REsp 1.340.553/RS, “Os requerimentos feitos pelo exequente, dentro da soma do prazo máximo de 1 (um) ano de suspensão mais o prazo de prescrição aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) deverão ser processados, ainda que para além da soma desses dois prazos, pois, citados (ainda que por edital) os devedores e penhorados os bens, a qualquer tempo – mesmo depois de escoados os referidos prazos –, considera-se interrompida a prescrição intercorrente, retroativamente, na data do protocolo da petição que requereu a providência frutífera” ([23]).

3.4         No caso, o prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo não poderia ser computado novamente, porque ele já havia sido contado quando o Exequente, Estado do Rio Grande do Sul, fora intimado da certidão oficial de justiça, de que não localizara o sócio-administrador da Executada, Sr. Y, em 16/05/2013 (Evento 5, ProcJudic7, p. 43). No julgamento do REsp 1.340.553/RS, o eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou o entendimento de que “O espírito do art. 40, da Lei n. 6.830/80 é o de que nenhuma execução fiscal já ajuizada poderá permanecer eternamente nos escaninhos do Poder Judiciário ou da Procuradoria Fazendária encarregada da execução das respectivas dívidas fiscais” ([24]). Por isso, o prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo só pode ser computado uma vez, conforme o art. 921, § 4.º, do Código de Processo Civil (CPC) ([25]), aplicável, subsidiariamente, à execução fiscal, a teor do art. 1.º da Lei n. 6.830, de 22 de setembro de 1980 ([26]).

S.m.j., é o parecer.

([1])           “Art. 839. Art. 839. Considerar-se-á feita a penhora mediante a apreensão e o depósito dos bens, lavrando-se um só auto se as diligências forem concluídas no mesmo dia. Parágrafo único. Havendo mais de uma penhora, serão lavrados autos individuais.”

([2])           “Art. 16. O executado oferecerá embargos, no prazo de 30 (trinta) dias, contados: […] III – da intimação da penhora”.

([3])           RE 636.562/SC, STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Roberto Barroso, vu, j. 22/02/2023, DJe 06/03/2023.

([4])           “Art. 487. Haverá resolução do mérito quando o juiz: […] II – decidir, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência de prescrição”.

([5])           “Art. 502. Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso.”

([6])           “Art. 503. A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida.”

([7])           “Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo: I – se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença; II – nos demais casos previstos em lei.”

([8])           “Art. 507. É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão.”

([9])           RE 636.562/SC, STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Roberto Barroso, vu, j. 22/02/2023, DJe 06/03/2023.

([10])         REsp 1.340.553/RS, STJ, S1, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, vu, j. 12/9/2018, DJe 16/10/2018, grifou-se.

([11])         REsp 1.340.553/RS, STJ, S1, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 12/9/2018, DJe de 16/10/2018.

([12])         REsp 1.340.553/RS, STJ, S1, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 12/9/2018, DJe de 16/10/2018.

([13])         REsp 1.340.553/RS, STJ, S1, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, vu, j. 12/9/2018, DJe 16/10/2018, grifou-se.

([14])         REsp 1.340.553/RS, STJ, S1, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 12/9/2018, DJe 16/10/2018, grifou-se.

([15])         REsp 1.340.553/RS, STJ, S1, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 12/9/2018, DJe de 16/10/2018, grifou-se.

([16])         REsp 1.340.553/RS, STJ, S1, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 12/9/2018, DJe de 16/10/2018, grifou-se.

([17])         REsp 1.340.553/RS, STJ, S1, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, vu, j. 12/09/2018, DJe de 16/10/2018.

([18])         “Art. 921. Suspende-se a execução: […] § 4.º O termo inicial da prescrição no curso do processo será a ciência da primeira tentativa infrutífera de localização do devedor ou de bens penhoráveis, e será suspensa, por uma única vez, pelo prazo máximo previsto no § 1.º deste artigo.”

([19])         “Art. 1.º A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.”

([20])         REsp 1.340.553/RS, STJ, S1, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 12/9/2018, DJe 16/10/2018, grifou-se.

([21])         REsp 1.340.553/RS, STJ, S1, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, vu, j. 12/9/2018, DJe 16/10/2018, grifou-se.

([22])         REsp 1.340.553/RS, STJ, S1, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 12/9/2018, DJe 16/10/2018, grifou-se.

([23])         REsp 1.340.553/RS, STJ, S1, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 12/9/2018, DJe de 16/10/2018, grifou-se.

([24])         REsp 1.340.553/RS, STJ, S1, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, vu, j. 12/09/2018, DJe de 16/10/2018.

([25])          “Art. 921. Suspende-se a execução: […] § 4.º O termo inicial da prescrição no curso do processo será a ciência da primeira tentativa infrutífera de localização do devedor ou de bens penhoráveis, e será suspensa, por uma única vez, pelo prazo máximo previsto no § 1.º deste artigo.”

([26])          “Art. 1.º A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.”

Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN). Local da Prestação do Serviço. Elaboração do Plano Diretor de Manejo de Águas Pluviais de Caçador/SC

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Por Diego Galbinski

  1. Fundação X, na pessoa da sua Gerente Administrativa, Sr.ª Y, formula consulta a respeito do local da prestação do serviço, relativo à elaboração do Plano Diretor de Manejo de Águas Pluviais de Caçador/SC, que constitui o objeto do contrato que entre si celebraram Município de Caçador/SC, Universidade W e Fundação X (“Consulente”), em 15 de dezembro de 2022 (“contrato”).

1.1              Na formulação da consulta, a Consulente relata que o Município de Caçador/SC, ao pagar a verba de mobilização, no valor de R$ […], prevista pela cláusula 3.1.1. do contrato, reteve o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), com base no art. 24-B, caput, do Código Tributário do Município de Caçador/SC, que dispõe o seguinte: “Art. 24-B Haverá retenção obrigatória  do ISSQN na fonte sempre que o tomador dos serviços for o Município de Caçador.

1.2              No entanto, a Consulente informa que não tem estabelecimento localizado no Município de Caçador/SC. Por isso, entende que o serviço seja prestado no local do seu domicílio, isso é, no Município de Porto Alegre. Daí que o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) também seja devido para o Município de Porto Alegre/RS.

  1. Do nosso ponto de vista, a incidência e aplicação do art. 24-B, caput, do Código Tributário do Município de Caçador/SC, que dá fundamento à retenção do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), por parte do Município de Caçador/SC, pressupõe que os serviços sejam efetivamente prestados no Município de Caçador/SC.

2.1              Caso contrário, o art.  24-B, caput, do Código de Tributário do Município de Caçador/SC deixaria de encontrar fundamento de validade no art. 3.º, caput, da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, que prescreve o seguinte: “Art. 3.º O serviço considera-se prestado, e o imposto, devido, no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador“.

2.2              Ora, no conflito (antinomia) entre o art. 3.º, caput, da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, de um lado, e o art. 24-B, caput, do Código Tributário do Município de Caçador/SC, de outro, não há dúvida que prevalece o art. 3.º, caput, da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, eis que o art. 146, III, ‘a’, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, reserva, expressamente, à lei complementar a “definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes” (grifou-se).

2.3              No que diz respeito ao Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), o art. 3.º, caput, da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, define não apenas o aspecto ou critério espacial (“O serviço considera-se prestado […] no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador“), mas também o aspecto ou critério pessoal, nomeadamente o sujeito ativo (credor) (“considera-se […] o imposto, devido, no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador“), que são elementos do fato gerador (da obrigação tributária) ([1]).

2.4              Portanto, no caso de conflito (antinomia), o art. 3.º, caput, da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003 (“Art. 3.º O serviço considera-se prestado, e o imposto, devido, no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador“), prevalece sobre o art. 24-B, caput, do Código Tributário do Município de Caçador/SC (“Art. 24-B Haverá retenção obrigatória  do ISSQN na fonte sempre que o tomador dos serviços for o Município de Caçador“), conforme o art. 146, III, ‘a’, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988 (“Art. 146. Cabe à lei complementar: […] III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes“).

2.5            Isso porque, quando uma norma que invade a competência reservada à outra, como o art. 24-B, caput, do Código Tributário do Município de Caçador/SC — ensina, por exemplo, Guastini — “a norma que provém da fonte competente deve ser aplicada“, isso é, o art. 3.º, caput, da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003. Para o jurista italiano, “Quanto à norma proveniente da fonte incompetente“, ou seja, o art. 24-B, caput, do Município de Caçador/SC,  essa é inválida” ([2]).

  1. Com base em tais considerações, a col. 1.ª Seção do eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o REsp 1.171.121-SP, decidido sob o rito do art. 543-C do Código de Processo Civil (CPC), também chegou às seguintes conclusões:

3.1              O Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) é devido no local do estabelecimento prestador; ou

3.2              Na falta de estabelecimento, o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) é devido no local do domicílio do prestador ([3]).

3.3              Conforme a col. 1.ª Seção do eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), apenas não é devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta de estabelecimento, no local do domicílio do prestador, se e somente se na presença de uma das hipóteses previstas pelos incisos I a XXV do art. 3.º da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003 ([4]). Nesses casos, o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) é devido nos locais indicados pelos incisos I a XXV do art. 3.º da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, respectivamente ([5]).

  1. Porém, o objeto do contrato é a prestação do serviço de elaboração do Plano Diretor de Manejo de Águas Pluviais de Caçador/SC, que se subsume ao tipo (de serviço) definido pelo item 7.03 da Lista Anexa da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003 (“7.03 – Elaboração de planos diretores, estudos de viabilidade, estudos organizacionais e outros, relacionados com obras e serviços de engenharia; elaboração de anteprojetos, projetos básicos e projetos executivos para trabalhos de engenharia.”)

4.1              Como se pode perceber, o tipo (de serviço) definido pelo item 7.03 da Lista Anexa da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, isso, é, “Elaboração de planos diretores, estudos de viabilidade, estudos organizacionais e outros, relacionados com obras e serviços de engenharia; elaboração de anteprojetos, projetos básicos e projetos executivos para trabalhos de engenharia“, não é uma das hipóteses previstas pelos incisos I a XXV do art. 3.º da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003.

4.2              Portanto, é considerado prestado o serviço de elaboração do Plano Diretor de Manejo de Águas Pluviais de Caçador/SC, e o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), devido, no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador (Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, Art. 3.º, caput).

4.3              Conforme foi exposto pela Consulente, ela não tem estabelecimento localizado no Município de Caçador/SC. Logo, o serviço é considerado prestado no local do seu domicílio, ou seja, no Município de Porto Alegre. Consequentemente, o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) também é considerado devido no Município de Porto Alegre.

  1. Não chegamos a outra conclusão, se levarmos em consideração o fato de que a Consulente, quando recebeu a verba de mobilização, no valor de R$ […], prevista pela cláusula 3.1.1. do contrato, emitiu nota fiscal de serviço, com a descrição do tipo (de serviço) definido pelo item 2.01 da Lista de Serviços Anexa da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003 (“2.01. Serviços de pesquisas e desenvolvimento de qualquer natureza“).

5.1              A exemplo do tipo (de serviço) definido pelo item 7.03 da Lista Anexa da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, o  tipo (de serviço) definido pelo item 2.01 da Lista de Serviços Anexa da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, ou seja, “2.01. Serviços de pesquisas e desenvolvimento de qualquer natureza“,  não é uma das hipóteses previstas pelos incisos I a XXV do art. 3.º da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003.

5.2              Então, também é aplicável o art. 3.º, caput, da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, de modo que são igualmente considerados prestados os serviços de pesquisas e desenvolvimento de qualquer natureza, e o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), devido, no Município de Porto Alegre.

  1. Ante ao exposto, o Município de Caçador/SC não pode reter o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), por ocasião do pagamento do preço do serviço de elaboração do Plano Diretor de Manejo de Águas Pluviais de Caçador/SC, que constitui o objeto do contrato que entre si celebraram Município de Caçador/SC, Universidade W e Fundação X, em 15 de dezembro de 2022.

6.1              Do nosso ponto de vista, a incidência e aplicação do art. 24-B, caput, do Código Tributário do Município de Caçador/SC, que dá fundamento à retenção do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), por parte do Município de Caçador/SC, pressupõe que os serviços sejam efetivamente prestados no Município de Caçador/SC. Caso contrário, o art. 24-B, caput, do Código Tributário do Município de Caçador/SC deixaria de encontrar fundamento de validade no art. 3.º, caput, da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, que prescreve o seguinte: “Art. 3.º O serviço considera-se prestado, e o imposto, devido, no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador“.

6.2              No conflito (antinomia) entre o art. 3.º, caput, da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, de um lado, e o art. 24-B, caput, do Código Tributário do Município de Caçador/SC, de outro, não há dúvida que prevalece o art. 3.º, caput, da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, eis que o art. 146, III, ‘a’, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, reserva, expressamente, à lei complementar a “definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes” (grifou-se).

6.3              Conforme o art. 3.º, caput, da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, é considerado prestado o serviço de elaboração do Plano Diretor de Manejo de Águas Pluviais de Caçador/SC, e o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), devido, no Município de Porto Alegre/RS.

6.4              Não chegamos a outra conclusão, se levarmos em consideração o fato de que a Consulente, quando recebeu a verba de mobilização, no valor de […], prevista pela cláusula 3.1.1. do contrato, emitiu nota fiscal de serviço, com a descrição do tipo (de serviço) definido pelo item 2.01 da Lista de Serviços Anexa da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003 (“2.01. Serviços de pesquisas e desenvolvimento de qualquer natureza“).

6.5              Nesse caso, também é aplicável o art. 3.º, caput, da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, de modo que igualmente são considerados prestados os serviços de pesquisas e desenvolvimento de qualquer natureza, e o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), devido, no Município de Porto Alegre.

6.6              Caso o Município de Caçador/SC mantenha o seu entendimento a respeito da questão consultada, recomendamos que a Consulente impetre mandado de segurança, a fim de que o Município de Caçador/SC seja proibido de reter o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), por ocasião do pagamento do preço do serviço de elaboração do Plano Diretor de Manejo de Águas Pluviais de Caçador/SC, conforme o art. 3.º, caput, da Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003.

([1])              CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 236.

([2])             Guastini, Riccardo. Interpretare e Argomentare. Milano: Giuffré, 2011, p. 114, tradução livre.

([3])           REsp 1.117.121-SP, STJ, S1, Rel.ª Min.ª Eliana Calmon, vu, j. 14/10/2009, DJe 29/10/2009.

([4])           REsp 1.117.121-SP, STJ, S1, Rel.ª Min.ª Eliana Calmon, vu, j. 14/10/2009, DJe 29/10/2009.

([5])             “Art. 3.º O serviço considera-se prestado, e o imposto, devido, no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXV, quando o imposto será devido no local: I – do estabelecimento do tomador ou intermediário do serviço ou, na falta de estabelecimento, onde ele estiver domiciliado, na hipótese do § 1.º do art. 1o desta Lei Complementar; II – da instalação dos andaimes, palcos, coberturas e outras estruturas, no caso dos serviços descritos no subitem 3.05 da lista anexa; III – da execução da obra, no caso dos serviços descritos no subitem 7.02 e 7.19 da lista anexa; IV – da demolição, no caso dos serviços descritos no subitem 7.04 da lista anexa; V – das edificações em geral, estradas, pontes, portos e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.05 da lista anexa; VI – da execução da varrição, coleta, remoção, incineração, tratamento, reciclagem, separação e destinação final de lixo, rejeitos e outros resíduos quaisquer, no caso dos serviços descritos no subitem 7.09 da lista anexa; VII – da execução da limpeza, manutenção e conservação de vias e logradouros públicos, imóveis, chaminés, piscinas, parques, jardins e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.10 da lista anexa; VIII – da execução da decoração e jardinagem, do corte e poda de árvores, no caso dos serviços descritos no subitem 7.11 da lista anexa; IX – do controle e tratamento do efluente de qualquer natureza e de agentes físicos, químicos e biológicos, no caso dos serviços descritos no subitem 7.12 da lista anexa; X – (Vetado);  XI – (Vetado); XII – do florestamento, reflorestamento, semeadura, adubação e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.16 da lista anexa;  XII – do florestamento, reflorestamento, semeadura, adubação, reparação de solo, plantio, silagem, colheita, corte, descascamento de árvores, silvicultura, exploração florestal e serviços congêneres indissociáveis da formação, manutenção e colheita de florestas para quaisquer fins e por quaisquer meios; XIII – da execução dos serviços de escoramento, contenção de encostas e congêneres, no caso dos serviços descritos no subitem 7.17 da lista anexa; XIV – da limpeza e dragagem, no caso dos serviços descritos no subitem 7.18 da lista anexa;XV – onde o bem estiver guardado ou estacionado, no caso dos serviços descritos no subitem 11.01 da lista anexa; XVI – dos bens ou do domicílio das pessoas vigiados, segurados ou monitorados, no caso dos serviços descritos no subitem 11.02 da lista anexa; XVI – dos bens, dos semoventes ou do domicílio das pessoas vigiados, segurados ou monitorados, no caso dos serviços descritos no subitem 11.02 da lista anexa; XVII – do armazenamento, depósito, carga, descarga, arrumação e guarda do bem, no caso dos serviços descritos no subitem 11.04 da lista anexa; XVIII – da execução dos serviços de diversão, lazer, entretenimento e congêneres, no caso dos serviços descritos nos subitens do item 12, exceto o 12.13, da lista anexa; XIX – do Município onde está sendo executado o transporte, no caso dos serviços descritos pelo subitem 16.01 da lista anexa; XIX – do Município onde está sendo executado o transporte, no caso dos serviços descritos pelo item 16 da lista anexa;  XX – do estabelecimento do tomador da mão-de-obra ou, na falta de estabelecimento, onde ele estiver domiciliado, no caso dos serviços descritos pelo subitem 17.05 da lista anexa; XXI – da feira, exposição, congresso ou congênere a que se referir o planejamento, organização e administração, no caso dos serviços descritos pelo subitem 17.10 da lista anexa; XXII – do porto, aeroporto, ferroporto, terminal rodoviário, ferroviário ou metroviário, no caso dos serviços descritos pelo item 20 da lista anexa; XXIII – do domicílio do tomador dos serviços dos subitens 4.22, 4.23 e 5.09; XXIV – do domicílio do tomador do serviço no caso dos serviços prestados pelas administradoras de cartão de crédito ou débito e demais descritos no subitem 15.01; XXV – do domicílio do tomador dos serviços dos subitens 10.04 e 15.09. XXV – do domicílio do tomador do serviço do subitem 15.09.”

Regime Tributário dos Juros sobre o Capital Próprio. Regime de Tributação com Base no Lucro Presumido. Participação em Outras Sociedades

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Prezado(a) Senhor(a),

Com relação à questão em epígrafe, a Solução de Consulta COSIT n. 84, de 08 de junho de 2016, concluiu o seguinte:

“CONTRIBUIÇÃO PARA O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL – COFINS

EMENTA: REGIME DE APURAÇÃO CUMULATIVA. BASE DE CÁLCULO. FATURAMENTO. RECEITA BRUTA. PARTICIPAÇÃO EM OUTRAS SOCIEDADES. JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO.

A partir da publicação da Lei n. 11.941, de 2009, ocorrida em 28 de maio de 2009, a base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins no regime de apuração cumulativa ficou restrita ao faturamento auferido pela pessoa jurídica, que corresponde à receita bruta de que trata o art. 12 do Decreto-Lei n. 1.598, de 26 de dezembro de 1977, nos termos do art. 2º e caput do art. 3.º da Lei nº 9.718, de 1998.

A receita bruta sujeita à Cofins compreende as receitas oriundas do exercício de todas as atividades empresariais da pessoa jurídica, e não apenas aquelas decorrentes da venda de mercadorias e da prestação de serviços.

As receitas decorrentes do recebimento de juros sobre o capital próprio auferidas por pessoa jurídica cujo objeto social seja a participação no capital social de outras sociedades compõem sua receita bruta para fins de apuração da Cofins devidas no regime de apuração cumulativa.

DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei n. 9.718, arts. 2.º e 3.º, caput; Lei Complementar n. 70, de 1991, arts. 2.º e 3.º; Decreto-Lei n. 1.598, de 26 de dezembro de 1977, art. 12.

ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS/PASEP

EMENTA: REGIME DE APURAÇÃO CUMULATIVA. BASE DE CÁLCULO. FATURAMENTO. RECEITA BRUTA. PARTICIPAÇÃO EM OUTRAS SOCIEDADES. JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO.

A partir da publicação da Lei n. 11.941, de 2009, ocorrida em 28 de maio de 2009, a base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins no regime de apuração cumulativa ficou restrita ao faturamento auferido pela pessoa jurídica, que corresponde à receita bruta de que trata o art. 12 do Decreto-Lei n. 1.598, de 26 de dezembro de 1977, nos termos do art. 2º e caput do art. 3º da Lei n. 9.718, de 1998.

A receita bruta sujeita à Contribuição para o PIS/Pasep compreende as receitas oriundas do exercício de todas as atividades empresariais da pessoa jurídica, e não apenas aquelas decorrentes da venda de mercadorias e da prestação de serviços.

As receitas decorrentes do recebimento de juros sobre o capital próprio auferidas por pessoa jurídica cujo objeto social seja a participação no capital social de outras sociedades compõem sua receita bruta para fins de apuração da Contribuição para o PIS/Pasep devidas no regime de apuração cumulativa.

DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei n. 9.718, arts. 2º e 3º, caput; Lei n. 9.715, de 1998, arts. 2º, I, e 3º; Lei Complementar nº 7, de 1970, art. 3º; Decreto-Lei nº 1.598, de 26 de dezembro de 1977, art. 12.”

Nessa solução de consulta, a autoridade administrativa fundamentou o seu ponto de vista interpretativo, no sentido de que os juros sobre o capital próprio auferidos por pessoa jurídica dedicada à atividade econômica de participação no capital social de outras sociais compõem a sua receita bruta, no art. 12, I, II, III e IV, do Decreto-lei n. 1.598, de 26 de dezembro de 1977, na redação da Lei n. 12.973, de 13 de maio de 2014, que dispõe o seguinte:

“Art. 12.  A receita bruta compreende: I – o produto da venda de bens nas operações de conta própria; II – o preço da prestação de serviços em geral; III – o resultado auferido nas operações de conta alheia; e  IV – as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não compreendidas nos incisos I a III.” (grifou-se)       

O art. 12, I, II, III e IV, do Decreto-lei n. 1.598, de 26 de dezembro de 1977, na redação da Lei n. 12.973, de 13 de maio de 2014, define o conceito de receita bruta não apenas para a Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), mas também para o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), a teor do art. 208, I, II, III e IV, do Decreto n. 9.580, de 22 de novembro de 2018 (RIR/2018):

“Art. 208. A receita bruta compreende (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 12, caput ): I – o produto da venda de bens nas operações de conta própria; II – o preço da prestação de serviços em geral; III – o resultado auferido nas operações de conta alheia; e IV – as receitas da atividade ou do objeto principal da pessoa jurídica não compreendidas no inciso I ao inciso III do caput.” (grifou-se)

Além de definir o conceito de receita bruta, no regime de tributação com base no lucro real, o art. 208, I, II, III e IV, do RIR/2018 define o conceito de receita bruta, no regime de tributação com base no lucro presumido, à luz do art. 591, caput, do RIR/2018, que tem a seguinte redação:

“Art. 591. A base de cálculo do imposto sobre a renda e do adicional, em cada trimestre, será determinada por meio da aplicação do percentual de oito por cento sobre a receita bruta definida pelo art. 208, auferida no período de apuração, deduzida das devoluções e das vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos, e observado o disposto no § 7º do art. 238 e nas demais disposições deste Título e do Título XI (Lei nº 9.249, de 1995, art. 15 ; e Lei n.  9.430, de 1996, art. 1º e art. 25, caput, inciso I) .” (grifou-se)

Portanto, os juros sobre o capital próprio auferidos por pessoa jurídica dedicada à atividade econômica de participação no capital de outras sociedades devem compor a receita bruta para o cômputo do lucro presumido, a teor do art. 208, I, II, III e IV, e 591, caput, do RIR/2018.

Para o cômputo do lucro presumido, a pessoa jurídica dedicada à atividade econômica de participação no capital de outras sociedades deve aplicar sobre a receita decorrente dos juros sobre o capital próprio o percentual de presunção de 8% (oito por cento), conforme o art. 591, caput, do RIR/2018, para fins de IRPJ, e o percentual de presunção de 12% (doze por cento), segundo o art. 20 da Lei n. 9.249, de 26 de dezembro de 1995, para fins de CSLL.

S.m.j., é a opinião legal.

Taxa de licença para localização ou exercício de atividades. Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, art. 56. Município de Farroupilha. Incompetência para instituição e cobrança, no caso de pessoa (natural ou jurídica) desenvolver atividade econômica de baixo risco. Superveniência da Lei n. 13.874, de 20 de setembro de 2019 (“Lei da Liberdade Econômica”)

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Prezado(s) Senhor(es),

A Comissão Especial de Direito Tributário da Ordem dos Advogados do Rio Grande do Sul (OAB/RS), na pessoa do seu Presidente, Dr. Rafael Korff Wagner, solicita parecer a respeito da (aparente) antinomia entre o art. 56 da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, que instituiu a taxa de licença para localização ou exercício de atividades, no Município de Farroupilha, e o art. 3.º, I, da Lei n. 13.874, de 20 de setembro de 2019 (“Lei da Liberdade Econômica”), que declarou o direito de toda pessoa (natural ou jurídica) de desenvolver atividade econômica de baixo risco, independentemente de qualquer ato público de liberação.

Do seu ponto de vista, a (aparente) antinomia entre o art. 56 da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, de um lado, e o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, de outro, decorreria do fato de que o direito de toda pessoa (natural ou jurídica) de desenvolver atividade econômica de baixo risco, independentemente de qualquer ato público de liberação, contradiria a hipótese de incidência da taxa de licença para localização ou exercício de atividades, no que diz respeito às atividades de baixo risco, prevista pelo art. 56 da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, no Município de Farroupilha.

1. DA AUSÊNCIA DE ANTINOMIA ENTRE O ART. 56 DA LEI N. 1.007, DE 7 DE OUTUBRO DE 1974, E O ART. 3.º, I, DA LEI DA LIBERDADE ECONÔMICA

Com relação à consulta, entendemos que não há, a rigor, antinomia entre o art. 56 da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974 (“Art. 56. A Taxa de Licença para Localização ou Exercício de Atividade tem como fato gerador o exercício do regular de poder de polícia”), e o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica (“Art. 3.º São direitos de toda pessoa natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômico do País, observado o disposto no parágrafo único: I – desenvolver atividade econômica de baixo risco, para o qual se valha exclusivamente de propriedade privada própria ou de terceiros consensuais, sem a necessidade de quaisquer atos públicos de liberação da atividade econômica”).

Como se sabe, a antinomia é o fenômeno que ocorre toda vez que duas normas atribuem ao mesmo suporte de fato consequências jurídicas incompatíveis entre si: “em virtude de uma primeira norma, N1, o suporte de fato F tem a consequência G; em virtude de uma segunda norma, N2, o mesmo suporte de fato F tem a consequência não-G. Estas situações de conflito, de contraste, de incompatibilidade entre normas, se chamam comumente de ‘antinomia'”, ensina GUASTINI[1].

No caso, o suporte de fato da norma jurídica enunciada pelo art. 56 da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974 (“o exercício regular do poder de polícia”), não é o mesmo suporte de fato da norma jurídica enunciada pelo art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica (“desenvolver atividade econômica de baixo risco, para o qual se valha exclusivamente de propriedade privada própria ou de terceiros consensuais”). Por isso, o suporte de fato da norma jurídica enunciada pelo art. 56 da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, não se sobrepõe nem totalmente nem parcialmente sobre o suporte de fato da norma jurídica enunciada pelo art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica (“desenvolver atividade econômica de baixo risco, para o qual se valha exclusivamente de propriedade privada própria ou de terceiros consensuais”), ou vice-versa.

Dessa maneira, entre o art. 56 da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, que instituiu a taxa de licença para localização ou exercício de atividades, no Município de Farroupilha, e o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, que declarou o direito de toda pessoa (natural ou jurídica) de desenvolver atividade econômica de baixo risco, independentemente de qualquer ato público de liberação, não há antinomia, seja total[2], seja parcial[3].

2. DA COMPETÊNCIA ANEXA PARA A INSTITUIÇÃO E COBRANÇA DE TAXAS

Contudo, a ausência de antinomia entre o art. 56 da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, de um lado, e o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, de outro, não implica, necessariamente, que o Município de Farroupilha possa instituir e cobrar a taxa de licença para localização ou exercício de atividades, no caso de a pessoa (natural ou jurídica) desenvolver atividade econômica de baixo risco, tais como serviços advocatícios, que foram enumerados como atividade de baixo risco pelo item CCLIV do Anexo I da Resolução n. 51, de 11 de junho de 2019, do Comitê para Gestão da Rede Nacional para Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios, que definiu o conceito de baixo risco, para dispensa de atos públicos de liberação, relativos à operação ou funcionamento de atividade econômica (Lei da Liberdade Econômica, Art. 3.º, § 1.º, I)[4].

Para instituir e cobrar a taxa de licença para localização ou exercício de atividades, no caso de a pessoa (natural ou jurídica) desenvolver atividade econômica de baixo risco, é necessário que o Município de Farroupilha seja competente para exercer o respectivo poder de polícia, como “atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato […], em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos”[5]. Embora a competência para a instituição e cobrança de taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição, seja concorrente[6], para a sua instituição e cobrança a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão ser competentes ou para exercer o poder de polícia ou para prestar o serviço público: é a chamada competência anexa, de que trata o art. 80 do Código Tributário Nacional (CTN) (“Art. 80. Para efeito de instituição e cobrança de taxas, consideram-se compreendidas no âmbito das atribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios aquelas que, segundo a Constituição Federal, as Constituições dos Estados, as Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios e a legislação com elas compatível, competem a cada uma dessas pessoas de direito público.”)

A título elucidativo, o art. 80 do CTN, que dispõe sobre a competência anexa, para a instituição e cobrança das taxas, repousa suas raízes sobre o princípio da conexão (Konnexitätsprinzip), consagrado pelo § 1.º do art. 104(a) da Lei Fundamental da República Federal Alemã, de 8 de maio de 1949 (Grundgesetz für dia Bundesrepublick Deutschland)[7]. De acordo com este princípio, num Estado Federativo (der Bundesstaat), a Federação (der Bund) e os Estados (die Länder) deverão suportar, separadamente, as despesas decorrentes do exercício das suas competências[8].

Por razões do princípio da conexão (Konnexitätsprinzip), reproduzido pela competência anexa, para a instituição e cobrança de taxas (CTN, Art. 80), o eg. STF já declarou, por exemplo, a inconstitucionalidade da taxa estadual de expediente, para a aprovação de programação de rádio e televisão (RE 73.895, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Gallotti, vu, j. 19/09/1972, DJ 01/12/1972)[9] e a inconstitucionalidade da taxa de serviços estaduais, para o funcionamento de jogos lícitos e amplificadores de som (Rp 991, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cunha Peixoto, vu, j. 10/05/1979, DJ 15/10/1979)[10].

Sendo assim, o Município de Farroupilha poderá instituir e cobrar a taxa de licença para localização ou exercício de atividades, no caso de a pessoa (natural ou jurídica) desenvolver atividade econômica de baixo risco, se e somente se for competente para licenciar a localização ou o exercício de atividades de baixo risco. Caso contrário, não, porque as taxas são tributos contraprestacionais ou comutativos, no sentido de que financiam as despesas públicas decorrentes seja do exercício do poder de polícia, seja da prestação, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis (princípio da equivalência)[11].

3. DA INCOMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO DE FARROUPILHA PARA A INSTITUIÇÃO E COBRANÇA DA TAXA DE LICENÇA PARA LOCALIZAÇÃO OU EXERCÍCIO DE ATIVIDADES DE BAIXO RISCO

No que diz respeito a essa questão, o Município de Farroupilha poderá argumentar que seja competente para licenciar a localização ou o exercício de atividades de baixo risco, conforme o art. 59, caput, da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, que dispõe o seguinte:

“Art. 59. Nenhuma atividade poderá ser exercida no Município, sem o prévio licenciamento.”

Todavia, no caso de a pessoa (natural ou jurídica) desenvolver atividade econômica de baixo risco, é inquestionável que a superveniência do art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, que declarou o direito de toda pessoa (natural ou jurídica) de desenvolver atividade econômica de baixo risco, independentemente de qualquer ato público de liberação[12], suspendeu a eficácia do art. 59, caput, da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974.

Se não, vejamos.

Em matéria de competência legislativa, o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica encontra o seu fundamento de validade no art. 24, I, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988:

“Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal dispor sobre: I – direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico”. (grifou-se)

A propósito, o art. 24, I, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, é remetido, expressamente, pelo próprio art. 1.º, § 4.º, da Lei da Liberdade Econômica, como fundamento de validade do seu art. 3.º, I:

“Art. 1.º […] § 4.º  O disposto nos arts. 1º, 2º, 3º e 4º desta Lei constitui norma geral de direito econômico, conforme o disposto no inciso I do caput e nos §§ 1º, 2.º, 3.º e 4.º do art. 24 da Constituição Federal, e será observado para todos os atos públicos de liberação da atividade econômica executados pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, nos termos do § 2º deste artigo”. (grifou-se)

Como norma geral de direito econômico, decorrente do exercício da competência legislativa concorrente, prevista pelo art. 24, I, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica suspendeu, parcialmente, a eficácia do art. 59, caput, da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, à luz do art. 24, § 4.º, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988 (“Art. 24. […] § 4.º A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia de lei estadual, no que lhe for contrário”).

No ordenamento jurídico brasileiro, a competência legislativa concorrente é não cumulativa, ou seja, reserva à União a competência para a edição de normas gerais[13], enquanto aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, a competência para a edição de normas suplementares, seja para o o acréscimo de pormenores (competência complementar), seja para a supressão de lacunas (competência suplementar)[14].  Por isso, a superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia de lei estadual, distrital ou municipal, a teor do art. 24, § 4.º, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988.

Esta é a lição de Menezes de Almeida:

“Ao admitir, no parágrafo anterior [§ 3.º], a competência supletiva estadual [municipal] na ausência de normas gerais federais, a Constituição não destituiu a União de sua competência de editar aqueles normas. Apenas provê para que os Estados [e os Municípios] não fiquem impedidos de desempenhar atribuições por falta de normação a cargo da União. Mas esta decidiu exercer a competência que originalmente lhe pertence, prevalecerão as normas gerais que vier a produzir, suspendendo-se a eficácia da legislação estadual [municipal] que com elas conflitar.

Tendo optado, na espécie, pela suspensão da eficácia, deixou claro a Constituição que não se trata de hipótese de revogação da lei estadual [municipal] pela lei federal. Isto significa que, eventualmente se der a revogação da lei federal de normas gerais, a lei estadual [municipal] que teve sua eficácia suspensa por incompatibilidade com aquelas recobra a eficácia e volta a aplicar-se.”[15]         

Em igual sentido, segue a jurisprudência do eg. STF: ADI 903 (Tribunal Pleno, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 22/5/2013, DJe 07/02/2014)[16]; ADI 5.568 (Tribunal Pleno, Rel. p/acórdão Min. Edson Fachin, j. 27/09/2019, DJe 15/10/2019)[17].

Portanto, o Município de Farroupilha não é competente para licenciar a localização ou o exercício de atividades de baixo risco, conforme o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, que suspendeu, parcialmente, a eficácia do art. 59, caput, da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, a teor art. 24, § 4.º, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Consequentemente, não pode cobrar a taxa de licença para localização ou exercício de atividades, no caso de a pessoa (natural ou jurídica) desenvolver atividade econômica de baixo risco, porque não suporta despesas públicas decorrentes da licença para a localização ou o exercício de atividades de baixo risco (princípio da equivalência).

4. DA APLICABILIDADE DO ART. 3.º, I, DA LEI DA LIBERDADE ECONÔMICA AO DIREITO TRIBUTÁRIO     

Entretanto, o Município de Farroupilha poderá contrapor que o § 3.º do art. 1.º da Lei da Liberdade Econômica prescreve que a declaração do direito de toda pessoa (natural ou jurídica) de desenvolver atividade econômica de baixo risco, independentemente de qualquer ato público de liberação, prevista pelo seu art. 3.º, I, não se aplicaria ao direito tributário. Enuncia o § 3.º do art. 1.º da Lei da Liberdade Econômica que “O disposto neste Capítulo e nos Capítulos II e III desta Lei não se aplica ao direito tributário e ao direito financeiro, ressalvado o disposto no inciso X do caput do art. 3.º desta Lei” (grifou-se).

Embora tenhamos concluído que o Município de Farroupilha não poderá cobrar a taxa de licença para localização ou exercício de atividades, no caso de a pessoa (natural ou jurídica) desenvolver atividade econômica de baixo risco, sob o argumento de que não tem competência para licenciar a localização ou o exercício de atividades de baixo risco, conforme o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, que suspendeu, parcialmente, a eficácia do art. 59, caput, da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, a teor art. 24, § 4.º, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, não temos dúvida que o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, que declarou o direito de toda pessoa (natural ou jurídica) de desenvolver atividade econômica de baixo risco, independentemente de qualquer ato público de liberação, seja aplicável ao direito tributário.

Antes de mais nada, o direito de toda pessoa (natural ou jurídica) de desenvolver atividade econômica de baixo risco, independentemente de qualquer ato público de liberação, previsto pelo art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, é um dos desdobramentos da liberdade de iniciativa, consagrada pelo parágrafo único do art. 170 da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988 (“Art. 170. […] Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.”)

Dado o status de direito fundamental, a liberdade de iniciativa tem duas dimensões. A primeira é a dimensão subjetiva, que atribui para o seu titular um ou mais interesses juridicamente tutelados por meio de direitos públicos subjetivos. A segunda é a dimensão objetiva, que irradia efeitos sobre o direito público e o direito privado como ordem objetiva de valor(es) com estrutura normativa de princípio jurídico[18].

A saber, a teoria da multidimensionalidade dos direitos fundamentais, no sentido de que os direitos, as liberdades e as liberdades fundamentais têm uma dimensão subjetiva, que atribui para o seu titular um ou mais interesses juridicamente protegidos por meio de direitos públicos subjetivos, e uma dimensão objetiva, que irradia efeitos sobre o direito público e o direito privado como ordem objetiva de valores com estrutura normativa de princípio jurídico, foi construída pela teoria dos direitos fundamentais, a partir de precedentes do Tribunal Constitucional Alemão (Bundesverfassungsgereciht), que chegaram à conclusão de que os direitos, as liberdades e as garantias fundamentais estruturariam uma ordem objetiva de valores[19]. Essa ordem objetiva de valores se desdobraria no dever de o legislador, o administrador e o juiz de interpretar as normas de direito ordinário conforme os valores dos direitos fundamentais (dever de interpretação conforme) e no dever de o legislador, o administrador e o juiz de proteger os valores dos direitos fundamentais em toda e qualquer decisão (dever de proteção)[20].

Nas palavras de ALEXY:

“Segundo a jurisprudência reiterada dos Tribunal Constitucional Federal, as normas de direitos fundamentais contêm não apenas direitos subjetivos de defesa do indivíduo contra o Estado, elas representam também uma ordem objetiva de valores, que vale como decisão constitucional fundamental para todos os ramos do direito, e que fornece diretrizes e impulsos para a legislação, a Administração e a jurisprudência”[21].

Dessa forma, o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, que declarou o direito de toda pessoa (natural ou jurídica) de desenvolver atividade econômica de baixo risco, independentemente de qualquer ato público de liberação, quer queira, quer não, é aplicável ao direito tributário, na medida em que constitui um dos desdobramentos da liberdade de iniciativa, que irradia efeitos sobre o direito público e o direito privado como ordem objetiva de valor(es) com estrutura normativa de princípio jurídico (dever de interpretação conforme), e que deve ser protegida, na maior medida possível, nas decisões legislativas, administrativas e judiciais (dever de proteção).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ante ao exposto, entre o art. 56 da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, que instituiu a taxa de licença para localização ou exercício das atividades, no Município de Farroupilha, e o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, que declarou o direito de toda pessoa (natural ou jurídica) de desenvolver atividade econômica de baixo risco, independentemente de qualquer ato público de liberação, não há antinomia, seja total, seja parcial.

Contudo, a ausência de antinomia entre o art. 56 da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, de um lado, e o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, de outro, não implica, necessariamente, que o Município de Farroupilha poderá cobrar a taxa de licença para localização ou exercício de atividades, no caso de a pessoa (natural ou jurídica) desenvolver atividade econômica de baixo risco, tais como serviços advocatícios, que foram enumerados como atividade de baixo risco pelo item CCLIV do Anexo I da Resolução n. 51, de 11 de junho de 2019, do Comitê para Gestão da Rede Nacional para Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios, que definiu o conceito de baixo risco, para dispensa de atos públicos de liberação, relativos à operação ou funcionamento de atividade econômica, conforme o art. 3.º, § 1.º, I, da Lei da Liberdade Econômica.

Em realidade, o Município de Farroupilha poderá cobrar a taxa de licença para localização ou exercício de atividades, no caso de a pessoa (natural ou jurídica) desenvolver atividade econômica de baixo risco, se e somente se for competente para licenciar a localização ou o exercício de atividades de baixo risco. Caso contrário, não, porque as taxas são tributos contraprestacionais ou comutativos, no sentido de que financiam as despesas públicas decorrentes seja do exercício do poder de polícia, seja da prestação, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis (princípio da equivalência).

Do nosso ponto de vista, o Município de Farroupilha não é competente para licenciar a localização ou o exercício de atividades de baixo risco, conforme o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, que suspendeu, parcialmente, a eficácia do art. 59, caput, da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, a teor art. 24, § 4.º, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Por via de consequência lógica, não poderá instituir e cobrar a taxa de licença para localização ou exercício de atividades, no caso de a pessoa (natural ou jurídica) desenvolver atividade econômica de baixo risco, porque não suporta despesas públicas decorrentes da licença para a localização ou o exercício de atividades de baixo risco (princípio da equivalência).

Quanto a essa conclusão, o Município de Farroupilha poderá contrapor que o § 3.º do art. 1.º da Lei da Liberdade Econômica prescreve que a declaração do direito de toda pessoa (natural ou jurídica) de desenvolver atividade econômica de baixo risco, independentemente de qualquer ato público de liberação, prevista pelo seu art. 3.º, I, não se aplicaria ao direito tributário. Enuncia o § 3.º do art. 1.º da Lei da Liberdade Econômica que “O disposto neste Capítulo e nos Capítulos II e III desta Lei não se aplica ao direito tributário e ao direito financeiro, ressalvado o disposto no inciso X do caput do art. 3.º desta Lei” (grifou-se).

Embora tenhamos concluído que o Município de Farroupilha não poderá instituir e cobrar a taxa de licença para localização ou exercício de atividades, no caso de a pessoa (natural ou jurídica) desenvolver atividade econômica de baixo risco, sob o argumento de que não tem competência para licenciar a localização ou o exercício de atividades de baixo risco, conforme o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, que suspendeu, parcialmente, a eficácia do art. 59, caput, da Lei n. 1.007, de 7 de outubro de 1974, a teor do art. 24, § 4.º, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, não temos dúvida que o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica, que declarou o direito de toda pessoa (natural ou jurídica) de desenvolver atividade econômica de baixo risco, independentemente de qualquer ato público de liberação, seja aplicável ao direito tributário.

Certamente, o art. 3.º, I, da Lei da Liberdade Econômica é aplicável ao direito tributário, na medida em que constitui um dos desdobramentos da liberdade de iniciativa, que irradia efeitos sobre o direito público e o direito privado como ordem objetiva de valor(es)ƒ com estrutura normativa de princípio jurídico (dever de interpretação conforme), e que deve ser protegida, na maior medida possível, nas decisões legislativas, administrativas e judiciais (dever de proteção).

S.m.j., é o parecer.

Diego Galbinski

Pedro Acosta de Oliveira

[1] Guastini, Riccardo. Le fonti del diritto. Milano: Dott. A. Giuffrè Editore, 2010, p. 355. Tradução livre do original: “In virtù di una prima norma, N1, la fattispecie F ha la conseguenza G; in virtù di una seconda norma, N2, la stessa fattispecie F ha la conseguenza non-G. Queste situazioni di conflitto, contrasto, o incompatibilità tra la norme si dicono comumente ‘antinomie'”.

[2] A antinomia é total quando duas normas atribuem consequências jurídicas incompatíveis entre si para a mesma classe de suporte de fato. Por exemplo, uma norma qualifica como lícito e outra norma, como ilícito o jogo de azar (Guastini, 2010, p. 357)

[3] A antinomia parcial pode ser: (i) unilateral, quando uma norma descreve uma classe de suporte de fato que esteja inteiramente incluída na classe de suporte de fato descrita por outra norma — por exemplo, uma norma N1 proíbe fumar (a inteira classe do suporte de fato), enquanto outra norma N2 proíbe fumar cigarro eletrônico (uma subclasse do suporte de fato); (ii) bilateral, quando uma norma descreve uma classe de suporte de fato que se intersecciona com a classe de suporte de fato descrita por outra norma — por exemplo, uma norma N1 proíbe a caça de javali e de lebre, enquanto outra norma N2 proíbe a caça de lebre e de raposa (Ibid., p. 358).

[4] “Art. 3.º São direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País, observado o disposto no parágrafo único do art. 170 da Constituição Federal: […] § 1.º Para fins do disposto no inciso I do caput deste artigo: I – ato do Poder Executivo federal disporá sobre a classificação de atividades de baixo risco a ser observada na ausência de legislação estadual, distrital ou municipal específica”.

[5] CTN, Art. 78: “Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.”

[6] Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, Art. 145, II: “Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: […] II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição”.

[7] “(1) Der Bund und die Länder tragen gesondert die Ausgaben, die sich aus der Wahrnehmung ihrer Aufgaben ergeben, soweit dieses Grundgesetz nichts anderes bestimmt.”

[8] A respeito do princípio da conexão (Konnexitätsprinzip), vide Birk, Dieter. Steuerrecht. 13 ed. Heidelberg: C. F. Müller, 2010, p. 44. 

[9] “Taxa estadual de expediente, no tocante à aprovação de programação de rádio e televisão. Inconstitucionalidade do art. 41, XX, ‘c’, da Lei Mineira n. 4.492, de 14.06.1967. Extraordinário conhecido e provido.”

[10] “TAXA DE SERVIÇOS ESTADUAIS COBRADA PELO ESTADO DE GOIÁS PELA CONCESSÃO DE ALVARÁS PARA O FUNCIONAMENTO DE JOGOS LICITOS E AMPLIFICADORES DE SOM (LEI ESTADUAL N. 8042/75, SUBITEM 1.5.1, LETRAS “G” E “H”; COM BASE NO PODER DE POLICIA. INCONSTITUCIONALIDADE. REPRESENTAÇÃO JULGADA PROCEDENTE” (grifos do original).

[11] A respeito do princípio da equivalência, vide Vasques, Sérgio. O princípio da equivalência como critério de igualdade tributária. Coimbra: Almedina, 2008.

[12] Entendem-se por atos públicos de liberação “a licença, a autorização, a concessão, a inscrição, a permissão, o alvará, o cadastro, o credenciamento, o estudo, o plano, o registro e os demais atos exigidos, sob qualquer denominação, por órgão ou entidade da administração pública na aplicação de legislação, como condição para o exercício de atividade econômica, inclusive o início, a continuação e o fim para a instalação, a construção, a operação, a produção, o funcionamento, o uso, o exercício ou a realização, no âmbito público ou privado, de atividade, serviço, estabelecimento, profissão, instalação, operação, produto, equipamento, veículo, edificação e outros” (Lei da Liberdade Econômica, Art. 1.º, § 6.º).

[13] Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, Art. 24, § 1.º: “Art. 24.  Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: […] § 1.º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.”

[14] Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, Art. 24, §§ 2.º e 3.º, e 30, II: “Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: […] § 2.º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados. § 3.º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades. […] Art. 30. Compete aos Municípios: […] II – suplementar a legislação federal e a estadual no que couber”.

[15] Menezes de Almeida, Fernanda Dias. Comentário ao § 4.º do art. 24. Gomes Canotilho, J.J.; Ferreira Mendes, Gilmar; Sarlet, Ingo Wolfgang; Streck, Leni Luiz (Coord). Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013, p. 757 e 758.  

[16] “Lei 10.820/1992 do Estado de Minas Gerais, que dispõe sobre adaptação dos veículos de transporte coletivo com a finalidade de assegurar seu acesso por pessoas com deficiência ou dificuldade de locomoção. […] Como, à época da edição da legislação ora questionada, não havia lei geral nacional sobre o tema, a teor do § 3.º do art. 24 da CF, era deferido aos Estados-membros o exercício da competência legislativa plena, podendo suprir o espaço normativo com suas legislações locais. A preocupação manifesta no julgamento cautelar sobre a ausência de legislação federal protetiva hoje se encontra superada, na medida em que a União editou a Lei 10.098/2000, a qual dispõe sobre normas gerais e critérios básicos de promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência. Por essa razão, diante da superveniência da lei federal, a legislação mineira, embora constitucional, perde a força normativa, na atualidade, naquilo que contrastar com a legislação geral de regência do tema (art. 24, § 4.º, CF/1988).”

[17] “Tratando-se de norma de natureza de direito do consumidor do serviço de telecomunicações e havendo conflito entre a disciplina federal e a estadual, deve aquela prevalecer. A norma federal, nestes casos, serve à homogeneidade regulatória, afastando a competência dos Estados. A ANATEL, entidade reguladora do setor, no exercício de sua competência normativa prevista nos arts. 19 e 22 da Lei 9.472/97, editou a Resolução 632/2014, que trata do Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações. Segundo o art. 51 do RDC, o fornecimento do contrato pode ser por meio eletrônico, enquanto a norma estadual impugnada obriga o envio por meio de carta registrada. Assim, sobressai a competência da União, nos termos do art. 24, § 4.º […]”.

[18]         A literatura que versa sobre a dupla dimensão dos direitos, das liberdades e das garantias fundamentais, no direito comparado, em geral, e no direito alemão, em especial, é vasta. Entre monografias, capítulos de livros e artigos científicos, é impossível esgotar a bibliografia a respeito do tema. No direito comparado, vide: Möller, Kai. The global model of constitutional rights. Oxford: Oxford, 2012; Möller, Kai. Two conceptions of positive liberty: towards an autonomy-based theory of constitutional rights. Oxford Journal of Legal Studies, v. 29, n. 4, 2009, p. 757-786. Kommers, Donald P. Germany: Balancing rights and duties. Goldsworthy, Jeffrey (Ed.). Interpreting Constitutions. Oxford: New York, 2007. No direito alemão, por outro lado: Alexy, Robert. Theorie der Grundrechte. Berlin: Suhrkamp, 1986; Canaris, Claus-Wilhelm. Direitos fundamentais e Direito Privado. Tradução de Ingo Wolfgang Sarlet e Paulo Mota Pinto. Coimbra: Almedina, 2003; Hoffmann-Riem,  Wolfgang. Grundrechtsanwendung unter Rationalitäts-anspruch. Der Staat, v. 43, 2004, p. 203-233. No direito brasileiro, por fim: Dias, Eduardo Rocha. Direitos dos consumidores e deveres de proteção. Direitos Fundamentais & Justiça, ano 5, n. 15, abril/junho de 2011, p. 79-105; Sarlet, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 11 ed. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2012; Sarlet, Ingo Wolfgang. A influência dos direitos fundamentais no Direito Privado: o caso brasileiro. Monteiro, António Pinto; Neuner, Jörg; Sarlet, Ingo Wolfgang (Org.). Direitos fundamentais e Direito Privado. Almedina: Coimbra, 2007.

[19] “Todavia, da mesma forma é correto que a Lei Fundamental, que não pretende ser um ordenamento neutro do ponto de vista axiológico (BVerfGE 2, 1 [12]; 5, 85 [134 et seq., 197 et seq.]; 6, 32 [40 s.]), previu também, em seu capítulo dos direitos fundamentais, um ordenamento axiológico objetivo, e que, justamente em função deste, ocorre um aumento da força jurídica dos direitos fundamentais (Klein-v. Mangoldt, Das Bonner Grundgesetz, Vorbem. B III 4 vor Art. 1 S. 93)”. Disponível em: www.servat.unibe.ch/dfr/bv007198.html. Acesso em: 31/08/2022. Tradução livre do original: “Ebenso richtig ist aber, dass das Grundgesetz, das keine wertneutrale Ordnung sein will (BVerfGE 2, 1 [12]; 5, 85 [134 ff., 197 ff.]; 6, 32 [40 f.]), in seinem Grundrechtsabschnitt auch eine objektive Wertordnung aufgerichtet hat und dass gerade hierin eine prinzipielle Verstärkung der Geltungskraft der Grundrechte zum Ausdruck kommt (Klein-v. Mangoldt, Das Bonner Grundgesetz, Vorbem. B III 4 vor Art. 1 S. 93).”

[20] “Este sistema de valores, que encontra o ponto central na personalidade humana e sua dignidade, que se desenvolve livremente dentro da comunidade social, precisa valer como decisão constitucional fundamental para todas as áreas do direito; legislativo, administração pública e judiciário recebem dele diretrizes e impulsos”.  Disponível em: www.servat.unibe.ch/ dfr/bv007198.html. Acesso em: 31/08/2022. Tradução livre do original: “Dieses Wertsystem, das seinen Mittelpunkt in der innerhalb der sozialen Gemeinschaft sich frei entfaltenden menschlichen Persönlichkeit und ihrer Würde findet, muss als verfassungsrechtliche Grundentscheidung für alle Bereiche des Rechts gelten; Gesetzgebung, Verwaltung und Rechtsprechung empfangen von ihm Richtlinien und Impulse. So beeinflußt es selbstverständlich auch das bürgerliche Recht”.

[21] Alexy, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2 ed. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 440.

Imposto sobre a Renda da Pessoa Física (IRPF). Alienação de Participação Societária. Ausência de Ganho de Capital Tributável

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Prezado(s) Senhor(es),

A Companhia Y é sociedade limitada, registrada na Junta Comercial do Estado do Rio Grande do Sul (JUCERGS), em (…), sob o (…) (Alteração Contratual n. 5, Preâmbulo).

Tem sede e foro jurídico na Rua (…), Município de (…), Estado do Rio Grande do Sul, inscrita no CNPJ sob o n. (…) (Contrato Social Consolidado, Cláusula I).

Conforme o seu objeto social, exerce as seguintes atividades econômicas:

(i) fabricação de artefatos de material plástico para outros usos não especificados anteriormente (CNAE 2229399);

(ii) comércio atacadista de resíduos e sucatas não-metalizados, exceto de papel e papelão (CNAE 4687702); e

(iii) recuperação de materiais plásticos (CNAE 3832700) (Contrato Social Consolidado, Cláusula I).

O seu capital social é de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), totalmente subscrito e integralizado, em moeda corrente nacional, dividido em 1.000.000 (um milhão) de quotas, no valor unitário de R$ 1,00 (um real), distribuídas entre os sócios da seguinte forma:

(i) Fulano de Tal, titular de 500.000 (quinhentas mil) quotas, equivalentes a R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais); e

(ii) Ciclano de Tal, titular de 500.000 (quinhentas mil) quotas, equivalentes a R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) (Contrato Social Consolidado, Cláusula II).

  1. Porém, recentemente, o sócio Fulano de Tal comunicou, por escrito, à sociedade o desejo de vender, no todo, suas quotas, pelo preço líquido e certo de R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais), a ser pago da seguinte forma:

(i)      R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), até 18/09/2022;  e

(ii)  R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais), em 10 (dez) prestações mensais e consecutivas, no valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), a partir de 18/08/2022, corrigidas pelo índice da caderneta de poupança.

Manifestado pelo sócio Ciclano de Tal o desejo de adquirir, no todo, as quotas titularizadas pelo sócio Fulano de Tal, as Partes pretendem firmar o contrato de compra e venda de participação societária. Entretanto, visto que a aquisição da sua participação societária custou R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais)([1]), o sócio Fulano de Tal receia que auferirá ganho de capital tributável, sujeito ao pagamento do imposto sobre a renda, no valor de R$ 14.500.000,00 (catorze milhões e quinhentos mil reais).

A respeito, dispõe o art.128, caput, do RIR/2018:

“Art. 128. Fica sujeita ao pagamento do imposto sobre a renda de que trata este Título a pessoa física que auferir ganhos de capital na alienação de bens ou direitos de qualquer natureza (Lei n. 7.713, de 1988, art. 2.º e art. 3.º, § 2.º; e Lei n. 8.981, de 1995, art. 21).”

Para o cálculo do ganho de capital, considera-se o valor de alienação o preço efetivo da operação (RIR/2018, Art. 134, I)([2]) — no caso, R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais) — e o custo de aquisição o valor pago na sua aquisição   (RIR/2018, Art. 136, caput) — no caso, R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais)([3]). Logo, é justo o receio do sócio Fulano de Tal de que auferirá ganho de capital tributável, sujeito ao pagamento do imposto sobre a renda, decorrente da alienação da participação societária, no valor de R$ 14.500.000,00 (catorze milhões e quinhentos mil reais).

  1. Entretanto, antes de as Partes firmarem o contrato de compra e venda, o custo de aquisição da participação societária detida pelo sócio Fulano de Tal poderá ser elevado ou aumentado, através da distribuição de novas quotas decorrentes da incorporação ao capital social dos lucros acumulados que foram registrados no patrimônio líquido da Companhia Y em 31/12/2021, equivalentes à quantia de R$ 31.155.490,13 (trinta e um milhões e cento e cinquenta e cinco mil e quatrocentos e noventa reais e treze centavos).

Segundo o balanço levantado em 31/12/2021, a alienação da participação societária detida pelo sócio Fulano de Tal não deveria, a rigor, implicar o auferimento de ganho de capital tributável, porque o patrimônio líquido da Companhia Y é de R$ 32.731.632,63 (trinta e dois milhões e setecentos e trinta e um mil e seiscentos e trinta e dois reais e sessenta e três centavos), sendo composto por 2 (contas):

(i) capital social, no valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais); e

(ii) reservas, no valor de R$ 31.731.632,63 (trinta e um milhões e setecentos e trinta e um mil e seiscentos e trinta e dois reais e sessenta e três centavos), dos quais R$ 576.142,50 (quinhentos e setenta e seis mil e cento e quarenta e dois reais e cinquenta centavos) são a título de reserva de lucros, e R$ 31.155.490,13 (trinta e um milhões e cento e cinquenta e cinco mil e quatrocentos e noventa reais e treze centavos), a título de lucros acumulados.

Todavia, a participação societária detida por pessoa física, ao contrário da participação societária detida por pessoa jurídica, não deve ser avaliada pelo método de equivalência patrimonial, mas pelo método do custo de aquisição. Por isso, a despeito da isenção dos lucros ou dividendos, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado([4]), é necessário que a Companhia Y incorpore os lucros acumulados, correspondentes a R$ 31.155.490,00 (trinta e um milhões e cento e cinquenta e cinco mil e quatrocentos e nova reais), ao seu capital social e distribua novas 31.155.490  (trinta e uma milhões e cento e cinquenta e cinco mil e quatrocentas e noventa) quotas, no valor unitário de R$ 1,00 (um real), aos sócios Fulano de Tal e Ciclano de Tal, na proporção para cada de 15.577.745 (quinze milhões e quinhentas e setenta e sete mil e setecentas e quarenta e cinco) quotas, equivalentes a R$ 15.577.745,00 (quinze milhões e quinhentos e setenta e sete mil e setecentos e quarenta e cinco reais), antes de firmarem o contrato de compra e venda.

Dessa forma, o valor do capital social da Companhia Y será aumentado para R$ 32.155.490,00 (trinta e dois milhões e cento e cinquenta e cinco mil e quatrocentos e noventa reais), totalmente subscrito e integralizado, em moeda corrente nacional, dividido em 32.155.490 (trinta e duas milhões e cento e cinquenta e cinco mil e quatrocentas e noventa) quotas, no valor unitário de R$ 1,00 (um real), distribuídas entre os sócios da seguinte forma:

(i) Fulano de Tal, titular de 16.077.745 (dezesseis milhões e setenta e sete mil e setecentas e quarenta e cinco) quotas, equivalentes a R$ 16.077.745,00 (dezesseis milhões e setenta e sete mil e setecentos e quarenta e cinco reais); e

(ii) Ciclano de Tal, titular de 16.077.745 (dezesseis milhões e setenta e sete mil e setecentas e quarenta e cinco) quotas, equivalentes a R$ 16.077.745,00 (dezesseis milhões e setenta e sete mil e setecentos e quarenta e cinco reais).

A distribuição das novas 15.077.745 (quinze milhões e setenta e sete mil e setecentas e quarenta e cinco) quotas, equivalentes a R$ 15.077.745,00 (quinze milhões e setenta e sete mil e setecentos e quarenta e cinco reais), decorrentes da incorporação ao capital social dos lucros acumulados que foram registrados no patrimônio líquido da Companhia Y em 31/12/2021, no valor de R$ 31.155.490,13 (trinta e um milhões e cento e cinquenta e cinco mil e quatrocentos e noventa reais e treze centavos), elevará ou aumentará o custo de aquisição da participação societária detida pelo sócio Fulano de Tal. De modo que ele não auferirá ganho de capital tributável, sujeito ao pagamento do imposto sobre a renda, decorrente da alienação da participação societária para o sócio Ciclano de Tal, porque o valor de alienação (RIR/2018, Art. 134, I)([5]) — no caso, R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais) — será menor do que o custo de aquisição (RIR/2018, Art. 136, caput) — no caso, R$ 16.077.745,00 (dezesseis milhões e setenta e sete mil e setecentos e quarenta e cinco reais) —, conforme o art. 145 do RIR/2018.

A propósito, dispõe o art. 145 do RIR/2018:

“Art. 145. Na hipótese de quotas ou ações distribuídas em decorrência de aumento de capital por incorporação de lucros apurados a partir do mês de janeiro de 1996 ou de reservas constituídas com esses lucros, o custo de aquisição será igual à parcela de lucro ou da reserva capitalizado que corresponder ao sócio ou acionista (Lei n. 9.249, de 1995, art. 10, § 1.º).” (grifou-se)

Na Solução de Consulta n. 45, de 27 de junho de 2013,  a Superintendência da 4.ª Região Fiscal da Receita Federal do Brasil (SRRF/4.ª Região Fiscal), por exemplo, chegou à mesma conclusão:

“EFEITO DO AUMENTO DO CAPITAL SOCIAL, MEDIANTE INCORPORAÇÃO DE LUCROS OU RESERVAS, COM OU SEM EMISSÃO DE NOVAS AÇÕES, NA ATUALIZAÇÃO DO CUSTO FISCAL DE AQUISIÇÃO DE PARTICIPAÇÃO SOCIETÁRIA. MÉTODO DO CUSTO DE AQUISIÇÃO.

Na espécie consultada, no tocante, especificamente, ao método do custo de aquisição, a capitalização de reserva de capital, com ou sem a emissão de novas ações, implica, para o acionista, o benefício de aumento do custo fiscal de aquisição do investimento, nos termos previstos na legislação de regência, para fins de apuração do futuro ganho de capital tributável. Dispositivos legais: Lei n. 6.404, de 1976, arts. 169, caput e § 1.º, 182, § 1.º, alínea ‘a’, 200, IV, e alterações posteriores; Decreto n. 3.000, de 1999 (RIR/1999), arts. 135, 381, 382, 383, 442, 658, 659 e 662; Instrução Normativa RFB n. 1.022, de 2010, art. 47, § 1.º).”

  1. Ante ao exposto, antes de as Partes firmarem o contrato de compra e venda, o custo de aquisição da participação societária detida pelo sócio Fulano de Tal poderá ser elevado ou aumentado, através da distribuição de novas quotas decorrentes da incorporação ao capital social dos lucros acumulados que foram registrados no patrimônio líquido da Companhia Y em 31/12/2021, equivalentes à quantia de R$ 31.155.490,13 (trinta e um milhões e cento e cinquenta e cinco mil e quatrocentos e noventa reais e treze centavos).

Dessa forma, o valor do capital social da Companhia Y será aumentado para R$ 32.155.490,00 (trinta e dois milhões e cento e cinquenta e cinco mil e quatrocentos e noventa reais), totalmente subscrito e integralizado, em moeda corrente nacional, dividido em 32.155.490 (trinta e duas milhões e cento e cinquenta e cinco mil e quatrocentas e noventa) quotas, no valor unitário de R$ 1,00 (um real), distribuídas entre os sócios da seguinte forma:

(i) Fulano de Tal, titular de 16.077.745 (dezesseis milhões e setenta e sete mil e setecentas e quarenta e cinco) quotas, equivalentes a R$ 16.077.745,00 (dezesseis milhões e setenta e sete mil e setecentos e quarenta e cinco reais); e

(ii) Ciclano de Tal, titular de 16.077.745 (dezesseis milhões e setenta e sete mil e setecentas e quarenta e cinco) quotas, equivalentes a R$ 16.077.745,00 (dezesseis milhões e setenta e sete mil e setecentos e quarenta e cinco reais).

A distribuição das novas 15.077.745 (quinze milhões e setenta e sete mil e setecentas e quarenta e cinco) quotas, equivalentes a R$ 15.077.745,00 (quinze milhões e setenta e sete mil e setecentos e quarenta e cinco reais), elevará ou aumentará o custo de aquisição da participação societária detida pelo sócio Fulano de Tal, de modo que ele não auferirá ganho de capital tributável, sujeito ao pagamento do imposto sobre a renda, decorrente da alienação da participação societária para o sócio Ciclano de Tal, porque o valor de alienação (RIR/2018, Art. 134, I)([6]) — no caso, R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais) — será menor do que o custo de aquisição (RIR/2018, Art. 136, caput) — no caso, R$ R$ 16.077.745,00 (dezesseis milhões e setenta e sete mil e setecentos e quarenta e cinco reais) —, conforme o art. 145 do RIR/2018.

S.m.j., é o parecer.

([1])           “Art. 136. O custo de aquisição dos bens ou dos direitos será o valor pago na sua aquisição (Lei n. 8.383, de 1991, art. 96, caput e § 5.º e § 9.º; Lei n. 8.981, de 1995, art. 22, caput, incisos I e II; Lei n. 9.249, de 1995, art. 17 e art. 30).”

([2])           “Art. 134. Considera-se valor de alienação (Lei n. 7.713, de 1988, art. 19, caput e parágrafo único; Lei n. 9.430, de 1996, art. 19 e art. 24; e Lei n. 10.451, de 10 de maio de 2002, art. 4.º): I – o preço efetivo da operação, nos termos estabelecidos no § 4.º do art. 128)”.

([3])           “Art. 136. O custo de aquisição dos bens ou dos direitos será o valor pago na sua aquisição (Lei n. 8.383, de 1991, art. 96, caput e § 5.º e § 9.º; Lei n. 8.981, de 1995, art. 22, caput, incisos I e II; Lei n. 9.249, de 1995, art. 17 e art. 30).”

([4])           Lei n. 9.249, de 26 de dezembro de 1995, Art. 10: “Art. 10. Os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no País ou no exterior.”

([5])           “Art. 134. Considera-se valor de alienação (Lei n. 7.713, de 1988, art. 19, caput e parágrafo único; Lei n. 9.430, de 1996, art. 19 e art. 24; e Lei n. 10.451, de 10 de maio de 2002, art. 4.º): I – o preço efetivo da operação, nos termos estabelecidos no § 4.º do art. 128)”.

([6])           “Art. 134. Considera-se valor de alienação (Lei n. 7.713, de 1988, art. 19, caput e parágrafo único; Lei n. 9.430, de 1996, art. 19 e art. 24; e Lei n. 10.451, de 10 de maio de 2002, art. 4.º): I – o preço efetivo da operação, nos termos estabelecidos no § 4.º do art. 128)”.

Ref. Comissão de Direito Tributário da Divisão Jurídica da Federasul. Supremo Tribunal Federal (STF). Repercussão Geral. Tema 881. Limites da Coisa Julgada em Matéria Tributária

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Em 12/05/2022, o pedido de vista do Min. Alexandre de Moraes suspendeu o julgamento do RE 949297, em que o Tribunal Pleno do eg. Supremo Tribunal Federal (STF) havia reconhecido a existência de repercussão geral do seguinte tema:

“Limites da coisa julgada em matéria tributária, notadamente diante de julgamento, em controle concentrado pelo Supremo Tribunal Federal, que declara a constitucionalidade de tributo anteriormente considerado inconstitucional, na via do controle incidental, por decisão transitada em julgado.”

O RE 929297 foi interposto pela União contra acórdão proferido pela col. 3.ª Turma do eg. Tribunal Regional da 5.ª Região (TRF5) que deu provimento à apelação de TBM – TEXTIL BEZERRA DE MENEZES S/A, a fim de assegurar o direito líquido e certo de não recolher a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), decorrente de sentença transitada em julgado que declarara, incidentalmente, a inconstitucionalidade da Lei n. 7.689, de 15 de dezembro de 1988.

É a seguinte a ementa do acórdão recorrido:

“PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO. LEI 7689/88. MANDADO DE SEGURANÇA. OFENSA À COISA JULGADA. APELAÇÃO PROVIDA.

  1. A sentença prolatada nos autos do mandado de segurança 127/89/CE declarou a inconstitucionalidade da Lei 7689/88 tendo sido mantido por esta Corte o trânsito em julgado.
  2. ‘(…) a sentença rescindenda, que reconheceu ser integralmente inconstitucional a Lei 7689/88, instituidora da contribuição social sobre o lucro líquido das pessoas jurídicas para financiamento da seguridade social, porque prolatada antes da publicação da decisão do STF declarando a inconstitucionalidade apenas do art. 8.o da mencionada lei (RE 138284-CE, Rel. Min. Carlos Velloso, DJU 28/08/92, p. 13456), não deve sofrer os efeitos provenientes dessa declaração – ‘Se as questões de fato e de direito reguladas pela norma julgada inconstitucional se encontram definitivamente encerradas porque sobre elas incidem caso julgado judicial, porque se perdeu um direito por prescrição ou caducidade, porque o ato se tornou impugnável, porque a relação se extinguiu com o cumprimento da obrigação, então a dedução de inconstitucionalidade, com a consequente nulidade ipso jure, não perturba, através da sua eficácia retroativa esta vasta gama de situações ou relações consolidadas’ (J. J. GOMES CANOTILHO). – Inegável a aplicação do entendimento firmado por nossos Tribunais Superiores, segundo o qual ‘A mudança de entendimento dos Tribunais Superiores não autoriza o pedido de rescisão do julgado, com base na violação literal de lei (Artigo 45, Inciso V do Código de Processo Civil).’ (REsp 227.458-CE, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 06/04/2000, DJU 05/06/2000). – Improvimento dos embargos infringentes mantendo-se incólume o acórdão que reconheceu a improcedência do pedido de rescisão (EIAR – Embargos Infringentes na Ação Rescisória – 311, DJU 22.08.2022, Rel. Des. Fed. Ubaldo Cavalcanti)’.
  3. Apelação provida.”

No julgamento do RE 949297, o Relator, Min. Edson Fachin, votou no sentido de que o juízo de constitucionalidade do Tribunal Pleno do eg. STF possuiria a aptidão para alterar o estado de direito da relação tributária de trato continuado, por força do art. 28 da Lei 9.868, de 10 de novembro de 1999. Rompido o silogismo da coisa julgada, os seus efeitos prospectivos (para o futuro) cessariam a partir da publicação da ata de julgamento do Tribunal Pleno do eg. STF.

Ao final, o Min. Edson Fachin sugeriu a fixação da seguinte tese de repercussão geral:

“A eficácia temporal de coisa julgada material derivada de relação tributária de trato continuado possui condição resolutiva que se implementa com a publicação de ata de ulterior julgamento realizado em sede de controle abstrato e concentrado de constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, quando os comandos decisionais sejam opostos; observadas as regras constitucionais da irretroatividade, da anterioridade anual e da noventena ou da anterioridade nonagesimal, de acordo com a espécie tributária em questão. ”

Até o momento, o voto do Min. Edson Fachin foi acompanhado pela Min.ª Rosa Weber, pelo Min. Luís Roberto Barroso e pelo Min. Dias Toffoli. O Min. Luís Roberto Barroso, porém, sugeriu a fixação de outra tese de repercussão geral, que foi acompanhada pelo Min. Dias Toffoli:

“1. As decisões do STF em controle incidental de constitucionalidade, anteriores à instituição do regime de repercussão geral, não impactam automaticamente a coisa julgada que se tenha formado, mesmo nas relações jurídicas tributárias de trato sucessivo. 2. Já as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral interrompem automaticamente os efeitos temporais das sentenças transitadas em julgado nas referidas relações, respeitadas a irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal, conforme a natureza do tributo.”

Por sua vez, o Min. Gilmar Mendes divergiu, em parte, do voto do Min. Edson Fachin, no sentido de que, com relação aos efeitos pretéritos ou pendentes, seria cabível ação rescisória ou alegação de inexigibilidade do título executivo judicial. Quanto aos efeitos futuros, o Min. Gilmar Mendes concordou com o voto do Min. Edson Fachin, de modo que cessaria a ultratividade da coisa julgada que contrariasse o decidido pelo Tribunal Pleno do eg. STF, seja no controle difuso, seja no controle concentrado, independentemente de ação rescisória ou qualquer outra demanda, diante da cláusula rebus sic stantibus.

Portanto, a prevalecer o entendimento, até agora, firmado pelo Tribunal Pleno do eg. STF, no julgamento do RE 949297 (Tema de Repercussão Geral 881), suas decisões, quando proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral, interromperão, automaticamente, a eficácia jurídica produzida pela coisa julgada em matéria tributária. Respeitadas a irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal, a Administração Tributária poderá exigir o pagamento do tributo, a despeito da coisa julgada, independentemente de ação rescisória ou qualquer outra demandada.

Do nosso ponto de vista, a solução encontrada, até o momento, pelo eg. STF para a questão, representará, a rigor, uma quebra no sistema (“Bruch im System“)([1]). Nas relações jurídicas de trato continuado, dispõe o art. 505, I, do Código de Processo Civil (CPC) que a coisa julgada produz efeitos até sobrevir modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença([2]). Embora as decisões proferidas pelo Tribunal Pleno do eg. STF, em ação direta ou em sede de repercussão geral, implicarem a mudança do estado de direito, nas relações tributárias de trato continuado, não será mais necessário que a Fazenda Pública requeira a revisão do que foi estatuído na sentença, conforme o art. 505, I, do CPC. Do mesmo modo, na impugnação do cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de pagar quantia certa, a Fazenda Pública poderá arguir a inexigibilidade do título ou a inexigibilidade da obrigação fundada em lei declarada inconstitucional pelo STF ou em interpretação da lei ou de ato normativo tida pelo STF como incompatível com a Constituição, em ação direta ou em sede de repercussão geral, proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, independentemente de ação rescisória, a despeito do art. 535, § 8.º, do CPC([3]).

 

S.m.j., é a opinião legal.

 

([1])           A respeito, vide: Canaris, Claus-Wilhelm. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito. Tradução de A. Menezes Cordeiro. 2 ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1996, p. 200.

([2])           “Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo: I – se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença”.

([3])           “Art. 535. A Fazenda Pública será intimada na pessoa de seu representante judicial, por carga, remessa ou meio eletrônico, para, querendo, no prazo de 30 (trinta) dias e nos próprios autos, impugnar a execução, podendo arguir: […] III – inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; […] § 5.º Para efeito do disposto no inciso III do caput deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso. § 6.º No caso do § 5.º, os efeitos da decisão do Supremo Tribunal Federal poderão ser modulados no tempo, de modo a favorecer a segurança jurídica. § 7º A decisão do Supremo Tribunal Federal referida no § 5.º deve ter sido proferida antes do trânsito em julgado da decisão exequenda. § 8.º Se a decisão referida no § 5º for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.”

Saldo Credor Acumulado de ICMS. Estado de Minas Gerais. Dispensa do Estorno de Crédito Fiscal. Saída Isenta de Ovos Não Férteis. Hipótese de Transferência a Outro Contribuinte

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Prezado(a) Senhor(a),

A Companhia X possui saldo credor acumulado de ICMS, decorrente da dispensa do estorno do crédito fiscal, no caso de saída isenta de ovos não férteis, previsto pelo Item 12.3, ‘b’,  da Parte 1 do Anexo I do RICMS/MG, combinado com o Item 12, ‘h’, da Parte 1 do Anexo I do RICMS/MG, que dispõem o seguinte, respectivamente:

“12.3 Fica dispensado o estorno do crédito na saída das seguintes mercadorias: […] b) ovo, exceto o fértil, de que a trata a alínea ‘h’ deste item.

  1. Saída, em operação interna ou interestadual, dos seguintes produtos, em estado natural: […] h) ovo, exceto o fértil”.

Conforme o Item 12.3, ‘b’,  da Parte 1 do Anexo I do RICMS/MH, combinado com o Item 12, ‘h’, da Parte 1 do Anexo I do RICMS/MG:

(i) as operações de saída internas ou interestaduais de ovos não-férteis são isentas do ICMS; por outro lado,

(ii) é dispensado o estorno do crédito de ICMS nas saídas (internas ou interestaduais) de ovos não férteis.

Quanto à dispensa do estorno do crédito, o Item 12.3, ‘b’, da Parte 1 do Anexo I do RICMS/MG não distingue entre o crédito de ICMS decorrente da entrada de mercadorias ou de serviços (de transporte intermunicipal ou interestadual ou de comunicações) provenientes do Estado de Minas Gerais, de um lado, e o crédito de ICMS decorrente da entrada de mercadorias ou de serviços (de transporte intermunicipal ou interestadual ou de comunicações) provenientes de outra unidade da Federação, de outro. Portanto, a Companhia X fica dispensada do estorno do crédito, nas saídas (internas ou interestaduais) de ovos não-férteis, independentemente se o crédito de ICMS decorrer da entrada de mercadorias ou de serviços (de transporte intermunicipal ou interestadual ou de comunicações) provenientes do Estado de Minas Gerais ou de outra unidade da Federação, segundo o Item 12.3, ‘b’,  da Parte 1 do Anexo I do RICMS/MH, combinado com o Item 12, ‘h’, da Parte 1 do Anexo I do RICMS/MG.

No que diz respeito à transferência do saldo credor acumulado de ICMS, a Lei Complementar n. 87, de 13 de setembro de 1996 (“Lei Kandir”), prevê, no seu art. 25, §§ 1.º e 2.º, o seguinte:

“Art. 25. Para efeito de aplicação do disposto no art. 24, os débitos e créditos devem ser apurados em cada estabelecimento, compensando-se os saldos credores e devedores entre os estabelecimentos do mesmo sujeito passivo localizados no Estado.

  • 1.º Saldos credores acumulados a partir da data de publicação desta Lei Complementar por estabelecimentos que realizem operações e prestações de que tratam o inciso II do art. 3º e seu parágrafo único podem ser, na proporção que estas saídas representem do total das saídas realizadas pelo estabelecimento:

I – imputados pelo sujeito passivo a qualquer estabelecimento seu no Estado;

II – havendo saldo remanescente, transferidos pelo sujeito passivo a outros contribuintes do mesmo Estado, mediante a emissão pela autoridade competente de documento que reconheça o crédito.

  • 2.º Lei estadual poderá, nos demais casos de saldos credores acumulados a partir da vigência desta Lei Complementar, permitir que:

I – sejam imputados pelo sujeito passivo a qualquer estabelecimento seu no Estado;

II – sejam transferidos, nas condições que definir, a outros contribuintes do mesmo Estado.”

Em outras palavras, os saldos credores acumulados em decorrência da exportação de mercadorias ou serviços poderão ser transferidos a qualquer estabelecimento do mesmo contribuinte ou de outro contribuinte no Estado, independentemente de lei estadual. Por sua vez, os demais saldos credores acumulados poderão ser transferidos a qualquer estabelecimento do mesmo contribuinte ou de outro contribuinte no Estado, desde que a lei estadual permita. 

No caso, o saldo credor de ICMS que foi acumulado pela Companhia X não decorre da exportação de mercadorias ou serviços. Logo, poderá ser transferido a qualquer estabelecimento da Companhia X ou de outro contribuinte no Estado, desde que a lei estadual permita (Lei Kandir, Art. 25, § 2.º, II).

     No Estado de Minas Gerais, o art. 29, § 8.º, da Lei n. 6.763, de 26 de dezembro de 1975, delegou para o RICMS/MG a competência para permitir “a transferência de crédito acumulado em razão de outras operações ou prestações”. Essa competência foi exercida pelo art. 80 da Parte Geral do RICMS/MG, que enuncia o seguinte: “É permitida a transferência de créditos na forma e nas condições estabelecidas no Anexo VIII.”

No Anexo VIII do RICMS/MG, a permissão para o contribuinte transferir a outro contribuinte o crédito acumulado do ICMS em estabelecimento produtor rural repousa sobre o art. 27-H, na redação do Decreto n. 48.288, de 26 de outubro de 2021:

“Art. 27-H.  O contribuinte que possuir crédito acumulado do ICMS em estabelecimento produtor rural, extrator de minério, industrial ou atacadista, relativo à entrada de mercadoria remetida por estabelecimento de produtor rural ou de fabricante da mercadoria ou de centro de distribuição de mesma titularidade deste, situados neste Estado, e relativo ao recebimento de energia elétrica ou de combustível em que o imposto tenha sido devido ao Estado de Minas Gerais, poderá, mediante regime especial concedido pelo Superintendente de Tributação ao destinatário do crédito, transferi-lo para estabelecimento que seja centro de distribuição de rede varejista de medicamentos, observado o seguinte:

I – a rede deverá contar com, no mínimo, 10 (dez) estabelecimentos revendedores de medicamentos ativos no Estado;

II – no mínimo 90% (noventa por cento) das entradas de mercadorias no centro de distribuição decorram de aquisições, não se considerando, para cálculo do referido percentual, as devoluções, os retornos e as bonificações;

III – o contribuinte não possua centros de distribuição localizados em outras unidades da Federação;

IV – no mínimo 75% (setenta e cinco por cento) da quantidade de estabelecimentos varejistas da rede estejam instalados neste Estado, considerando neste percentual, ainda, os estabelecimentos operados por terceiros mediante franquia.

  • 1.º  No regime especial serão estabelecidos os procedimentos aplicáveis à transferência, as condições, os limites, as parcelas e os seus respectivos valores.
  • 2.º  O contribuinte que receber em transferência o crédito acumulado poderá utilizá-lo para:

I – abatimento:

  1. a) de saldo devedor do ICMS decorrente de operações próprias, apurado na sua escrita fiscal;
  2. b) de saldo devedor do ICMS devido a título de substituição tributária decorrente de responsabilidade estabelecida em regime especial, relativamente às operações com mercadorias não relacionadas na Parte 2 do Anexo XV deste Regulamento;
  3. c) de saldo devedor do ICMS devido a título de substituição tributária vinculada a operações subsequentes a serem praticadas por estabelecimentos do próprio contribuinte, cuja responsabilidade decorra da previsão estabelecida no artigo 14 da Parte 1 do Anexo XV deste Regulamento;

II – aquisição de materiais para construção ou reforma de edificação destinada a funcionamento de estabelecimento do contribuinte neste Estado, móveis, máquinas ou equipamentos destinados ao ativo imobilizado;

III – compensação de saldo devedor na forma do § 2º do art. 65 deste regulamento.

  • 3.º  O montante dos créditos transferidos nos termos deste artigo:

I – não poderá ultrapassar o correspondente a 5% (cinco por cento) do valor das vendas realizadas no exercício de 2020 pelo contribuinte destinatário do crédito acumulado em seus estabelecimentos situados no Estado;

II – fica limitado a R$ 70.000.000,00 (setenta milhões de reais), por contribuinte destinatário.

  • 4.º  A utilização do crédito do ICMS de que trata o caput será autorizada a contribuinte signatário de protocolo de intenções firmado com o Estado, observado, na hipótese do inciso II do § 2º, o disposto nos §§12 e 13 do art. 14 deste Anexo.
  • 5.º
  • 6.º O saldo credor apurado pelo detentor do regime, no período anterior ao da sua concessão, poderá ser utilizado para as mesmas finalidades de que trata o § 2º, submetendo-se, também, aos limites previstos no § 3º.
  • 7.º A utilização do crédito recebido em transferência fica limitada, a cada período de doze meses, a um terço do valor autorizado no regime especial.
  • 8.º Para a transferência de créditos acumulados do ICMS de que trata este artigo, deverão ser observadas as disposições constantes do § 20 do art. 27 e, no que couber, do art. 10 deste Anexo.”

De acordo com este dispositivo, a Companhia X poderá transferir para estabelecimento de outro contribuinte — no caso, centro de distribuição de rede varejista de medicamentos que possuir regime especial concedido pela Superintendência de Tributação do Estado de Minas Gerais — apenas o crédito acumulado do ICMS decorrente da entrada de mercadoria remetida por estabelecimento situado no Estado de Minas Gerais.

O centro de distribuição de rede varejista de medicamentos que adquirir o crédito acumulado de ICMS deverá contar, no mínimo, com 10 (dez) estabelecimentos revendedores de medicamentos ativos no Estado de Minas Gerais (RICMS/MG, Anexo VIII, Art. 27-H, I); e não deverá possuir centros de distribuição localizados em outras unidades da Federação (RICMS/MG, Anexo VIII, Art. 27-H, III).

Além disso, 90% (noventa por cento), no mínimo, das entradas de mercadorias no centro de distribuição deverão decorrer de aquisições, excluídos devoluções, retornos e bonificações (RICMS/MG, Anexo VIII, Art. 27-H, II); e 75% (setenta e cinco por cento), no mínimo, dos estabelecimentos varejistas da rede deverão estar instalados no Estado de Minas Gerais, incluídos os estabelecimentos operados por terceiros mediante franquia. De acordo com o § 1.º do art. 27-H do Anexo VIII do RICMS/MG, o ato administrativo que conceder o regime especial para o adquirente do crédito acumulado de ICMS deverá estabelecer “os procedimentos para transferência, as condições, os limites, as parcelas e os seus respectivos valores.”

Quanto às vedações, o art. 32 do Anexo VIII do RICMS/MG prescreve que a Companhia X ou o adquirente do crédito acumulado de ICMS não poderão possuir pendências relativas a obrigações acessórias ou débitos de tributos estaduais, inclusive créditos tributários com exigibilidade suspensa ou inscritos em dívida ativa, com cobrança ajuizada e com garantias legais, excluídos os casos de moratória ou parcelamento ativo.

Por fim, o art. 33 do Anexo VIII do RICMS/MG dispõe que a transferência do crédito acumulado apenas poderá ser realizada, se a Companhia X possuir o crédito regularmente escriturado. A Administração Tributária do Estado de Minas Gerais poderá requisitar documentação e informações complementares para a verificação da regularidade dos valores lançados, de acordo com o art. 34 do Anexo VIII do RICMS/MG.

S.m.j., é a opinião legal.

 

Pedro Acosta de Oliveira

Diego Galbinski        

Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ). Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS). Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS). Doação feita pelo poder público. Receita e despesa de aluguel de imóvel

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Prezado(a) Senhor(a),

Os acionistas fundadores da Companhia X constituirão uma nova empresa (“NewCo”), que aceitará a transferência gratuita de um bem imóvel (“doação”) feita pelo poder público. Após a sua constituição, a NewCo firmará com Companhia X contrato de locação do bem imóvel, de modo que a primeira deverá auferir receita (de aluguel), e a segunda, pagar ou incorrer despesa (de aluguel).

Sendo assim, formulam a seguinte consulta:

(i) A NewCo deverá computar a doação do bem imóvel para a apuração da base de cálculo do IRPJ, da CSLL, do PIS e COFINS?

(ii) Qual será o regime tributário da receita de aluguel auferida pela NewCo? De outro lado, qual será o regime tributário da despesa de aluguel paga ou incorrida pela Companhia X?

  • 1.º

Doação Feita pelo Poder Público e

Irpj, Csll, Pis e Cofins

A doação do bem imóvel não deverá ser computada para a apuração da base de cálculo do IRPJ e CSLL, se a NewCo optar pelo regime de tributação com base no lucro real. Dispõe o art. 30 da Lei n. 12.973, de 13 de maio de 2014, reproduzido pelo art. 523 do Decreto n. 9.580, de 22 de novembro de 2018 (RIR/218), que as doações feitas pelo poder público não serão computadas na determinação do lucro real ([1]).

Porém, é condição da não-incidência do IRPJ e da CSLL que a doação seja registrada pela NewCo em reserva de lucros (Lei n. 12.973, de 13 de maio de 2014, Art. 30, caput; RIR/2018, Art. 523, caput). Essa reserva apenas poderá ser utilizada para absorção de prejuízos, após a absorção das demais reservas de lucros, com exceção da reserva legal (Lei n. 12.973, de 13 de maio de 2014, Art. 30, I; RIR/2018, Art. 523, I); ou para aumento de capital (Lei n. 12.973, de 13 de maio de 2014, Art. 30, II; RIR/2018, Art. 523, II).

Por isso, caso a reserva de lucros seja destinada a outros fins, a doação do bem imóvel deverá ser computada pela NewCo na determinação do lucro real (Lei n. 12.973, de 13 de maio de 2014, Art. 30, § 2.º; RIR/2018, Art. 523, § 2.º). No caso, poderão ser considerados outros fins a capitalização da reserva de lucros e posterior restituição de capital aos sócios, mediante redução do capital social (Lei n. 12.973, de 13 de maio de 2014, Art. 30, § 2.º, I; RIR/2018, Art. 523, § 2.º, I); ou a integração da reserva de lucros à base de cálculo dos dividendos obrigatórios distribuídos pela NewCo (Lei n. 12.973, de 13 de maio de 2014, Art. 30, § 2.º, III; RIR/2018, Art. 523, § 2.º, III).

Também não incidirão sobre a doação do bem imóvel a favor da NewCo o PIS e COFINS. No regime não cumulativo, prescrevem o art. 1.º, § 3.º, X, da Lei n. 10.637, de 30 de dezembro de 2002 ([2]), e o art. 1.º, § 3.º, IX, da Lei n. 10.833, de 29 de dezembro de 2003 ([3]), respectivamente, que não integram a base de cálculo do PIS e COFINS as receitas de doações feitas pelo poder público.

Entretanto, outra será a conclusão, se a NewCo optar pelo regime de tributação com base no lucro presumido. Ao contrário do regime de tributação com base no lucro real, o regime de tributação do lucro presumido não dispõe, expressamente, que as doações feitas pelo poder público não devem ser computadas para a apuração da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Com base nesse argumento, a c.  Terceira Câmara do eg. Primeiro Conselho de Contribuintes, no Acórdão n. 103-23.312, decidiu que “As receitas decorrentes de doações feitas pelo Poder Público integram o resultado tributável das pessoas jurídicas tributadas pelo lucro presumido” (Ac. 103-23.312, 1.º CC, 3.ª C, Rel. Cons. Paulo Jacinto do Nascimento, vu, j. 25/01/2008). Do seu ponto de vista, “A regra geral é que as doações sejam computadas tanto na determinação do lucro real como do lucro presumido” (Ac. 103-23.312, 1.º CC, 3.ª C, Rel. Cons. Paulo Jacinto do Nascimento, vu, j. 25/01/2008). Essa regra é excepcionada, “única e tão somente, em relação ao lucro real” (Ac. 103-23.312, 1.º CC, 3.ª C, Rel. Cons. Paulo Jacinto do Nascimento, vu, j. 25/01/2008).

Não obstante, a NewCo também não deverá computar a doação do bem imóvel para a apuração da base de cálculo do PIS e COFINS. No regime cumulativo do PIS e COFINS, prescreve o art. 2.º da Lei n. 9.718, de 27 de novembro de 1998, que “As contribuições para o PIS/PASEP e a COFINS, devidas pelas pessoas jurídicas de direito privado, serão calculadas com base no seu faturamento, segundo a legislação vigente e as alterações introduzidas por esta Lei” (grifou-se). De acordo com o art. 3.º da Lei n. 9.718, de 27 de novembro de 1998 ([4]), este conceito é definido pelo art. 12 do Decreto-lei n. 1.598, de 26 de dezembro de 1977 ([5]), que não inclui as receitas não operacionais, como as doações feitas pelo poder público.

Todavia, a doação do bem imóvel perderá a natureza de receita não operacional, caso a NewCo exerça as atividades econômicas de compra, venda e permuta de imóveis. Nesta hipótese, a NewCo deverá computar a doação do bem imóvel para a apuração da base de cálculo do PIS e COFINS, conforme a Solução de Consulta COSIT n. 68, de 24 de junho de 2020:

[…]

ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS/PASEP REGIME CUMULATIVO. DOAÇÃO DE BEM IMÓVEL. NÃO INCIDÊNCIA. DESCARACTERIZAÇÃO. INCIDÊNCIA.

Em se tratando de pessoa jurídica cujo objeto social compreenda atividades relacionadas à comercialização e gestão de imóveis, o valor de bem imóvel dado ou recebido em doação não integra a base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep no seu regime de apuração cumulativa, desde que não haja qualquer conexão entre a doação e as operações de compra, venda e permuta de imóveis. Caso haja conexão direta ou indireta entre essas operações (receber imóvel de terceiros ou dá-los a esses) e as atividades da pessoa jurídica, a operação não se configurará como doação e os valores dos bens recebidos de terceiros ou transferidos a esses devem ser incluídos integralmente na base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep, em seu regime de apuração cumulativa.

Dispositivos Legais: Lei n. 10.637, de 2002, art. 8º, II; Lei n. 9.718, de 1995, arts. 2º e 3º; Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 12.

ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO PARA O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL – COFINS REGIME CUMULATIVO. DOAÇÃO DE BEM IMÓVEL. NÃO INCIDÊNCIA. DESCARACTERIZAÇÃO. INCIDÊNCIA.

Em se tratando de pessoa jurídica cujo objeto social compreenda atividades relacionadas à comercialização e gestão de imóveis, o valor de bem imóvel dado ou recebido em doação não integra a base de cálculo da Cofins no seu regime de apuração cumulativa, desde que não haja qualquer conexão entre a doação e as operações de compra, venda e permuta de imóveis.

Caso haja conexão direta ou indireta entre essas operações (receber imóvel de terceiros ou dá-los a esses) e as atividades da pessoa jurídica, a operação não se configurará como doação e os valores dos bens recebidos de terceiros ou transferidos a esses devem ser incluídos integralmente na base de cálculo da Cofins, em seu regime de apuração cumulativa.

Dispositivos Legais: Lei n. 10.833, de 2003, art. 10, II; Lei n. 9.718, de 1995, arts. 2º e 3º; Decreto-Lei n. 1.598, de 1977, art. 12.

[…].” (grifou-se)

Portanto, a doação do bem imóvel não deverá ser computada para a apuração da base de cálculo do IRPJ e CSLL, se a NewCo optar pelo regime de tributação com base no lucro real. Com relação ao PIS e COFINS, deverá ser computada para a apuração da base de cálculo, se e somente se a NewCo optar pelo regime de tributação com base no lucro presumido e exercer as atividades econômicas de compra, venda e permuta de imóveis.

  • 2.º

Receita e Despesa de Locação de Imóvel e 

Irpj, Csll, Pis e Cofins

Aceita a doação do bem imóvel, a NewCo firmará contrato de locação com a Companhia X, de modo que a primeira deverá auferir receita (de aluguel), e a segunda, pagar ou incorrer despesa (de aluguel).

Com relação à receita de aluguel que deverá ser auferida pela NewCo, estará sujeita às seguintes alíquotas, no regime de tributação com base no lucro real: (i) 25% (vinte e cinco por cento), a título de IRPJ (Lei n. 9.249, de 26 de dezembro de 1995, Art. 15, caput, §1º, III) ([6]); (ii) 9% (nove por cento), a título de CSLL (Lei n. 7.689, de 15 de dezembro de 1988, Art. 3º, III) ([7]); (iii) 1,65% (um vírgula e sessenta e cinco por cento), a título de PIS (Lei n. 10.637, de 30 de dezembro de 2002, Art. 2.º, caput) ([8]); e (iv) 7,6% (sete vírgula seis por cento), a título de COFINS (Lei n. 10.833, de 29 de dezembro de 2003, Art. 2.º, caput) ([9]).

De outro lado, caso opte pelo regime de tributação com base no lucro presumido, a receita de aluguel auferida pela NewCo, desde que o seu objeto social inclua a atividade econômica de “aluguel de imóveis próprios” (CNAE 68.10-2-02), estará sujeita às seguintes alíquotas: (i) 8% (oito por cento), a título de IRPJ (Lei n. 9.249,  de 26 de dezembro de 1995, Art. 15, caput, § 1º, III) ([10]); (ii) 2,88% (dois vírgula oitenta e oito por cento), a título de CSLL (Lei n. 9.249, de 26 de dezembro de 1995, Art. 20, I e III) ([11]); (iii) 0,65% (zero vírgula sessenta e cinco por cento), a título de PIS (Lei n. 9.715, de 25 de novembro de 1998, Art. 8.º) ([12]); e (iv) 3% (três por cento), a título de COFINS (Lei n. 9.718, de 25 de novembro de 1998, Art. 8.º) ([13]).

Por sua vez, a Companhia X opta pelo regime de tributação com base no lucro real. Conforme este regime de tributação, a despesa de aluguel é dedutível para a apuração da base de cálculo do IRPJ e CSLL (RIR/2018, Art. 361) ([14]). Entretanto, visto que a NewCo será constituída por acionistas fundadores da Companhia X, sua dedução será inadmitida, se o aluguel exceder o valor de mercado (RIR/2018, Art.  361, § 1.º, I) ([15]).

Quanto ao PIS e COFINS, a Companhia X poderá descontar créditos calculados em relação ao aluguel pago a NewCo, conforme o art. 3.º, IV, da Lei n. 10.637, de 30 de janeiro de 2002 ([16]), e o art. 3.º, IV, da Lei n. 10.833, de 29 de janeiro de 2003 ([17]).

S.m.j., é a opinião legal.

([1])      “Art. 30. As subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos, concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e as doações feitas pelo poder público não serão computadas na determinação do lucro real, desde que seja registrada em reserva de lucros a que se refere o art. 195-A da Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que somente poderá ser utilizada para: I – absorção de prejuízos, desde que anteriormente já tenham sido totalmente absorvidas as demais Reservas de Lucros, com exceção da Reserva Legal; ou II – aumento do capital social. § 1.º Na hipótese do inciso I do caput , a pessoa jurídica deverá recompor a reserva à medida que forem apurados lucros nos períodos subsequentes. § 2.º As doações e subvenções de que trata o caput serão tributadas caso não seja observado o disposto no § 1.º ou seja dada destinação diversa da que está prevista no caput, inclusive nas hipóteses de: I – capitalização do valor e posterior restituição de capital aos sócios ou ao titular, mediante redução do capital social, hipótese em que a base para a incidência será o valor restituído, limitado ao valor total das exclusões decorrentes de doações ou subvenções governamentais para investimentos; II – restituição de capital aos sócios ou ao titular, mediante redução do capital social, nos 5 (cinco) anos anteriores à data da doação ou da subvenção, com posterior capitalização do valor da doação ou da subvenção, hipótese em que a base para a incidência será o valor restituído, limitada ao valor total das exclusões decorrentes de doações ou de subvenções governamentais para investimentos; ou III – integração à base de cálculo dos dividendos obrigatórios. § 3º Se, no período de apuração, a pessoa jurídica apurar prejuízo contábil ou lucro líquido contábil inferior à parcela decorrente de doações e de subvenções governamentais e, nesse caso, não puder ser constituída como parcela de lucros nos termos do caput, esta deverá ocorrer à medida que forem apurados lucros nos períodos subsequentes. § 4.º Os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao imposto previsto no inciso II do caput do art. 155 da Constituição Federal, concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal, são considerados subvenções para investimento, vedada a exigência de outros requisitos ou condições não previstos neste artigo. § 5.º O disposto no § 4.º deste artigo aplica-se inclusive aos processos administrativos e judiciais ainda não definitivamente julgados.”

([2])      “Art. 1.º  A Contribuição para o PIS/Pasep, com a incidência não cumulativa, incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil. […] § 3.º Não integram a base de cálculo a que se refere este artigo, as receitas: […] X – de subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos, concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e de doações feitas pelo poder público”.

([3])      “Art. 1.º A Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins, com a incidência não cumulativa, incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil. […] § 3.º Não integram a base de cálculo a que se refere este artigo as receitas: […] IX – de subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos, concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e de doações feitas pelo poder público”.

([4])       “Art. 3.º O faturamento a que se refere o art. 2.º compreende a receita bruta de que trata o art. 12 do Decreto-Lei n. 1.598, de 26 de dezembro de 1977.”

([5])      “Art. 12.  A receita bruta compreende: I – o produto da venda de bens nas operações de conta própria; II – o preço da prestação de serviços em geral; III – o resultado auferido nas operações de conta alheia; e IV – as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não compreendidas nos incisos I a III. § 1.º  A receita líquida será a receita bruta diminuída de: I – devoluções e vendas canceladas; II – descontos concedidos incondicionalmente; III – tributos sobre ela incidentes; e IV – valores decorrentes do ajuste a valor presente, de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976, das operações vinculadas à receita bruta. § 2.º O fato de a escrituração indicar saldo credor de caixa ou a manutenção, no passivo, de obrigações já pagas, autoriza presunção de omissão no registro de receita, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção. § 3.º Provada, por indícios na escrituração do contribuinte ou qualquer outro elemento de prova, a omissão de receita, a autoridade tributária poderá arbitrá-la com base no valor dos recursos de caixa fornecidos à empresa por administradores, sócios da sociedade não anônima, titular da empresa individual, ou pelo acionista controlador da companhia, se a efetividade da entrega e a origem dos recursos não forem comprovadamente demonstradas. § 4.º Na receita bruta não se incluem os tributos não cumulativos cobrados, destacadamente, do comprador ou contratante pelo vendedor dos bens ou pelo prestador dos serviços na condição de mero depositário. § 5.º Na receita bruta incluem-se os tributos sobre ela incidentes e os valores decorrentes do ajuste a valor presente, de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, das operações previstas no caput, observado o disposto no § 4.º).”

([6])      “Art. 15. A base de cálculo do imposto, em cada mês, será determinada mediante a aplicação do percentual de 8% (oito por cento) sobre a receita bruta auferida mensalmente, observado o disposto no art. 12 do Decreto-Lei no 1.598, de 26 de dezembro de 1977, deduzida das devoluções, vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos, sem prejuízo do disposto nos arts. 30, 32, 34 e 35 da Lei no 8.981, de 20 de janeiro de 1995. […] § 1º Nas seguintes atividades, o percentual de que trata este artigo será: […] III – trinta e dois por cento, para as atividades de: […] c) administração, locação ou cessão de bens imóveis, móveis e direitos de qualquer natureza”.

([7])      “Art. 3.º A alíquota da contribuição é de: […] III – 9% (nove por cento), no caso das demais pessoas jurídicas.”

([8])      “Art. 2.º Para determinação do valor da contribuição para o PIS/Pasep aplicar-se-á, sobre a base de cálculo apurada conforme o disposto no art. 1.º, a alíquota de 1,65% (um inteiro e sessenta e cinco centésimos por cento).”

([9])      “Art. 2.º Para determinação do valor da COFINS aplicar-se-á, sobre a base de cálculo apurada conforme o disposto no art. 1.º, a alíquota de 7,6% (sete inteiros e seis décimos por cento).”

([10])     “Art. 15. A base de cálculo do imposto, em cada mês, será determinada mediante a aplicação do percentual de 8% (oito por cento) sobre a receita bruta auferida mensalmente, observado o disposto no art. 12 do Decreto-Lei no 1.598, de 26 de dezembro de 1977, deduzida das devoluções, vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos, sem prejuízo do disposto nos arts. 30, 32, 34 e 35 da Lei no 8.981, de 20 de janeiro de 1995. […] § 1º Nas seguintes atividades, o percentual de que trata este artigo será: […] III – trinta e dois por cento, para as atividades de: […] c) administração, locação ou cessão de bens imóveis, móveis e direitos de qualquer natureza”.

([11])     “Art. 20. A base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) devida pelas pessoas jurídicas que efetuarem o pagamento mensal ou trimestral a que se referem os arts. 2º, 25 e 27 da Lei n. 9.430, de 27 de dezembro de 1996, corresponderá aos seguintes percentuais aplicados sobre a receita bruta definida pelo art. 12 do Decreto-Lei n. 1.598, de 26 de dezembro de 1977, auferida no período, deduzida das devoluções, das vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos: I – 32% (trinta e dois por cento) para a receita bruta decorrente das atividades previstas no inciso III do § 1º do art. 15 desta Lei”.

([12])     “Art. 8º. A contribuição será calculada mediante a aplicação, conforme o caso, das seguintes alíquotas: I – zero vírgula sessenta e cinco por cento sobre o faturamento.”

([13])     “Art. 8º. Fica elevada para três por cento a alíquota da COFINS.”

([14])     “Art. 361. A dedução de despesas com aluguéis será admitida (Lei n. 4.506, de 1964, art. 71, caput): I – quando necessárias para que o contribuinte mantenha a posse, o uso ou a fruição do bem ou do direito que produz o rendimento; e II – se o aluguel não constituir aplicação de capital na aquisição do bem ou do direito, nem distribuição disfarçada de lucros. § 1.º Não são dedutíveis (Lei n. 4.506, de 1964, art. 71, parágrafo único ): I – os aluguéis pagos a sócios ou dirigentes de empresas, e a seus parentes ou dependentes, em relação à parcela que exceder o preço ou o valor de mercado”.

([15])     “Art. 361. A dedução de despesas com aluguéis será admitida (Lei n. 4.506, de 1964, art. 71, caput): […] § 1.º Não são dedutíveis (Lei n. 4.506, de 1964, art. 71, parágrafo único ): I – os aluguéis pagos a sócios ou dirigentes de empresas, e a seus parentes ou dependentes, em relação à parcela que exceder o preço ou o valor de mercado”.

([16])     “Art. 3.o Do valor apurado na forma do art. 2.o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a: […] IV – aluguéis de prédios, máquinas e equipamentos, pagos a pessoa jurídica, utilizados nas atividades da empresa”.

([17])     “Art. 3.o Do valor apurado na forma do art. 2.o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a: […] IV – aluguéis de prédios, máquinas e equipamentos, pagos a pessoa jurídica, utilizados nas atividades da empresa”.

Opinião Legal. Créditos de PIS e COFINS. Gastos com Transporte de Funcionários

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Na presente opinião legal, responderemos à consulta formulada por Companhia X sobre o direito de descontar créditos de PIS e COFINS calculados em relação a gastos com transporte de funcionários, com base no art. 3º, II, da Lei n. 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e no art. 3º, II, da Lei n. 10.833, de 29 de dezembro de 2003.

O art. 3º, II, da Lei n. 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e o art. 3º, II, da Lei n. 10.833, de 29 de dezembro de 2003, dispõem que a pessoa jurídica pode descontar créditos de PIS e COFINS calculados em relação em relação a bens e serviços utilizados como insumo, nos seguintes termos:

<<Art. 3o Do valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:  

[…]

II – bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2 da Lei n. 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da TIPI<<.

Em 24/04/2018, a c. 1. Seção do eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), no REsp 1.221.170/PR, declarou a ilegalidade das Instruções Normativas RFB n. 247, de 21 de novembro de 2002, e n. 404, de 12 de março de 2004, que restringiam a definição do conceito de insumo utilizado pelo art. 3º, II, da Lei n. 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e da Lei n. 10.833, de 29 de dezembro de 2003 ([1]).

No REsp 1.221.170/PR, o eg. STJ firmou a seguinte tese:

<<O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.>> ([2]) (grifou-se)

É a seguinte a ementa do REsp 1.221.170/PR:

<<TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. NÃOCUMULATIVIDADE. CREDITAMENTO. CONCEITO DE INSUMOS. DEFINIÇÃO ADMINISTRATIVA PELAS INSTRUÇÕES NORMATIVAS 247/2002 E 404/2004, DA SRF, QUE TRADUZ PROPÓSITO RESTRITIVO E DESVIRTUADOR DO SEU ALCANCE LEGAL. DESCABIMENTO. DEFINIÇÃO DO CONCEITO DE INSUMOS À LUZ DOS CRITÉRIOS DA ESSENCIALIDADE OU RELEVÂNCIA. RECURSO ESPECIAL DA CONTRIBUINTE PARCIALMENTE CONHECIDO, E, NESTA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO, SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC/1973 (ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015). 1. Para efeito do creditamento relativo às contribuições denominadas PIS e COFINS, a definição restritiva da compreensão de insumo, proposta na IN 247/2002 e na IN 404/2004, ambas da SRF, efetivamente desrespeita o comando contido no art. 3º, II, da Lei 10.637/2002 e da Lei 10.833/2003, que contém rol exemplificativo. 2. O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte. 3. Recurso Especial representativo da controvérsia parcialmente conhecido e, nesta extensão, parcialmente provido, para determinar o retorno dos autos à instância de origem, a fim de que se aprecie, em cotejo com o objeto social da empresa, a possibilidade de dedução dos créditos relativos a custo e despesas com: água, combustíveis e lubrificantes, materiais e exames laboratoriais, materiais de limpeza e equipamentos de proteção individual-EPI. 4. Sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 (arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015), assentam-se as seguintes teses: (a) é ilegal a disciplina de creditamento prevista nas Instruções Normativas da SRF ns. 247/2002 e 404/2004, porquanto compromete a eficácia do sistema de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS, tal como definido nas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003; e (b) o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de terminado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo Contribuinte.>> ([3]) 

Para a aferição da essencialidade ou relevância do bem ou serviço para a atividade econômica desenvolvida pelo contribuinte, o eg. STJ desenvolveu o teste da subtração, cujo conceito foi definido pelo i. Min. Campbell Marques, da seguinte forma:

>>Em resumo, é de se definir como insumos, para efeitos do art. 3º, II, da Lei n. 10.637/2002, e art. 3º, II, da Lei n. 10.833/2003, todos aqueles bens e serviços pertinentes ao, ou que viabilizam o processo produtivo e a prestação de serviços, que neles possam ser direta ou indiretamente empregados e cuja subtração importa na impossibilidade mesma da prestação do serviço ou da produção, isto é, cuja subtração obsta a atividade da empresa, ou implica em substancial perda de qualidade do produto ou serviço daí resultantes.<< ([4])

Dada a sua eficácia vinculante, a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Instrução Normativa RFB n. 1.911, de 11 de outubro de 2019, que, no seu art. 172, caput, o seguinte:

<<Art. 172. Para efeitos do disposto nesta Subseção, consideram-se insumos os bens ou serviços considerados essenciais ou relevantes, que integram o processo de produção ou fabricação de bens destinados à venda ou de prestação de serviços (Lei n. 10.637, de 2002, art. 3º, caput, inciso II, com redação dada pela Lei n. 10.865, de 2004, art. 37; e Lei n. 10.833, de 2003, art. 3º, caput, inciso II, com redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004, art. 21)>>. (grifou-se)

Portanto, a Companhia X pode descontar créditos de PIS e COFINS calculados em relação a bens e serviços utilizados como insumo, a teor do art. 3º, II, da Lei n. 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e do art. 3º, II, da Lei n. 10.833, de 29 de dezembro de 2003. Entende-se por insumo todo bem ou serviço cuja subtração obsta a atividade da pessoa jurídica ou implica substancial perda de qualidade do produto ou serviço, conforme a tese firmada pelo eg. STJ no REsp 1.221.170/PR.

Visto que dependem da atividade econômica desenvolvida pela pessoa jurídica, a essencialidade ou relevância dos bens e serviços devem ser analisadas casuisticamente, a partir do objeto social. No caso, entendemos que os gastos com transporte de funcionários sejam essenciais ou relevantes para a atividade econômica exercida por Companhia X, com relação à exploração da empresa agrícola, nomeadamente a produção de bens (ovos), como serviço cuja subtração obsta a atividade da pessoa jurídica.

Esta também foi a conclusão a que chegou a Superintendência da Receita Federal do Brasil na 7.ª Região Fiscal (SRRF07), na Solução de Consulta n. 7256, de 10 de agosto de 2021:

>>Assunto: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins.

PRODUÇÃO DE BENS. CRÉDITOS. INSUMOS. IMPOSIÇÃO LEGAL. GASTOS COM TRANSPORTE DE FUNCIONÁRIOS.

Os gastos da pessoa jurídica com a contratação de serviços de transporte para o deslocamento residência-trabalho e vice-versa da mão de obra empregada em seu processo de produção de bens, em substituição ao fornecimento de vale-transporte, podem ser considerados insumos, por imposição legal, para fins de apuração de créditos da não-cumulatividade da Cofins, nos termos do art. 3º, II, da Lei n. 10.833, de 2003.

SOLUÇÃO DE CONSULTA VINCULADA À SOLUÇÃO DE CONSULTA N. 45 – COSIT, DE 28 DE MAIO DE 2020.

Dispositivos Legais: Lei n. 10.833, de 2003, art. 3º, incisos II e X; Parecer Normativo Cosit/RFB n. 5, de 2018; Lei n. 7.418, de 1985; Decreto n. 95.427, de 1987.

Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep

CRÉDITOS. INSUMOS. IMPOSIÇÃO LEGAL. GASTOS COM TRANSPORTE DE FUNCIONÁRIOS.

Os gastos da pessoa jurídica com a contratação de serviços de transporte para o deslocamento residência-trabalho e vice-versa da mão de obra empregada em seu processo de produção de bens, em substituição ao fornecimento de vale-transporte, podem ser considerados insumos, por imposição legal, para fins de apuração de créditos da não-cumulatividade da Cofins, nos termos do art. 3º, II, da Lei n. 10.637, de 2002.

SOLUÇÃO DE CONSULTA VINCULADA À SOLUÇÃO DE CONSULTA N. 45 – COSIT, DE 28 DE MAIO DE 2020.

Dispositivos Legais: Lei n. 10.637, de 2002, art. 3º, incisos II e X; Parecer Normativo Cosit/RFB n. 5, de 2018; Lei n. 7.418, de 1985; Decreto n. 95.427, de 1987.<<

Ante ao exposto, a Companhia X é titular do direito de descontar créditos de PIS e COFINS calculados em relação a gastos com transporte de funcionários para a exploração da empresa agrícola, nomeadamente a produção de bens (ovos), como serviço cuja subtração obsta a atividade da pessoa jurídica, à luz do art. 3º, II, da Lei n. 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e do art. 3º, II, da Lei n. 10.833, de 29 de dezembro de 2003.

Do nosso ponto de vista, a Companhia X também pode registrar extemporaneamente, na sua escrita fiscal, os créditos de PIS e COFINS calculados em relação a gastos com transporte de funcionários para a exploração da empresa agrícola, nomeadamente a produção de bens (ovos), no prazo de 5 (cinco) anos, contados da data do período em que incorridos os custos e despesas ou do documento que registra o fato que lhe deu origem.

 

S.m.j., é a nossa opinião legal.

 

([1])      REsp 1.221.170/PR, STJ, S1, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, mv, j, 22/02/2018, DJe 24/04/2018.

([2])      REsp 1.221.170/PR, STJ, S1, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, mv, j, 22/02/2018, DJe 24/04/2018.

([3])      REsp 1.221.170/PR, STJ, S1, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, mv, j, 22/02/2018, DJe 24/04/2018.

([4])      REsp 1.221.170/PR, STJ, S1, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, mv, j, 22/02/2018, DJe 24/04/2018.

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