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PARECER | Compensação Tributária. Contribuições para Terceiros. Mandado de Segurança Coletivo. Associação Genérica. Ilegitimidade Passiva

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Diego Galbinski        

  1. Companhia X, na pessoa de sua Gerente Administrativa e Financeira, Sr.ª Y (“Consulente”), indaga se poderia compensar pagamentos de Contribuição para o Senai, Contribuição para o Sesi, Contribuição do Salário-Educação e Contribuição para o Incra (“contribuições para terceiros”), que foram computadas sobre base de cálculo acima do limite de 20 (vinte) salários mínimos vigentes no país, previsto pelo art. 4.º, parágrafo único, da Lei n. 6.950, de 4 de novembro de 1981 ([1]), a despeito da tese fixada pela col. 1.ª Seção do eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Tema Repetitivo 1.079, afetado ao Recurso Especial (REsp) 1.898.532/CE e ao Recurso Especial (REsp) 1.905.870/PR, em 09/04/2024, de que “a partir da entrada em vigor do art. 1º, I, do Decreto-Lei 2.318/1986, as contribuições destinadas ao Sesi, ao Senai, ao Sesc e ao Senac não estão submetidas ao teto de vinte salários” ([2]).

1.1.        Na consulta, a Consulente esclarece que ingressou, recentemente, numa associação que havia impetrado mandado de segurança coletivo, a fim de assegurar o direito líquido e certo dos filiados à compensação dos pagamentos das contribuições para terceiros calculadas sobre base de cálculo acima do limite de 20 (vinte) salários mínimos vigentes no país.

1.2         Como o pedido formulado pela associação foi julgado procedente antes do julgamento do Tema Repetitivo 1.079 pela col. Primeira Seção do eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ), a Consulente questiona se poderia aplicar também ao seu caso concreto a decisão a respeito da modulação dos efeitos, que preservou o direito de limitar a base de cálculo das contribuições para terceiros a vinte salários mínimos vigentes no país às “empresas que ingressaram com ação judicial e/ou protocolaram pedidos administrativos até a data do início do presente julgamento, obtendo pronunciamento (judicial ou administrativo) favorável […] até a publicação do acórdão” ([3]).

  1. Com relação à indagação feita pela Consulente, não há dúvida que os efeitos subjetivos produzidos por sentença concessiva de segurança em mandado de segurança coletivo alcançariam, em tese, todos os associados do impetrante, independentemente da data da sua filiação. Esta questão já foi pacificada pelo col. Tribunal Pleno do eg. Supremo Tribunal Federal (STF), que, ao julgar o Tema de Repercussão Geral 1.119, afetado ao Agravo em Recurso Extraordinário (ARE) 1.293.130/SP, decidiu que “é desnecessária a autorização expressa dos associados, a relação nominal destes, bem como a comprovação de filiação prévia, para a cobrança de valores pretéritos de título judicial decorrente de mandado de segurança coletivo impetrado por entidade associativa de caráter civil” ([4]).

2.1        No julgamento daquele leading case, porém, foi ressalvada pelo Min. Roberto Barroso a questão de os filiados de associações genéricas, “que não representam quaisquer categorias econômicas e profissionais específicas” ([5]), também poderem ser beneficiados por decisões em mandado de segurança coletivo. Em outras palavras, o problema da legitimidade ativa das associações genéricas para a impetração de mandado de segurança coletivo em benefício de seus associados permaneceu “em aberto e pode vir a ser arguido pela União e discutido pelas instâncias ordinárias e, inclusive, em outro momento, por esta Corte” ([6]), independentemente do entendimento firmado pelo col. Tribunal Pleno do eg. Supremo Tribunal Federal (STF), quando do julgamento do Tema de Repercussão Geral 1.119, afetado ao Agravo em Recurso Extraordinário (ARE) 1.293.130/SP.

  1. Sucede, entretanto, que, em 07/02/2024, a col. Segunda Turma do eg. Supremo Tribunal Federal (STF) julgou o Agravo Regimental no Agravo em Recurso Extraordinário (ARE AgR) 1.339.496 e decidiu que associação genérica, como parece ser a associação para a qual se filiou a Consulente, não é parte legítima para impetrar mandado de segurança coletivo, a teor da seguinte ementa:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS CONTRIBUINTES TRIBUTÁRIOS (ABCT). ARE N. 1.293.130-RG-ED/SP; TEMA RG N. 1.119: PARADIGMA NÃO APLICÁVEL AO CASO. RESSALVA REGISTRADA NO PRÓPRIO LEADING CASE. IDENTIFICAÇÃO DE ASSOCIAÇÃO GENÉRICA. ILEGITIMIDADE ATIVA. 1. No julgamento do ARE n. 1.293.130-RG/SP, Tema RG n. 1.119, o Supremo Tribunal Federal assentou a desnecessidade de apresentação de relação nominal de associados ou comprovação de filiação prévia para que fique configurada a legitimidade ativa de associação em mandado de segurança coletivo. 2. No julgamento do leading case, ressalvou-se o caso das chamadas associações genéricas, conforme voto-vogal do eminente Ministro Roberto Barroso: “Entendo, conforme consta do voto do relator, que, no caso concreto, esta Corte não analisou se associações genéricas, que não representam quaisquer categorias econômicas e profissionais específicas, como é o caso da ANCT, podem ter seus associados beneficiados por decisões em mandado de segurança coletivo. Ou seja, esse tema ainda está em aberto e pode vir a ser arguido pela União e discutido pelas instâncias ordinárias e, inclusive, em outro momento, por esta Corte.” 3. A agravada insere-se na hipótese de associação genérica, pela indeterminação de seu objeto social e de seu rol de associados, razão pela qual não aplicável, ao caso, a tese fixada no Tema RG n. 1.119. 4. Reconhecida a ilegitimidade ativa da ABCT. 5. Agravo regimental da União (Fazenda Nacional) ao qual se dá provimento, para negar provimento ao agravo em recurso extraordinário, revigorando-se o acórdão do Tribunal Regional Federal da 2.ª Região ([7]).

3.1        Na ocasião, o argumento central utilizado pela col. Segunda Turma do eg. Supremo Tribunal Federal (STF) foi o seguinte:

[…] sem a determinação razoável das suas finalidades sociais, a associação deixa de informar ao Estado-juiz e à parte contrária quem de fato substitui ou representa. À ausência dessas informações essenciais sobre a associação, os demais sujeitos do processo têm por fulminadas suas correspondentes tarefas judicantes, na medida em que, não se sabe previamente a que fim se orienta a associação e com isso quais filiados ela, de fato, substitui. Daí é certa a afirmação de que a criação de uma associação sem uma determinação minimamente delineada de seu objetivo repercutirá na ofensa a princípios basilares do processo de envergadura constitucional, como o acesso à justiça, devido processo legal, contraditório e ampla defesa ([8]).

3.2        Apesar de não ter definido o que, a rigor, se poderia entender como uma associação genérica, o acórdão prolatado pela col. Segunda Turma do eg. Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar o Agravo em Recurso Extraordinário (ARE) 1.339.496, citou algumas características suas, como poucos associados ou ausência deles, especialmente na circunscrição na qual o mandado de segurança foi impetrado; existência de objeto amplo que não permita delimitar grupo certo e específico; e comercialização dos provimentos jurisdicionais favoráveis (a exemplo do caso concreto).

  1. Por óbvio, este também é o entendimento do eg. Tribunal Regional Federal da Quarta Região (TRF4):

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. ASSOCIAÇÃO GENÉRICA.

O mandado de segurança não pode ser usado para obter prestação jurisdicional de natureza coletiva quando a associação impetrante tem um número irrelevante de associados e ainda falta clareza e objetividade quanto aos propósitos, interesses e pessoas representadas ([9]) .

TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. AUTORIDADE COATORA. SUPERINTENDENTE REGIONAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL. LEGITIMIDADE. DELIMITAÇÃO TERRITORIAL. LEGITIMIDADE ATIVA. ASSOCIAÇÃO GENÉRICA.

  1. No mandado de segurança coletivo visando o afastamento de cobrança de tributo, admite-se que se indique como autoridade coatora o Superintendente da Receita Federal do Brasil, o qual, ademais, exerce atividades de supervisão dos delegados.
  2. O mandado de segurança não pode ser usado para obter prestação jurisdicional de natureza coletiva quando a associação impetrante tem um número irrelevante de associados e ainda falta clareza e objetividade quanto aos propósitos, interesses e pessoas representadas ([10]).

 

  1. Ante ao exposto, a Consulente não pode compensar pagamentos de contribuições para terceiros computadas sobre base de cálculo acima do limite de 20 (vinte) salários mínimos vigentes no país por se filiar à associação cujo mandado de segurança coletivo foi julgado procedente antes do julgamento do Tema Repetitivo 1.079 pela col. Primeira Seção do eg. Superior Tribunal de Justiça (STJ).

5.1        Embora a decisão a respeito da modulação dos efeitos tenha preservado o direito de limitar a base de cálculo das contribuições para terceiros a vinte salários mínimos vigentes no país às “empresas que ingressaram com ação judicial e/ou protocolaram pedidos administrativos até a data do início do presente julgamento, obtendo pronunciamento (judicial ou administrativo) favorável […] até a publicação do acórdão” ([11]), a col. Segunda Turma do eg. Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Agravo Regimental no Agravo em Recurso Extraordinário (ARE AgR) 1.339.496, decidiu que associação genérica não é parte legítima para impetrar mandado de segurança coletivo. Este entendimento é seguido, por exemplo, pela jurisprudência  atual do eg. Tribunal Regional Federal da Quarta Região (TRF4).

5.2        Portanto, é inaplicável às associações genéricas o precedente que foi fixado pelo col. Tribunal Pleno do eg. Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar o Tema de Repercussão Geral 1.119, afetado ao Agravo em Recurso Extraordinário (ARE) 1.293.130/SP, de que os efeitos subjetivos produzidos por sentença concessiva de segurança em mandado de segurança coletivo alcançariam todos os associados do impetrante, independentemente da data da sua filiação.

S.m.j., é o nosso parecer.

([1])        “Art 4.º. O limite máximo do salário-de-contribuição, previsto no art. 5.º da Lei n. 6.332, de 18 de maio de 1976, é fixado em valor correspondente a 20 (vinte) vezes o maior salário-mínimo vigente no País. Parágrafo único. O limite a que se refere o presente artigo aplica-se às contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros.”

([2])        REsp 1.898.532/CE, STJ, S1, Rel.ª Min.ª Regina Helena Costa, vu, j. 13/03/2024, DJe 02/05/2024;  REsp 1.905.870/PR, STJ, S1, Rel.ª Min.ª Regina Helena Costa, vu, j. 13/03/2024, DJe 02/05/2024.

([3])        REsp 1.898.532/CE, STJ, S1, Rel.ª Min.ª Regina Helena Costa, vu, j. 13/03/2024, DJe 02/05/2024;  REsp 1.905.870/PR, STJ, S1, Rel.ª Min.ª Regina Helena Costa, vu, j. 13/03/2024, DJe 02/05/2024.

([4])        ARE 1.293.130/SP, STF, Rel. Min. Luiz Fux, vu, j. 17/12/2020, DJe 08/01/2021.

([5])        ARE 1.293.130/SP, STF, Rel. Min. Luiz Fux, vu, j. 17/12/2020, DJe 08/01/2021.

([6])        ARE 1.293.130/SP, STF, Rel. Min. Luiz Fux, vu, j. 17/12/2020, DJe 08/01/2021.

([7])        ARE 1339496 AgR, STF, T2, Rel. Min. Edson Fachin, mv, j. 07/02/2023, DJe 10/04/2023.

([8])        ARE 1339496 AgR, STF, T2, Rel. Min. Edson Fachin, mv, j. 07/02/2023, DJe 10/04/2023.

([9])         5001417-44.2021.4.04.7201, TRF4, T1, Rel. Juiz Federal Alexandre Rossato da Silva Ávila, vu, j. 12/04/2023, DJe 12/04/2023.

([10])        AC 5067055-45.2021.4.04.7000, TRF4, T1, Rel. Juiz Federal Andrei Pitten Velloso, vu, j. 21/06/2024, DJe 21/06/2024.

([11])       REsp 1.898.532/CE, STJ, S1, Rel.ª Min.ª Regina Helena Costa, vu, j. 13/03/2024, DJe 02/05/2024;  REsp 1.905.870/PR, STJ, S1, Rel.ª Min.ª Regina Helena Costa, vu, j. 13/03/2024, DJe 02/05/2024.

Imunidade Tributária. Remuneração dos Dirigentes. Fundações de Apoio

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Diego Galbinski

Prezado(s) Senhor(es),

 

  1. Fundação X (“Consulente”), na pessoa de sua Superintendente Executiva, Sr.ª Y, formula consulta a respeito de se a (eventual) decisão de alterar o estatuto social, a fim de permitir que seus dirigentes estatutários sejam remunerados, implicaria a perda do direito à imunidade tributária dos serviços, prevista pelo art. 150, VI, ‘c’, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988 (CRFB/1988)([1]), que foi declarado pela sentença transitada em julgado nos autos da Ação de Conhecimento sob Procedimento Comum (Ordinário) n. (…) proposta contra o Município de Porto Alegre.
  1. Do nosso ponto de vista, o ponto de partida da resposta à pergunta que foi formulada pela Consulente gira em torno da interpretação e aplicação da redação atual do art. 12, § 2.º, ‘a’, §§ 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.537, de 10 de dezembro de 1997, que permite às instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos, no caso de associações, fundações ou organizações da sociedade civil, como titulares do direito à imunidade tributária do patrimônio, renda ou serviços, remunerarem seus dirigentes estatutários.

2.1         Entretanto, a redação original do art. 12, § 2.º, ‘a’, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997,  dispunha o seguinte:

Art. 12. Para efeito do disposto no art. 150, inciso VI, alínea ‘c’, da Constituição, considera-se imune a instituição de educação ou de assistência social que preste os serviços para os quais houver sido instituída e os coloque à disposição da população em geral, em caráter complementar às atividades do Estado, sem fins lucrativos.

[…]
  • 2.º Para o gozo da imunidade, as instituições a que se refere este artigo, estão obrigadas a atender os seguintes requisitos:
  1. a) não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados.

 

2.2         Posteriormente, o art. 18 da Lei n. 12.868, de 15 de outubro de 2013, acrescentou ao art. 12 da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, os §§ 4.º, 5.º e 6.º, com o seguinte teor:

Art. 12. […]

  • 4.º A exigência a que se refere a alínea ‘a’ do § 2.º não impede:

I – a remuneração aos diretores não estatutários que tenham vínculo empregatício; e

II – a remuneração aos dirigentes estatutários, desde que recebam remuneração inferior, em seu valor bruto, a 70% (setenta por cento) do limite estabelecido para a remuneração de servidores do Poder Executivo federal.

  • 5.º A remuneração dos dirigentes estatutários referidos no inciso II do § 4.º deverá obedecer às seguintes condições:

I – nenhum dirigente remunerado poderá ser cônjuge ou parente até 3.º (terceiro) grau, inclusive afim, de instituidores, sócios, diretores, conselheiros, benfeitores ou equivalentes da instituição de que trata o caput deste artigo; e

II – o total pago a título de remuneração para dirigentes, pelo exercício das atribuições estatutárias, deve ser inferior a 5 (cinco) vezes o valor correspondente ao limite individual estabelecido neste parágrafo.

  • 6.º O disposto nos §§ 4.º e 5.º não impede a remuneração da pessoa do dirigente estatutário ou diretor que, cumulativamente, tenha vínculo estatutário ou empregatício, exceto se houver incompatibilidade de jornadas de trabalho.

 

2.3         Em seguida, o art. 4.º da Lei n. 13.151, de 28 de julho de 2015, alterou a alínea ‘a’ do § 2.º do art. 12 da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, que passou a ter a seguinte redação:

Art. 12. […]

  • 2.º […]
  1. a) não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados, exceto no caso de associações assistenciais ou fundações, sem fins lucrativos, cujos dirigentes poderão ser remunerados, desde que atuem efetivamente na gestão executiva, respeitados como limites máximos os valores praticados pelo mercado na região correspondente à sua área de atuação, devendo seu valor ser fixado pelo órgão de deliberação superior da entidade, registrado em ata, com comunicação ao Ministério Público, no caso das fundações.

2.4         Por fim, a redação da alínea ‘a’ do § 2.º do art. 12 da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, foi modificada pelo art. 4.º da Lei n. 13.204, de 14 de dezembro de 2015, nos seguintes termos:

Art. 12. […]

  • 2.º […]
  1. a) não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados, exceto no caso de associações, fundações ou organizações da sociedade civil, sem fins lucrativos, cujos dirigentes poderão ser remunerados, desde que atuem efetivamente na gestão executiva e desde que cumpridos os requisitos previstos nos arts. 3º e 16 da Lei n. 9.790, de 23 de março de 1999, respeitados como limites máximos os valores praticados pelo mercado na região correspondente à sua área de atuação, devendo seu valor ser fixado pelo órgão de deliberação superior da entidade, registrado em ata, com comunicação ao Ministério Público, no caso das fundações.

 

2.5         De maneira que o art. 12, § 2.º, ‘a’, §§ 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, tem, atualmente, a seguinte redação:

Art. 12. Para efeito do disposto no art. 150, inciso VI, alínea ‘c’, da Constituição, considera-se imune a instituição de educação ou de assistência social que preste os serviços para os quais houver sido instituída e os coloque à disposição da população em geral, em caráter complementar às atividades do Estado, sem fins lucrativos.

[…]
  • 2.º Para o gozo da imunidade, as instituições a que se refere este artigo, estão obrigadas a atender os seguintes requisitos:
  1. a) não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados, exceto no caso de associações, fundações ou organizações da sociedade civil, sem fins lucrativos, cujos dirigentes poderão ser remunerados, desde que atuem efetivamente na gestão executiva e desde que cumpridos os requisitos previstos nos arts. 3. e 16 da Lei n. 9.790, de 23 de março de 1999, respeitados como limites máximos os valores praticados pelo mercado na região correspondente à sua área de atuação, devendo seu valor ser fixado pelo órgão de deliberação superior da entidade, registrado em ata, com comunicação ao Ministério Público, no caso das fundações.
[…]
  • 4.º A exigência a que se refere a alínea ‘a’ do § 2.º não impede:

I – a remuneração aos diretores não estatutários que tenham vínculo empregatício; e

II – a remuneração aos dirigentes estatutários, desde que recebam remuneração inferior, em seu valor bruto, a 70% (setenta por cento) do limite estabelecido para a remuneração de servidores do Poder Executivo federal.

  • 5.º A remuneração dos dirigentes estatutários referidos no inciso II do § 4.º deverá obedecer às seguintes condições:

I – nenhum dirigente remunerado poderá ser cônjuge ou parente até 3.º (terceiro) grau, inclusive afim, de instituidores, sócios, diretores, conselheiros, benfeitores ou equivalentes da instituição de que trata o caput deste artigo; e

II – o total pago a título de remuneração para dirigentes, pelo exercício das atribuições estatutárias, deve ser inferior a 5 (cinco) vezes o valor correspondente ao limite individual estabelecido neste parágrafo.

  • 6.º O disposto nos §§ 4.º e 5.º não impede a remuneração da pessoa do dirigente estatutário ou diretor que, cumulativamente, tenha vínculo empregatício, exceto se houver incompatibilidade de jornadas de trabalho.

 

  1. Conforme a redação atual do art. 12, § 2.º, ‘a’, §§ 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, a legislação tributária permite que as instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos organizadas sob a forma de associações, fundações ou organizações da sociedade civil remunerem seus dirigentes estatutários sem perderem o direito à imunidade tributária do patrimônio, renda ou serviços (CRFB/1988, Art. 150, VI, ‘c’), desde que sejam atendidos os seguintes requisitos:

3.1         Requisitos subjetivos:

3.1.1      O dirigente estatutário não pode ser cônjuge ou parente até 3.º (terceiro) grau, inclusive afim, de instituidores, sócios, diretores, conselheiros, benfeitores ou equivalentes da instituição (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 5.º, I);

3.1.2      O dirigente estatutário deve atuar, efetivamente, na gestão executiva da instituição (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 2.º, ‘a’); e

3.1.3      Além de vínculo estatutário, o dirigente pode ter vínculo empregatício com a instituição, exceto se houver incompatibilidade de jornadas de trabalho (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 6.º). Em outras palavras, “o § 6. deu legitimidade a uma prática comum em instituições de educação e saúde, relacionada ao fato de seus dirigentes estatutários […] também atuarem como parte do corpo docente ou médico das respectivas instituições. Nesse sentido, a norma explicitou a possibilidade da dupla remuneração em razão de dupla jornada de trabalho, desde que compatível([2]);

 

3.2         Requisitos objetivos:

3.2.1      A remuneração do dirigente estatutário deve ser, no máximo, o valor praticado pelo mercado, na região correspondente à área de atuação da instituição (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 2.º, ‘a’), mas de até 70% (setenta por cento) do limite estabelecido para a remuneração de servidores do Poder Executivo Federal (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 4.º, II);

3.2.2      O total da remuneração paga aos dirigentes estatutários deve ser inferior a 5 (cinco) vezes o valor correspondente ao limite individual de que trata o parágrafo 3.2.1 supra (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 5.º, II);

3.2.3      A remuneração do dirigente estatutário deve ser fixada pelo órgão de deliberação superior da instituição (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 2.º, ‘a’); e

3.2.4      No caso das fundações, a ata que registrar a remuneração do dirigente fixada pelo órgão superior da instituição deve ser comunicada ao Ministério Público (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 2.º, ‘a’).

 

3.3         Porém, no que diz respeito às fundações de apoio, não podem ser remunerados por exercício de suas funções os membros dos conselhos, a teor do que dispõe o art. 4.º, I, do Decreto n. 7.423, de 31 de dezembro de 2010:

Art. 4.º O pedido de registro e credenciamento previsto no art. 3.º deverá ser instruído com os seguintes documentos:

I – estatuto social da fundação de apoio, comprovando finalidade não lucrativa e que os membros dos seus conselhos não são remunerados por exercício de suas funções (grifou-se).

3.3.1      O art. 4.º, I, do Decreto n. 7.423, de 31 de dezembro de 2010, revogou o art. 4.º, § 1.º, do Decreto n. 5.205, de 14 de setembro de 2004, que proibia a remuneração por exercício de suas funções não apenas dos membros dos conselhos, mas também dos membros da diretoria, nos seguintes termos:

Art. 4.º As fundações de apoio às instituições federais de ensino superior e de pesquisa científica e tecnológica são entidades de direito privado regidas pelo disposto no Código Civil Brasileiro e na Lei nº 8.958, de 20 de dezembro de 1994. § 1.º Os membros da diretoria e dos conselhos das fundações de apoio não poderão ser remunerados pelo exercício dessas atividades, sendo permitido aos servidores das instituições apoiadas, sem prejuízo de suas atribuições funcionais, ocuparem tais cargos desde que autorizados pela instituição apoiada.

 

3.4         Todavia, os servidores das instituições federais de ensino superior e demais instituições científicas e tecnológicas que participam dos órgãos de direção das fundações de apoio não podem ser remunerados pelo exercício de suas funções, conforme o art. 4.º, § 5.º, da Lei n. 8.958, de 20 de dezembro de 1994, na redação da Lei n. 12.863, de 24 de setembro de 2013:

Art. 4.º As IFES e demais ICTs contratantes poderão autorizar, de acordo com as normas aprovadas pelo órgão de direção superior competente e limites e condições previstos em regulamento, a participação de seus servidores nas atividades realizadas pelas fundações referidas no art. 1.º desta Lei, sem prejuízo de suas atribuições funcionais.

[…]

 

3.4.1      Esta proibição também é aplicável ao professor da instituição federal de ensino superior que participe dos órgãos de direção de fundação de apoio, conforme o art. 20, § 4.º, I, da Lei n. 12.772, de 28 de dezembro de 2012, na redação da Lei n. 12.863, de 24 de setembro de 2013:

Art. 20. O Professor das IFE, ocupante de cargo efetivo do Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Federal, será submetido a um dos seguintes regimes de trabalho:

[…]
  • 4.º O professor, inclusive em regime de dedicação exclusiva, desde que não investido em cargo em comissão ou função de confiança, poderá:

I – participar dos órgãos de direção de fundação de apoio de que trata a Lei n. 8.958, de 20 de dezembro de 1994, nos termos definidos pelo Conselho Superior da IFE, observado o cumprimento de sua jornada de trabalho e vedada a percepção de remuneração paga pela fundação de apoio (grifou-se).

3.4.2      Contudo, não é aplicável para o professor da instituição federal de ensino superior que ocupe o cargo de dirigente máximo de fundação de apoio, a teor do que dispõem, respectivamente, o art. 20, § 4.º, II, da Lei n. 12.772, de 28 de dezembro de 2012, na redação da Lei n. 12.863, de 24 de setembro de 2013, e o art. 20-A, I, da Lei n. 12.772, de 28 de dezembro de 2012, na redação da Lei n. 13.243, de 11 de janeiro de 2016:

Art. 20. O Professor das IFE, ocupante de cargo efetivo do Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Federal, será submetido a um dos seguintes regimes de trabalho:

[…]
  • 4.º O professor, inclusive em regime de dedicação exclusiva, desde que não investido em cargo em comissão ou função de confiança, poderá:
[…]

II – ocupar cargo de dirigente máximo de fundação de apoio de que trata a Lei n. 8.958, de 20 de dezembro de 1994, mediante deliberação do Conselho Superior da IFE.

 

Art. 20-A. Sem prejuízo da isenção ou imunidade previstas na legislação vigente, as fundações de apoio às Instituições de Ensino Superior e as Instituições Científica, Tecnológica e de Inovação (ICTs) poderão remunerar o seu dirigente máximo que:

[…]

II – seja estatutário, desde que receba remuneração inferior, em seu valor bruto, a 70% (setenta por cento) do limite estabelecido para a remuneração de servidores do Poder Executivo federal.

 

3.4.3      Entretanto, para a imunidade tributária do patrimônio, renda ou serviços das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos (CRFB/1988, Art. 150, VI, ‘c’), a remuneração do professor da instituição federal de ensino superior que ocupe o cargo de dirigente máximo de fundação de apoio também deve cumprir os requisitos subjetivos e objetivos previstos pela redação atual do art. 12, §§ 2.º, ‘a’, 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997. De acordo com o critério da especialidade (lex specialis derogat legi generali)([3]), no conflito com o inciso II do art. 20-A da Lei n. 12.772, de 28 de dezembro de 2012, prevalece o art. 12, §§ 2.º, ‘a’, 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997.

 

3.4.4      Logo, para a imunidade tributária do patrimônio, renda ou serviços das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos não é suficiente que o professor da instituição federal de ensino superior que ocupe o cargo de dirigente máximo de fundação de apoio receba remuneração inferior, em seu valor bruto, a 70% (setenta por cento) do limite estabelecido para a remuneração de servidores do Poder Executivo Federal. A remuneração do professor da instituição federal de ensino superior que ocupe o cargo de dirigente máximo de fundação de apoio também deve cumprir os requisitos subjetivos e objetivos previstos pela redação atual do art. 12, §§ 2.º, ‘a’, 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997.

 

  1. Embora a permissão da remuneração dos dirigentes estatutários, prevista pela redação atual do art. 12, § 2.º, ‘a’, §§ 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, pareça, à primeira vista, uma reviravolta no regime jurídico da imunidade tributária do patrimônio, renda ou serviços das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos, tanto a doutrina quanto a jurisprudência já entendiam que as instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos podiam remunerar os dirigentes estatutários. Aos seus olhis, o requisito da imunidade tributária do patrimônio, renda ou serviços da instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos (CRFB/1988, Art. 150, VI, ‘c’), de que não podem distribuir qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título (CTN, Art. 14, I)([4]), não implicaria, necessariamente, que não pudessem remunerar seus dirigentes estatutários, a despeito da redação original do art. 12, § 2.º, ‘a’, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997.

 

4.1         Misabel Derzi, por exemplo, afirmava que o art. 14, I, do Código Tributário Nacional (CTN) “não proíbe reembolsar o trabalho efetivo, prestado à pessoa imune, […] por seus próprios dirigentes, gestores ou gerentes([5]). Para ela, “O que se veda é a distribuição disfarçada de lucro, contra trabalhos fictícios (não importando a denominação criada para o pagamento)([6]).

4.2         No mesmo sentido, lecionavam Marcos Nóbrega (“Essa vedação, no entanto, não impede que a entidade cobre por seus serviços nem tampouco esteja impedida de remunerar seus dirigentes“)([7]) e Octavio Campos Fischer (“Ora, se existem instituições pretensamente imunes, que distribuem lucros de forma disfarçada, como se remuneração fosse, o Poder Público, em vez de impedir que os dirigentes das demais instituições imunes sejam remunerados, deveria criar instrumentos para punir o cometimento de abuso por parte dos contribuintes“)([8]).

4.3         Também a jurisprudência, inclusive dos tribunais administrativos, decidia, por exemplo, que “o pagamento regular de salários e outros benefícios aos diretores não caracteriza a distribuição de lucros ou rendas a dirigentes ou participação nos resultados pelos seus administradores” (Ac. n. 101-93.916, 1. CC, 1.ª C, Rel. Cons. Paulo Roberto Cortez, vu, j. 21/08/2002); “O pagamento regular de salários aos dirigentes de instituição de ensino sem fins lucrativos, que, como empregados, comprovadamente exercem as funções, não configura infração ao disposto no art. 14, inciso I, do Código Tributário Nacional” (Ac. n. 103-22.846, 1. CC, 1.ª C, Rel. Cons. Alexandre Barbosa Jaguaribe, mv, j. 24/01/2007); “Não é suficiente para se considerar desatendido o disposto no § 2.º do art. 12 da Lei 9.532/97 o regular pagamento de salários aos dirigentes da mantenedora em retribuição a serviços prestados na entidade mantida, quando a fiscalização não provar que a situação apresentada configura distribuição simulada de resultados” (Ac. n. 108-09-420, 1. CC, 8.ª C, Rel.ª Cons.ª Ivete Malaquias Pessoa Monteiro, vu, j. 14/09/2007).

 

  1. Por isso, a Confederação Nacional de Saúde – Hospitais, Estabelecimentos e Serviços (CNS), em 11/03/1998, propôs a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1802/DF, no eg. Supremo Tribunal Federal (STF), sob o argumento de que a redação original do art. 12, § 2.º, ‘a’, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, que proibia a remuneração dos dirigentes estatutários das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos, havia instituído novo requisito à imunidade tributária do patrimônio, renda ou serviços, em que pese a reserva de competência à lei complementar, prevista pelo art. 146, II, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988 (CRFB/1988)([9]).

 

5.1         Todavia, a inconstitucionalidade da redação original do art. 12, § 2.º, ‘a’, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, foi rejeitada pelo eg. Supremo Tribunal Federal (STF), com base na premissa de que “a Constituição remete à lei ordinária, no tocante à imunidade tributária considerada, […] a fixação de normas sobre a constituição e o funcionamento da entidade educacional ou assistencial imune([10]). Na ocasião, o eg. Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu que “o que diga respeito aos lindes da imunidade, […] quando suscepveis de disciplina infraconstitucional, ficou reservado à lei complementar([11]). Entretanto, concluiu que a proibição da remuneração dos dirigentes estatutários, prevista pela redação original do art. 12, § 2.º, ‘a’, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, dizia respeito à constituição e funcionamento das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos, que constituiria matéria reservada à lei ordinária, a teor do art. 150, VI, ‘c’, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988 (CRFB/1988)([12]).

5.2         Segundo o Relator, Min. Dias Toffoli, a interpretação intra-sistemática da cláusula “atendidos os requisitos da lei“, a que se refere o art. 150, VI, ‘c’, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988 (CRFB/1988), e da cláusula “cabe à lei complementar“, de que trata o art. 146, II, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988 (CRFB/1988), serviria de base para a conclusão de que a reserva de lei complementar (CRFB/1988, Art. 146, II) diria respeito “aos lindes da imunidade([13]), ao passo que a reserva de lei ordinária (CRFB/1988, Art. 150, VI, ‘c’), “às normas reguladoras da constituição e funcionamento da entidade imune([14]).

5.3         Trata-se a bem da verdade de entendimento antigo do eg. Supremo Tribunal Federal (STF), que foi inaugurado pelo julgamento do RE 93.770/RJ (“O art. 19, III, ‘c’, da Constituição Federal não trata de isenção, mas de imunidade. A configuração desta está na Lei Maior. Os requisitos da lei ordinária, que o mencionado manda observar, não dizem respeito aos lindes da imunidade, mas àquelas normas reguladoras da constituição e funcionamento da entidade imune“)([15]), até hoje, observado, como no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 2028/DF (“2. Aspectos meramente procedimentais referentes à certificação, fiscalização e controle administrativo continuam passíveis de definição em lei ordinária“)([16]).

5.4         Portanto, a redação atual do art. 12, § 2.º, ‘a’, §§ 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.537, de 10 de dezembro de 1997, que permite às instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos, no caso de associações, fundações ou organizações da sociedade civil, remunerarem seus dirigentes estatutários, é constitucional: seja como requisito da imunidade tributária do patrimônio, renda ou serviços das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos (CTN, Art. 14, I; CRFB/1988, Art. 146, II); seja como requisito de constituição e funcionamento das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos (CRFB/1988, Art. 150. VI, ‘c’).

 

  1. Dada a constitucionalidade da redação atual do art. 12, § 2.º, ‘a’, §§ 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.537, de 10 de dezembro de 1997, se o órgão superior de deliberação da Consulente decidir alterar o estatuto social, a fim de permitir que sejam remunerados os dirigentes estatutários, desde que não sejam servidores da instituição federal de ensino superior, com exceção do professor da instituição federal de ensino superior que exerce o cargo de dirigente máximo, a Consulente não perderá o direito à imunidade tributária do serviços (CRFB/1988, Art. 150, VI, ‘c’), que foi declarado pela sentença transitada em julgado nos autos da Ação de Conhecimento sob Procedimento Comum (Ordinário) n. (…), proposta em face do Município de Porto Alegre (“coisa julgada”).

 

6.1         A Consulente é fundação de direito privado que apoia instituição federal de ensino superior em projetos de ensino, pesquisa e extensão e de desenvolvimento institucional, científico e tecnológico. Na qualidade jurídica de fundação de apoio, é titular do direito à imunidade tributária dos serviços das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos, prevista pelo art. 150, VI, ‘c’, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, de acordo com a coisa julgada, que projetará efeitos para o futuro, até sobrevir modificação no estado de fato ou de direito, a teor do art. 505, I, do Código de Processo Civil (CPC)([17]).

 

6.2       No que diz respeito ao estado de fato ou de direito que subjaz a coisa julgada, o direito da Consulente à “imunidade tributária […], relativamente ao ISS” foi declarado pela coisa julgada, com base em três fundamentos (de fato e de direito):

6.2.1      Primeiro, a Consulente é instituição de educação e assistência social sem fins lucrativos (“Assim, além de a entidade ser instituição de educação e assistencial sem fins lucrativos“) (CRFB/150, VI, ‘c’)([18]);

6.2.2      Segundo, a Consulente não distribui qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título (“O profissional mencionou, ainda: verifica-se que não foram distribuídas rendas de qualquer título ou patrimônio e que os recursos foram aplicados integralmente no país‘”) (CTN, Art. 14, I)([19]); e

6.2.3      Terceiro, a Consulente aplica, integralmente, no país, os seus recursos para a manutenção dos seus objetivos institucionais (“A perícia analisou todos os demonstrativos contáveis disponibilizados e evidenciou que as despesas e custos foram empregados para a manutenção dos objetos institucionais“) (CTN, Art. 14, II)([20]).

 

6.4         Embora um dos fundamentos (de fato e de direito) utilizados pela coisa julgada para declarar o direito da Consulente à “imunidade tributária […], relativamente ao ISS” tenha sido o de que não distribui qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título (“O profissional mencionou, ainda: verifica-se que não foram distribuídas rendas de qualquer título ou patrimônio e que os recursos foram aplicados integralmente no país‘”) (CTN, Art. 14, I), a (eventual) decisão de alterar o estatuto social para permitir que a Consulente remunere os dirigentes estatutários, desde que não sejam servidores da instituição federal de ensino superior, com exceção do professor da instituição federal de ensino superior que exerce o cargo de dirigente máximo, não modificará o estado de fato ou de direito que subjaz a coisa julgada, por três razões:

6.4.1      Primeira, tanto a doutrina quanto a jurisprudência entendiam que o requisito da imunidade tributária do patrimônio, renda ou serviços das instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos (CRFB/1988, Art. 150, VI, ‘c’) de não poder distribuir qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título (CTN, Art. 14, I), não implicava, necessariamente, a proibição da remuneração dos dirigentes estatutários;

6.4.2      Segunda, à época da propositura da Ação de Conhecimento sob Procedimento Comum (Ordinário) n. (…) contra o Município de Porto Alegre, já estava em vigor a redação atual do art. 12, § 2.º, ‘a’, §§ 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, que permite às instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos, no caso de associações, fundações ou organizações da sociedade civil, como titulares do direito à imunidade tributária do patrimônio, renda ou serviços (CRFB, Art. 150, VI, ‘c’), remunerarem seus dirigentes estatutários;

6.4.3      Terceira, à época do trânsito em julgado da sentença nos autos da Ação de Conhecimento sob Procedimento Comum (Ordinário) n. (…) proposta contra o Município de Porto Alegre, já estava igualmente em vigor a redação atual do art. 20, § 4.º, II, da Lei n. 12.772, de 28 de dezembro de 2012, e do art. 20-A, I, da Lei n. 12.772, de 28 de dezembro de 2012, na redação da Lei n. 13.243, de 11 de janeiro de 2016, que permitem a remuneração do professor da instituição federal de ensino superior que ocupe o cargo de dirigente máximo de fundação de apoio.

 

6.5         Portanto, caso o estatuto social da Consulente, antes da data da coisa julgada, permitisse a remuneração dos dirigentes estatutários, desde que não fossem servidores da instituição federal de ensino superior, com exceção do professor da instituição federal de ensino superior que exercesse o cargo de dirigente máximo, não impediria que fosse declarado o direito à imunidade tributária dos serviços das instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos (CRFB/1988, Art. 150, VI, ‘c’). Logo, se o órgão superior de deliberação da Consulente decidir alterar o estatuto social, a fim de permitir a remuneração dos dirigentes estatutários, desde que não sejam servidores da instituição federal de ensino superior, com exceção do professor da instituição federal de ensino superior que exerce o cargo de dirigente máximo, não modificará o estado de fato ou de direito que subjaz a coisa julgada, que declarou o direito à imunidade tributária dos serviços das instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos (CRFB/1988, Art. 150, VI, ‘c’).

 

  1. Ante ao exposto, a (eventual) decisão de alterar o estatuto social para permitir que a Consulente remunere seus dirigentes estatutários, desde que não sejam servidores da instituição federal de ensino superior, com exceção do professor da instituição federal de ensino superior que exerce o cargo de dirigente máximo, não implicará a perda do direito à imunidade tributária dos serviços, prevista pelo art. 150, VI, ‘c’, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988 (CRFB/1988), que foi declarado pela sentença transitada em julgado nos autos da Ação de Conhecimento sob Procedimento Comum (Ordinário) n. (…) proposta em face do Município de Porto Alegre (“coisa julgada”), cujos efeitos se projetarão para o futuro, até sobrevir modificação no estado de fato ou de direito (CPC, Art. 505, I).

 

7.1         Conforme a redação atual do art. 12, § 2.º, ‘a’, §§ 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, a legislação tributária permite que as instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos organizadas sob a forma de associações, fundações ou organizações da sociedade civil remunerem seus dirigentes estatutários sem perderem o direito à imunidade tributária do patrimônio, renda ou serviços (CRFB/1988, Art. 150, VI, ‘c’), desde que sejam atendidos os seguintes requisitos:

7.1.1      Requisitos subjetivos:

7.1.1.1   O dirigente estatutário não pode ser cônjuge ou parente até 3.º (terceiro) grau, inclusive afim, de instituidores, sócios, diretores, conselheiros, benfeitores ou equivalentes da instituição (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 5.º, I);

7.1.1.2 O dirigente estatutário deve atuar, efetivamente, na gestão executiva da instituição (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 2.º, ‘a’); e

7.1.1.3 Além de vínculo estatutário, o dirigente pode ter vínculo empregatício com a instituição, exceto se houver incompatibilidade de jornadas de trabalho (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 6.º). Em outras palavras, “o § 6. deu legitimidade a uma prática comum em instituições de educação e saúde, relacionada ao fato de seus dirigentes estatutários […] também atuarem como parte do corpo docente ou médico das respectivas instituições. Nesse sentido, a norma explicitou a possibilidade da dupla remuneração em razão de dupla jornada de trabalho, desde que compatível([21]);

 

7.1.2      Requisitos objetivos:

7.1.2.1 A remuneração do dirigente estatutário deve ser, no máximo, o valor praticado pelo mercado, na região correspondente à área de atuação da instituição (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 2.º, ‘a’), mas de até 70% (setenta por cento) do limite estabelecido para a remuneração de servidores do Poder Executivo Federal (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 4.º, II);

7.1.2.2 O total da remuneração paga aos dirigentes estatutários deve ser inferior a 5 (cinco) vezes o valor correspondente ao limite individual de que trata o parágrafo 3.2.1 supra (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 5.º, II);

7.1.2.3 A remuneração do dirigente estatutário deve ser fixada pelo órgão de deliberação superior da instituição (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 2.º, ‘a’); e

7.1.2.4 No caso das fundações, a ata que registrar a remuneração do dirigente fixada pelo órgão superior da instituição deve ser comunicada ao Ministério Público (Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, Art. 12, § 2.º, ‘a’).

 

7.2         Particularmente, no que diz respeito às fundações de apoio, também não podem ser remunerados por exercício de suas funções os membros dos conselhos, a teor do art. 4.º, I, do Decreto n. 7.423, de 31 de dezembro de 2010, que revogou o art. 4.º, § 1.º, do Decreto n. 5.205, de 14 de setembro de 2004, o qual proibia a remuneração não apenas dos membros dos conselhos, mas também dos membros da diretoria.

 

7.3         Todavia, os servidores das instituições federais de ensino superior e demais instituições científicas e tecnológicas que participam dos órgãos de direção das fundações de apoio não podem ser remunerados pelo exercício de suas funções, conforme o art. 4.º, § 5.º, da Lei n. 8.958, de 20 de dezembro de 1994, na redação da Lei n. 12.863, de 24 de setembro de 2013. Esta proibição também é aplicável ao professor da instituição federal de ensino superior que participe dos órgãos de direção de fundação de apoio, com exceção do professor da instituição de ensino superior que ocupe o cargo de dirigente máximo de fundação de apoio, a teor do art. 20, § 4.º, I e II, da Lei n. 12.772, de 28 de dezembro de 2012, na redação da Lei n. 12.863, de 24 de setembro de 2013, e do art. 20-A, I, da Lei n. 12.772, de 28 de dezembro de 2012, na redação da Lei n. 13.243, de 11 de janeiro de 2016.

7.3.1      Entretanto, para a imunidade tributária do patrimônio, renda ou serviços das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos (CRFB/1988, Art. 150, VI, ‘c’), a remuneração do professor da instituição federal de ensino superior que ocupe o cargo de dirigente máximo de fundação de apoio também deve cumprir os requisitos objetivos e subjetivos previstos pela redação atual do art. 12, §§ 2.º, ‘a’, 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997. De acordo com o critério da especialidade (lex specialis derogat legi generali), no conflito com o inciso II do art. 20-A da Lei n. 12.772, de 28 de dezembro de 2012, prevalece o art. 12, §§ 2.º, ‘a’, 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997.

 

7.4         Embora um dos fundamentos (de fato e de direito) utilizados pela coisa julgada para declarar o direito da Consulente à “imunidade tributária […], relativamente ao ISS” tenha sido o de que a Consulente não distribui qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título (“O profissional mencionou, ainda: verifica-se que não foram distribuídas rendas de qualquer título ou patrimônio e que os recursos foram aplicados integralmente no país‘”) (CTN, Art. 14, I), a (eventual) decisão de alterar o estatuto social para permitir que a Consulente remunere os dirigentes estatutários, desde que não sejam servidores da instituição federal de ensino superior, com exceção do professor da instituição federal de ensino superior que exerça o cargo de dirigente máximo, não modificará o estado de fato ou de direito que subjaz a coisa julgada, por três razões:

7.4.1      Primeira, tanto a doutrina quanto a jurisprudência já entendiam que o requisito da imunidade tributária do patrimônio, da renda ou dos serviços das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos de não poder distribuir qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título (CTN, Art. 14, I), não implicava, necessariamente, a proibição da remuneração dos dirigentes estatutários;

7.4.2      Segunda, à época da propositura da Ação de Conhecimento sob Procedimento Comum (Ordinário) n. (…) contra o Município de Porto Alegre, já estava em vigor a redação atual do art. 12, § 2.º, ‘a’, §§ 4.º, 5.º e 6.º, da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997, que permite às instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos organizadas sob a forma de associações, fundações ou organizações da sociedade civil remunararem seus dirigentes estatutários;

7.4.3      Terceira, à época do trânsito em julgado da sentença nos autos da Ação de Conhecimento sob Procedimento Comum (Ordinário) n. (…) proposta contra o Município de Porto Alegre, também já estava em vigor, a redação atual do art. 20, § 4.º, II, da Lei n. 12.772, de 28 de dezembro de 2012, e do art. 20-A, I, da Lei n. 12.772, de 28 de dezembro de 2012, na redação da Lei n. 13.243, de 11 de janeiro de 2016, que permitem a remuneração do professor da instituição federal de ensino superior que ocupe o cargo de dirigente máximo de fundação de apoio.

 

7.5         Portanto, caso o estatuto social da Consulente, antes da data da coisa julgada, permitisse a remuneração dos dirigentes estatutários, desde que não fossem servidores da instituição federal de ensino superior, com exceção do professor da instituição federal de ensino superior que exercesse o cargo de dirigente máximo, não impediria a declaração do direito à imunidade tributária dos serviços das instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos (CRFB/1988, Art. 150, VI, ‘c’). Logo, se o órgão superior de deliberação da Consulente decidir alterar o estatuto social, a fim de permitir que os dirigentes estatutários sejam remunerados, desde que não sejam servidores da instituição federal de ensino superior, com exceção do professor da instituição federal de ensino superior que exerça o cargo de dirigente máximo, não modificará o estado de fato ou de direito que subjaz a coisa julgada, que declarou o direito à imunidade tributária dos serviços das instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos (CRFB/1988, Art. 150, VI, ‘c’).

 

S.m.j, é o parecer.

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([1])              “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: […] VI – instituir impostos sobre: […] c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei”.

([2])             Paes, José Eduardo Sabo. Fundações, associações e entidades de interesse social. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 485.

([3])             Decreto-lei n. 4.557, de 4 de setembro de 1942, Art. 2.º, § 2.º: “Art. 2.º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue. […] § 2.º A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.”

([4])             “Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do art. 9.º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas: I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título”.

([5])              BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 8 ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 523.

([6])              BALEEIRO, op. cit., p. 523.

([7])              NÓBREGA, Marcos. Tributação do terceiro setor. MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Disciplina legal tributária do terceiro setor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 106.

([8])              FISCHER, Octavio Campos. Terceiro setor e tributação. MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Disciplina legal tributária do terceiro setor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 361.

([9])               “Art. 146. Cabe à lei complementar: […] II – regular as limitações constitucionais ao poder de tributar”.

([10])            ADI 1802/DF, STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Dias Toffoli, vu, j. 12/04/2018, DJe 03/05/2018.

([11])            ADI 1802/DF, STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Dias Toffoli, vu, j. 12/04/2018, DJe 03/05/2018.

([12])            “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: […] VI – instituir impostos sobre: […] c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei”.

([13])            ADI 1802/DF, STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Dias Toffoli, vu, j. 12/04/2018, DJe 03/05/2018.

([14])            ADI 1802/DF, STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Dias Toffoli, vu, j. 12/04/2018, DJe 03/05/2018.

([15])            RE 93.770/RJ, STF, T1, Rel. Min. Soares Muñoz, vu, j. 17/03/1981, DJ 03/04/1981.

([16])            ADI 2028/DF, STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, mv, j. 02/03/2017, DJe 05/05/2017.

([17])            “Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo: I – se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença”.

([18])            “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: […] VI – instituir impostos sobre: […] c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei”.

([19])               “Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9.º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas: I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título”.

([20])               “Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9.º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas: […] II – aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais”.

([21])            Paes, 2020, p. 485.

TAX DROPS | MARÇO 2024

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Diego Galbinski Advocacia lança sua Tax Drops | Março de 2024.

Nesta edição nosso sócio Diego Galbinski elabora parecer sobre a possibilidade de risco de responsabilidade solidária em relação a créditos tributários devidos por clientes que utilizam terceiros, sob a ótica do Código Tributário Nacional (CTN).

Confira as principais novidades e alterações na área tributária e acompanhe a atuação do Escritório.

Responsabilidade Tributária Solidária. Interesse Comum. Código Tributário Nacional (CTN), Art. 124, I

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Diego Galbinski

 

Prezado(s) Senhor(es),

Companhia X (“Consulente”), na pessoa da sua Gerente de Controladoria, Sr.ª Y, formula consulta a respeito da análise do risco (baixo, médio ou alto) de responsabilidade tributária solidária, com relação a créditos tributários devidos por cliente(s) que interpõe(m), ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica), a fim de evadir o cumprimento de obrigações tributárias, decorrentes da venda (posterior) das mercadorias (ovos).

Quanto à responsabilidade tributária solidária, dispõe o Código Tributário Nacional (CTN), no seu art. 124, o seguinte:

Art. 124. São solidariamente obrigadas:

I – as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal;

II – as pessoas expressamente designadas por lei.

Parágrafo único. A solidariedade referida neste artigo não comporta benefício de ordem.

Conforme este enunciado normativo, são solidariamente obrigadas ao crédito tributário (a) as pessoas expressamente designadas por lei (CTN, Art. 124, II) e (b) as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal (CTN, Art. 124, I).

No que diz respeito à definição do conceito de interesse comum, que enucleia o suporte fático da responsabilidade tributária solidária, previsto pelo inciso I do art. 124 do Código Tributário Nacional (CTN), por se tratar de um conceito indeterminado, cuja extensão de significado é incerta ([1]), tem o intérprete certa dose de discricionariedade para escolher qual é o melhor sentido, à luz das circunstâncias do caso concreto ([2]).

Quando enfrentou situações de fato semelhantes, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) ([3]) concluiu que o interesse comum a que se refere o art. 124, I, do Código Tributário Nacional (CTN) não se confundiria com interesse econômico, na medida em que o interesse comum exigiria do contribuinte e do (eventual) responsável solidário que participassem “conjuntamente da situação que configura o fato gerador, sendo irrelevante a simples participação nos lucros eventualmente obtidos pela outra empresa coligada ou do mesmo grupo econômico” ([4]).

Em outras palavras, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) decidiu que a presença do interesse comum pressuporia que as pessoas solidariamente obrigadas (o contribuinte e o – eventual – responsável solidário) ocupassem o mesmo polo da relação jurídica que causou a ocorrência da situação definida em lei como fato gerador da obrigação principal. Caso contrário, não haveria interesse comum na situação que constitui o fato gerador da obrigação principal, previsto pelo inciso I do art. 124 do Código Tributário Nacional (CTN) como suporte fático da responsabilidade tributária solidária.

Este sentido também é atribuído pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para a definição do conceito de interesse comum utilizado pelo inciso I do art. 124 do Código Tributário Nacional (CTN). No REsp 859.616/RS, confirmado, posteriormente, pelo EREsp 859.616/RS, a col. 1.ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não existiria interesse comum na situação de fato que constitui o fato gerador da obrigação principal toda vez que o contribuinte e o (eventual) responsável solidário ocupassem posições (jurídicas) contrapostas e tivessem objetivos antagônicos ([5]).

No voto condutor, o relator, Min. Luiz Fux, desenvolveu a seguinte ordem de considerações a respeito da questão:

A solidariedade passiva é um instituto de direito civil aplicável a todos os ramos do direito, segundo o qual, em havendo pluralidade de sujeitos no pólo passivo de uma relação jurídica, cada um deles é obrigado à dívida toda, podendo o credor exigir de um ou alguns, parcial ou totalmente, a dívida em comum.

Com efeito, em matéria tributária, a presunção de solidariedade opera  inversamente àquela do direito civil, no sentido de que sempre que, numa mesma relação jurídica, houver duas ou mais pessoas caracterizadas como contribuinte, cada uma delas estará obrigada pelo pagamento integral da dívida, perfazendo-se o instituto da solidariedade passiva. Ad exemplum, no caso de duas ou mais pessoas serem proprietárias de um mesmo imóvel urbano, haveria uma pluralidade de contribuintes solidários quanto ao adimplemento do IPTU, uma vez que  a situação de fato – a co-propriedade –  é-lhes comum.

[…]

Nesse segmento, conquanto a expressão  “interesse comum” – encarte um conceito indeterminado, é mister proceder-se a uma interpretação sistemática das normas tributárias, de modo a alcançar a ratio essendi  do referido dispositivo legal.

Nesse diapasão, tem-se que o interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal implica que as pessoas solidariamente obrigadas sejam sujeitos da relação jurídica que deu azo à ocorrência do fato imponível. Isto porque feriria a lógica jurídico-tributária a integração, no pólo passivo da relação jurídica, de alguém que não tenha tido qualquer participação na ocorrência do fato gerador da obrigação.

[…]

Destarte, a situação que evidencia a solidariedade, no condizente ao ISS, é a existência de duas ou mais pessoas na condição de prestadoras de apenas um único serviço para o mesmo tomador, integrando, desse modo, o pólo passivo da relação.  Forçoso concluir, portanto, que o interesse qualificado pela lei não há de ser o interesse econômico no resultado ou no proveito da situação que constitui o fato gerador da obrigação principal, mas o interesse jurídico, vinculado à atuação comum ou conjunta da situação que constitui o fato imponível ([6]).

Portanto, à luz da jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), podemos concluir que o risco de a Consulente ser responsabilizada solidariamente por créditos tributários devidos por cliente(s) que interpõe(m), ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica), para evadir o cumprimento de obrigações tributárias, decorrentes da venda (posterior) das mercadorias (ovos), é baixo.

Em que pese possuírem interesses coincidentes, no que diz respeito à sua realização, o vendedor e o comprador, no contrato de compra e venda, têm interesses contrapostos, no que diz respeito à sua execução ([7]). Por isso, o vendedor, a rigor, não participaria, em tese, com o comprador, da situação jurídica que configura o fato gerador da obrigação principal, caso o comprador interpusesse, ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica), para evadir o seu cumprimento, na(s) operação(ões) posterior(es).

Este risco, porém, é médio, se levarmos em consideração o ponto de vista (interpretativo) da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB), que diverge do entendimento firmado não só pela jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), mas também pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A respeito da definição do conceito de interesse comum, o Parecer Normativo COSIT/RFB n. 4, de 10 de dezembro de 2018, firmou a posição de que significaria o “interesse comum da pessoa responsabilizada na situação vinculada ao fato jurídico tributário, que pode ser tanto o ato lícito que gerou a obrigação tributária como o ilícito que a desfigurou” (grifou-se).

Conforme este ponto de vista (interpretativo), a responsabilidade tributária solidária poderia recair tanto sobre aqueles que atuam diretamente, realizando atos que, individualmente ou em conjunto com outros, levam à situação que configura o fato gerador, quanto sobre aqueles que estão ativamente envolvidos no ato, fato ou negócio que deu origem ao evento tributário, por meio da prática de atos ilícitos que o manipularam.

O interesse comum só seria sinônimo de interesse jurídico nos casos em que se estivesse a tratar de negócio jurídico lícito. Por outro lado, nos casos em que se estivesse a tratar de ato ilícito, haveria, presumivelmente, uma comunhão entre as partes, visando à lesão da administração tributária. Ou seja, uma “presunção de ilicitude” que seria aplicável a todos os envolvidos, desimportando qual polo da relação jurídica eles viessem a ocupar.

No Parecer Nomativo COSIT/RFB n. 4, de 10 de dezembro de 2018, a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB) deu exemplos de casos em que essa “presunção de ilicitude” seria aplicável: (a) formação de grupo econômico irregular, através do abuso da personalidade jurídica; (b) simulação, evasão tributária e demais atos deles decorrentes; e (iii) abuso da personalidade jurídica com o intuito de suprimir ou reduzir tributos, mediante manipulação artificial do fato gerador (planejamento tributário abusivo).

A partir desta premissa, entendemos que o fato de que a Consulente, no mínimo, suspeite que cliente(s) interponha(m), ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica) para evadir o cumprimento de obrigações tributárias, decorrentes da venda (posterior) das mercadorias (ovos), pode levar a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB) a presumir a ocorrência da ilicitude, decorrente da sua participação omissiva, mas consciente, na configuração do ato ilícito (interposição fictícia de pessoa física ou jurídica), em prejuízo à administração tributária.

Ante ao exposto, o risco de a Consulente ser responsabilizada solidariamente por créditos tributários devidos por cliente(s) que interpõe(m), ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica), para evadir o cumprimento de obrigações tributárias, decorrentes da venda (posterior) das mercadorias (ovos), é baixo, à luz da jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Em que pese possuírem interesses coincidentes, no que diz respeito à sua realização, o vendedor e o comprador, no contrato de compra e venda, têm interesses contrapostos, no que diz respeito à sua execução ([8]). Por isso, o vendedor, a rigor, não participaria, em tese, com o comprador, da situação jurídica que configura o fato gerador da obrigação principal, caso o comprador interpusesse, ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica), para evadir o seu cumprimento, na(s) operação(ões) posterior(es).

Este risco, porém, é médio, se levarmos em consideração o ponto de vista (interpretativo) da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB), que diverge do entendimento firmado não só pela jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), mas também pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Conforme este ponto de vista (interpretativo), o fato de que a Consulente, no mínimo, suspeite que cliente(s) interponha(m), ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica) para evadir o cumprimento de obrigações tributárias, decorrentes da venda (posterior) das mercadorias (ovos), pode levar a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB) a presumir a ocorrência da ilicitude, decorrente da sua participação omissiva, mas consciente, na configuração do ato ilícito (interposição fictícia de pessoa física ou jurídica), em prejuízo à administração tributária.

Responsabilizada, solidariamente, por créditos tributários devidos por cliente(s) que interpõe(m), ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica), para evadir o cumprimento de obrigações tributárias, decorrentes da venda (posterior) das mercadorias (ovos), a isenção do ICMS na saída interna de ovo in natura, prevista pelo Item 12.h do Anexo I do RICMS/MG ([9]), e a alíquota 0 (zero) do PIS e COFINS incidentes sobre a receita bruta decorrente da venda, no mercado interno, de ovos, prevista pelo art. 28, III, da Lei n. 10.865, de 320 de abril de 2004 ([10]), exonerariam a (respectiva) responsabilidade solidária da Consulente, conforme o art. 125, II, do Código Tributário Nacional (CTN) (“Art. 125. Salvo disposição de lei em contrário, são os seguintes os efeitos da solidariedade: […] II – a isenção ou remissão de crédito exonera todos os obrigados, salvo se outorgada pessoalmente a um dêles, subsistindo, nesse caso, a solidariedade quanto aos demais pelo saldo“).

S.m.j., é o parecer.

_________________________________

([1])             Engisch, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 9 ed. Tradução de João Batista Machado. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, p. 208.

([2])             Engisch, op. cit., p. 219-22.

([3])             CARF, Processo n. 13896.721547/2013-80, Acordão n. 1402-002.143, relatoria do Conselheiro Frederico Augusto Gomes de Alencar, publicado em 23/02/2017; CARF, Processo n. 19311.720512/2013-33, Acórdão n. 1201-002.082, relatoria da Conselheira Gisele Barra Bossa, publicado em 17/04/2018; CARF, Processo n. 19311.720512/2013-33, Acórdão n. 1301-006.134, relatoria do Conselheiro José Eduardo Dornelas Souza, publicado em 02/01/2023. 13896.721547/2013-80.

([4])             REsp 834.044/RS, STJ, T1, Rel.ª Min.ª Denise Arruda, vu, j. 11/11/2008, DJe 15/12/2008.

([5])             REsp 859.616/RS, STJ, T1, Rel. Min. Luiz Fux, vu, j. 18/09/2007, DJ 15/10/2007, p. 240.

([6])             REsp 859.616/RS, STJ, T1, Rel. Min. Luiz Fux, vu, j. 18/09/2007, DJ 15/10/2007, p. 240.

([7])             Schoueri, Luís Eduardo. Direito Tributário. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 503

([8])             Schoueri, 2012, p. 503.

([9])             “Item 12: Saída, em operação interna ou interestadual, dos seguintes produtos, em estado natural:[…] h) ovo, exceto o fértil”.

([10])            “Art. 28. Ficam reduzidas a 0 (zero) as alíquotas da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS incidentes sobre a receita bruta decorrente da venda, no mercado interno, de: […] III – produtos hortícolas e frutas, classificados nos Capítulos 7 e 8, e ovos, classificados na posição 04.07, todos da TIPI”.

Análise Jurídico-Contábil das Retificações das Obrigações Tributárias Acessórias (EFD ICMS IPI e GIA), Após a Notificação do Auto de Lançamento (AL) n. (…), Formalizado pela Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul, em (…)

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Arthur Rocha Benevides Magalhães

Diego Galbinski

1 Considerações Iniciais. Empresa X (“Consulente”), na pessoa do seu ilustre advogado, Dr. Y, requer sejam analisadas as retificações das obrigações tributárias acessórias (EFD ICMS IPI e GIA) que teriam sido transmitidas após a notificação do Auto de Lançamento (AL) n. (…) (“lançamento tributário”), formalizado pela Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul, em 22/06/2023, para desconstituir, no mínimo, parcialmente, o crédito tributário, no valor de R$ 6.332.331,43, a título de ICMS (R$ 3.620.785,67), Multa (R$ 2.172.471,23) e Juros (R$ 539.074,53).

1.2         Do ponto de vista da Consulente, as retificações das obrigações tributárias acessórias (EFD ICMS IPI e GIA), por razões do princípio da verdade material, deveriam ter sido consideradas pela autoridade julgadora de primeira instância, quando julgou procedente o lançamento tributário, a despeito de o § 1.º do art. 147 do Código Tributário Nacional (CTN) enunciar que “A retificação da declaração por iniciativa do próprio declarante, que vise a reduzir ou a excluir tributo, só é admissível mediante comprovação do erro em que se funde, e antes de notificado o lançamento”.

1.3         A partir desta premissa, precluída a r. decisão administrativa que julgou procedente o lançamento tributário, cogita discutir, judicialmente, o crédito tributário, através da propositura de ação anulatória de débito fiscal (Lei n. 6.830, de 22 de setembro de 1980, Art. 38) ([1]). Para instruir a petição inicial, solicita, então, a análise não apenas jurídica, mas também contábil das retificações das obrigações tributárias acessórias (EFD ICMS IPI e GIA), a fim de que sejam averiguadas as operações de saída (débitos de ICMS), as operações de entrada (créditos de ICMS) e os seus registros nas obrigações tributárias  acessórias retificadas (EFD ICMS IPI e GIA), nos períodos de apuração de 09/2019 a 03/2023 (“período-base”).

2 Das Retificações das Obrigações Tributárias Acessórias (EFD ICMS IPI e GIA). Extraídos os arquivos originais e retificados do Programa ReceitaNetBX, em 29/12/2023, identificamos que a Consulente, com relação ao período-base, transmitiu 9 (nove) arquivos retificados, nas datas a seguir descriminadas:

Competência

Original

Retificadora

09/2019

15/10/2019

08/02/2023

10/2019

14/11/2019

08/02/2023

11/2019

13/12/2019

08/02/2023

12/2019

14/01/2020

08/02/2023

03/2020

15/04/2020

28/01/2021

10/2020

16/11/2020

17/06/2021

11/2020

15/12/2020

11/02/2021

12/2020

15/01/2021

01/02/2021

12/2021

14/01/2022

28/03/2022

 

2.1       Portanto, carece de base factual a informação prestada pela Consulente de que após a notificação do lançamento tributário teriam sido retificadas as obrigações tributárias acessórias (EFD ICMS IPI e GIA) relativas ao período-base.

2.2       Logo, além de confirmarmos as infrações à legislação tributária  que foram apontadas pelo lançamento tributário, verificamos, no período-base, outras irregularidades praticadas pela Consulente, que serão demonstradas a seguir.

3 Débitos de ICMS Não Escriturados na EFD ICMS IPI. Assim como o lançamento tributário, constatamos que a Consulente não escriturou na EFD ICMS IPI inúmeros documentos fiscais de saída que foram emitidos no período-base.

 3.1       Porém, ao conciliarmos os períodos de apuração nos quais não foram escrituradas operações com incidência do imposto, constatamos que o ICMS debitado não escriturado no período-base perfaz o valor de R$ 4.200.984,84, em vez do montante de R$ 3.368.944,30 que foi calculado pelo lançamento tributário.

3.2       São estes os períodos de apuração em que a Consulente não escriturou débitos de ICMS na EFD ICMS IPI (Registro E110): 01/2020, 04/2020, 05/2020, 06/2020, 07/2020, 09/2020, 02/2021, 03/2021, 04/2021, 05/2021, 06/2021, 08/2021, 10/2021, 11/2021, 02/2022, 03/2022, 04/2022, 05/2022, 07/2022 e 08/2022.

4 Operações de Saída Escrituradas com CFOP de Operação Não Especificada (5.949/6.949) Sem o Destaque do Imposto. Além disso, averiguamos que determinadas operações de saída praticadas pela Consulente, no período-base, foram codificadas com o CFOP 5.949/6.949 sem o destaque do imposto.

4.1         Entretanto, a emissão de documentos fiscais com o CFOP (de saída) 5.949/6.949 diz respeito a outros tipos de operações sem especificação definida, que estão sujeitos à incidência do ICMS.

4.2         No período-base, o ICMS devido por operações de saída escrituradas com CFOP de operação não especificada (5.949/6.949) equivale à quantia de R$ 310.736,86. Esse valor também não foi reconhecido pelo lançamento tributário, nos débitos de ICMS não informados em GIA no período-base, quando ele calculou o montante do tributo devido pela Consulente.

5 Créditos de ICMS Não Escriturados na EFD ICMS IPI. Por outro lado, a partir dos arquivos .xml que dizem respeito às operações de entrada (créditos de ICMS), identificamos que a Consulente, no período-base, não escriturou na EFD ICMS IPI créditos de ICMS, no montante de R$ 31.958,59.

5.1         Embora não tenham sido escriturados pela Consulente na EFD ICMS IPI, esses créditos de ICMS deveriam ter sido admitidos pelo lançamento tributário para o cálculo do montante do tributo devido, por força do princípio da não-cumulatividade, previsto pelo art. 155, § 2.º, I, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988 ([2]), e pelo art. 19 da Lei Complementar n. 87, de 13 de setembro de 1996 ([3]).

6 Créditos de ICMS não informados na GIA. Igualmente, averiguamos que o lançamento tributário não admitiu créditos de ICMS escriturados pela Consulente na EFD ICMS IPI com relação ao período-base, equivalentes à quantia de R$ 832.996,97.

6.1         Esse valor é o resultado da subtração entre o total dos créditos idôneos de ICMS escriturados pela Consulente na EFD ICMS IPI (R$ 1.417.504,68) e o total dos créditos de ICMS admitidos pelo lançamento tributário para o cálculo do montante do tributo devido pela Consulente (R$ 584.507,71), durante o período-base.

6.2         Validamos o total dos créditos idôneos de ICMS escriturados pela Consulente na EFD ICMS IPI (R$ 1.417.504,68) no período-base, com base em relevância de fornecedores, descrição de produtos, NCM, CFOP e Código de Situação Tributária, à luz do art. 31 do Livro I do RICMS/RS. Para o seu cálculo, excluímos os créditos inidôneos de ICMS escriturados pela Consulente na EFD ICMS IPI no período-base, relativos à aquisição de bens alheios à atividade-fim, como uniformes, refeições e almoços, no valor de R$ 175.165,78 (em vez do montante de R$ 168.815,92 que não foi admitido pelo lançamento tributário).

6.2         Apesar de não terem sido lançados pela Consulente na GIA, esses créditos de ICMS também deveriam ter sido admitidos pelo lançamento tributário para o cálculo do montante do tributo devido, por força do princípio da não-cumulatividade, previsto pelo art. 155, § 2.º, I, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, e pelo art. 19 da Lei Complementar n. 87, de 13 de setembro de 1996.

7 Considerações Finais. Portanto, carece de base factual a informação que foi prestada pela Consulente de que após a notificação do lançamento tributário teriam sido retificadas as obrigações tributárias acessórias (EFD ICMS IPI e GIA) relativas ao período-base.

7.1         Logo, além de confirmarmos as infrações à legislação tributária  que foram apontadas pelo lançamento tributário, verificamos que a Consulente praticou outras irregularidades no período-base, a saber:

7.1.1      Débitos de ICMS não escriturados na EFD ICMS IPI, no valor de R$ 4.200.984,84 (em vez do montante de R$ 3.368.944,30 que foi calculado pelo lançamento tributário); e

7.1.2      Operações de saída escrituradas com CFOP de operação não especificada (5.949/6.949) sem o destaque do imposto, no valor de R$ 310.736,86.

7.2         Por outro lado, verificamos que o lançamento tributário não admitiu para o cálculo do montante do tributo devido no período-base os seguintes créditos de ICMS, em desrespeito ao princípio da não-cumulatividade (Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, Art. 155, § 2.º, I; Lei Complementar n. 87, de 13 de setembro de 1996, Art. 19):

7.2.1      Créditos de ICMS não escriturados na EFD ICMS IPI, no valor de R$ 31.958,59; e

7.2.2      Créditos de ICMS não informados na GIA, no valor de R$ 832.996,97.

7.3         Esse valor (R$ 832.996,97) é o resultado da subtração entre o total dos créditos idôneos de ICMS escriturados pela Consulente na EFD ICMS IPI (R$ 1.417.504,68) e o total dos créditos de ICMS admitidos pelo lançamento tributário para o cálculo do montante do tributo devido pela Consulente (R$ 584.507,71), no período-base.

7.4         Como a Consulente transmitiu diversos arquivos EFD ICMS IPI com omissão de informações ou informações incorretas, ela também estava sujeita à aplicação de multa por infração formal à legislação tributária, equivalente a 1% (um por cento) do valor das respectivas operações, conforme o art. 11, IV, 2, da Lei n. 6.537, de 27 de fevereiro de 1973, que dispõe o seguinte:

Art. 11 – Pela prática das infrações tributárias formais a seguir enumeradas, são cominadas as seguintes multas:

[…]

IV – infrações relativas a informações devidas por contribuintes:

[…]
  1. h) em relação à Escrituração Fiscal Digital – EFD:
[…]

2 – omitir informações ou prestar informações incorretas: multa de 1% do valor das respectivas operações ou prestações, não inferior a 120 UPF-RS.

7.5         Visto que o resultado da soma das operações omitidas ou informadas incorretamente pela Consulente é de R$ 52.000.000,00, a Consulente também estava sujeita à multa por infração formal da legislação tributária, prevista pelo art. 11, IV, 2, da Lei n. 6.537, de 27 de fevereiro de 1973, equivalente à quantia de R$ 520.000,00, que não foi aplicada pelo lançamento tributário.

7.6         Por fim, alertamos que a escrituração fiscal da Consulente é frágil e suscetível a outras autuações. Ao longo deste trabalho, identificamos, por exemplo, bens escriturados como insumos que não têm qualquer relação com as atividades econômicas exercidas pela Consulente. A título meramente ilustrativo, no dia 12/12/2019, foi emitida pelo fornecedor RI HAPPY BRINQUEDOS S.A. nota fiscal de venda de brinquedos, que foram escriturados pela Consulente com o CFOP 1.101, designado para matérias-primas, embalagens e produtos intermediários.

7.7         Ante ao exposto, precluída a r. decisão administrativa que julgou procedente o lançamento tributário, a Consulente poderá discutir, judicialmente, o crédito tributário, através da propositura de ação anulatória de débito fiscal, apenas a fim de que sejam admitidos para o cálculo do montante do tributo devido no período-base os seguintes créditos de ICMS:

7.7.1      Créditos de ICMS não escriturados na EFD ICMS IPI, no valor de R$ 31.958,59; e

7.7.2      Créditos de ICMS não informados na GIA, no valor de R$ 832.996,97.

7.8         Caso o pedido seja julgado procedente, o crédito tributário será diminuído para o valor (aproximado) de R$ 4.819.625,26, a título de ICMS (R$ 2.755.830,11), Multa (R$ 1.653.498,07) e Juros (R$ 410.297,08). Em outras palavras, o crédito tributário que foi constituído pelo lançamento tributário será reduzido em R$ 1.512.706,17. O êxito, porém, é possível, mas não provável.

S.m.j., é o parecer.

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([1])             “Art. 38. A discussão judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública só é admissível em execução, na forma desta Lei, salvo as hipóteses de mandado de segurança, ação de repetição do indébito ou ação anulatória do ato declarativo da dívida, esta precedida do depósito preparatório do valor do débito, monetariamente corrigido e acrescido dos juros e multa de mora e demais encargos. Parágrafo único. A propositura, pelo contribuinte, da ação prevista neste artigo importa em renúncia ao poder de recorrer na esfera administrativa e desistência do recurso acaso interposto.”

([2])             “Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: […] § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: I – será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal”.

([3])             “Art. 19. O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado.”

Responsabilidade Tributária Solidária. Interesse Comum. Código Tributário Nacional (CTN), Art. 124, I

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Prezado(s) Senhor(es)

1. Companhia Y (“Consulente”), na pessoa da sua Gerente de Controladoria, Sr.ª X, formula consulta a respeito da análise do risco (baixo, médio ou alto) de responsabilidade tributária solidária, com relação a créditos tributários devidos por cliente(s) que interpõe(m), ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica), a fim de evadir o cumprimento de obrigações tributárias, decorrentes da venda (posterior) das mercadorias (ovos).

2. Quanto à responsabilidade tributária solidária, dispõe o Código Tributário Nacional (CTN), no seu art. 124, o seguinte:

Art. 124. São solidariamente obrigadas:
I – as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal;
II – as pessoas expressamente designadas por lei.
Parágrafo único. A solidariedade referida neste artigo não comporta benefício de ordem.

2.1 Conforme este enunciado normativo, são solidariamente obrigadas ao crédito tributário (a) as pessoas expressamente designadas por lei (CTN, Art. 124, II) e (b) as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal (CTN, Art. 124, I).

2.2 No que diz respeito à definição do conceito de interesse comum, que enucleia o suporte fático da responsabilidade tributária solidária, previsto pelo inciso I do art. 124 do Código Tributário Nacional (CTN), por se tratar de um conceito indeterminado, cuja extensão de significado é incerta ( ¹ ), tem o intérprete certa dose de discricionariedade para escolher qual é o melhor sentido, à luz das circunstâncias do caso concreto ( ² ).

3. Quando enfrentou situações de fato semelhantes, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) ( ³ ) concluiu que o interesse comum a que se refere o art. 124, I, do Código Tributário Nacional (CTN) não se confundiria com interesse econômico, na medida em que o interesse comum exigiria do contribuinte e do (eventual) responsável solidário que participassem “conjuntamente da situação que configura o fato gerador, sendo irrelevante a simples participação nos lucros eventualmente obtidos pela outra empresa coligada ou do mesmo grupo econômico” ( ⁴ )

3.1 Em outras palavras, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) decidiu que a presença do interesse comum pressuporia que as pessoas solidariamente obrigadas (o contribuinte e o – eventual – responsável solidário) ocupassem o mesmo polo da relação jurídica que causou a ocorrência da situação definida em lei como fato gerador da obrigação principal. Caso contrário, não haveria interesse comum na situação que constitui o fato gerador da obrigação principal, previsto pelo inciso I do art. 124 do Código Tributário Nacional (CTN) como suporte fático da responsabilidade tributária solidária.

4. Este sentido também é atribuído pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para a definição do conceito de interesse comum utilizado pelo inciso I do art. 124 do Código Tributário Nacional (CTN). No REsp n. 859.616/RS, confirmado, posteriormente, pelo EREsp 859.616/RS, julgado pela 1.ª Seção, a 1.ª Turma decidiu que não existiria interesse comum na situação de fato que constitui o fato gerador da obrigação principal toda vez que o contribuinte e o (eventual) responsável solidário ocupassem posições (jurídicas) contrapostas e tivessem objetivos antagônicos ( ⁵ ).

4.1 No seu voto condutor, o relator, Min. Luiz Fux, desenvolveu a seguinte ordem de considerações a respeito da questão:

A solidariedade passiva é um instituto de direito civil aplicável a todos os ramos do direito, segundo o qual, em havendo pluralidade de sujeitos no pólo passivo de uma relação jurídica, cada um deles é obrigado à dívida toda, podendo o credor exigir de um ou alguns, parcial ou totalmente, a dívida em comum.
Com efeito, em matéria tributária, a presunção de solidariedade opera inversamente àquela do direito civil, no sentido de que sempre que, numa mesma relação jurídica, houver duas ou mais pessoas caracterizadas como contribuinte, cada uma delas estará obrigada pelo pagamento integral da dívida, perfazendo-se o instituto da solidariedade passiva. Ad exemplum, no caso de duas ou mais pessoas serem proprietárias de um mesmo imóvel urbano, haveria uma pluralidade de contribuintes solidários quanto ao adimplemento do IPTU, uma vez que a situação de fato – a co-propriedade – é-lhes comum.
[…] Nesse segmento, conquanto a expressão “interesse comum” – encarte um conceito indeterminado, é mister proceder-se a uma interpretação sistemática das normas tributárias, de modo a alcançar a ratio essendi do referido dispositivo legal.
Nesse diapasão, tem-se que o interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal implica que as pessoas solidariamente obrigadas sejam sujeitos da relação jurídica que deu azo à ocorrência do fato imponível. Isto porque feriria a lógica jurídico-tributária a integração, no pólo passivo da relação jurídica, de alguém que não tenha tido qualquer participação na ocorrência do fato gerador da obrigação.
[…] Destarte, a situação que evidencia a solidariedade, no condizente ao ISS, é a existência de duas ou mais pessoas na condição de prestadoras de apenas um único serviço para o mesmo tomador, integrando, desse modo, o pólo passivo da relação. Forçoso concluir, portanto, que o interesse qualificado pela lei não há de ser o interesse econômico no resultado ou no proveito da situação que constitui o fato gerador da obrigação principal, mas o interesse jurídico, vinculado à atuação comum ou conjunta da situação que constitui o fato imponível ( ⁶ ).

5. Portanto, à luz da jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), podemos concluir que o risco de a Consulente ser responsabilizada solidariamente por créditos tributários devidos por cliente(s) que interpõe(m), ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica), para evadir o cumprimento de obrigações tributárias, decorrentes da venda (posterior) das mercadorias (ovos), é baixo.

5.1 Em que pese possuírem interesses coincidentes, no que diz respeito à sua realização, o vendedor e o comprador, no contrato de compra e venda, têm interesses contrapostos, no que diz respeito à sua execução ( ⁷ ). Por isso, o vendedor, a rigor, não participaria, em tese, com o comprador, da situação jurídica que configura o fato gerador da obrigação principal, caso o comprador interpusesse, ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica), para evadir o seu cumprimento, na(s) operação(ões) posterior(es).

6. Este risco, porém, é médio, caso levarmos em consideração o ponto de vista (interpretativo) da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB), que diverge do entendimento firmado não só pela jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), mas também pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

6.1 A respeito da definição do conceito de interesse comum, o Parecer Normativo COSIT/RFB n. 4, de 10 de dezembro de 2018, firmou a posição de que significaria o “interesse comum da pessoa responsabilizada na situação vinculada ao fato jurídico tributário, que pode ser tanto o ato lícito que gerou a obrigação tributária como o ilícito que a desfigurou” (grifou-se).

6.2 Conforme este ponto de vista (interpretativo), a responsabilidade tributária solidária poderia recair tanto sobre aqueles que atuam diretamente, realizando atos que, individualmente ou em conjunto com outros, levam à situação que configura o fato gerador, quanto sobre aqueles que estão ativamente envolvidos no ato, fato ou negócio que deu origem ao evento tributário, por meio da prática de atos ilícitos que o manipularam.

6.3 O interesse comum só seria sinônimo de interesse jurídico nos casos em que se estivesse a tratar de negócio jurídico lícito. Por outro lado, nos casos em que se estivesse a tratar de ato ilícito, haveria, presumivelmente, uma comunhão entre as partes, visando à lesão da administração tributária. Ou seja, uma “presunção de ilicitude” que seria aplicável a todos os envolvidos, desimportando qual polo da relação jurídica eles viessem a ocupar.

6.4 No Parecer Nomativo COSIT/RFB n. 4, de 10 de dezembro de 2018, a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB) deu exemplos de casos em que essa “presunção de ilicitude” seria aplicável: (a) formação de grupo econômico irregular, através do abuso da personalidade jurídica; (b) simulação, evasão tributária e demais atos deles decorrentes; e (iii) abuso da personalidade jurídica com o intuito de suprimir ou reduzir tributos, mediante manipulação artificial do fato gerador (planejamento tributário abusivo).

6.5 A partir desta premissa, entendemos que o fato de que a Consulente, no mínimo, suspeite que cliente(s) interponha(m), ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica) para evadir o cumprimento de obrigações tributárias, decorrentes da venda (posterior) das mercadorias (ovos), pode levar a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB) a presumir a ocorrência da ilicitude, decorrente da sua participação omissiva, mas consciente, na configuração do ato ilícito (interposição fictícia de pessoa física ou jurídica), em prejuízo à administração tributária.

7. Ante ao exposto, o risco de a Consulente ser responsabilizada solidariamente por créditos tributários devidos por cliente(s) que interpõe(m), ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica), para evadir o cumprimento de obrigações tributárias, decorrentes da venda (posterior) das mercadorias (ovos), é baixo, à luz da jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

7.1 Em que pese possuírem interesses coincidentes, no que diz respeito à sua realização, o vendedor e o comprador, no contrato de compra e venda, têm interesses contrapostos, no que diz respeito à sua execução ( ⁸ ). Por isso, o vendedor, a rigor, não participaria, em tese, com o comprador, da situação jurídica que configura o fato gerador da obrigação principal, caso o comprador interpusesse, ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica), para evadir o seu cumprimento, na(s) operação(ões) posterior(es).

7.2 Este risco, porém, é médio, caso levarmos em consideração o ponto de vista (interpretativo) da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB), que diverge do entendimento firmado não só pela jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), mas também pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

7.3 Conforme este ponto de vista (interpretativo), o fato de que a Consulente, no mínimo, suspeite que cliente(s) interponha(m), ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica) para evadir o cumprimento de obrigações tributárias, decorrentes da venda (posterior) das mercadorias (ovos), pode levar a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB) a presumir a ocorrência da ilicitude, decorrente da sua participação omissiva, mas consciente, na configuração do ato ilícito (interposição fictícia de pessoa física ou jurídica), em prejuízo à administração tributária.

7.4 Responsabilizada, solidariamente, por créditos tributários devidos por cliente(s) que interpõe(m), ficticiamente, pessoa(s) (física ou jurídica), para evadir o cumprimento de obrigações tributárias, decorrentes da venda (posterior) das mercadorias (ovos), a isenção do ICMS na saída interna de ovo in natura, prevista pelo Item 12.h do Anexo I do RICMS/MG ( ⁹ ), e a alíquota 0 (zero) do PIS e COFINS incidentes sobre a receita bruta decorrente da venda, no mercado interno, de ovos, prevista pelo art. 28, III, da Lei n. 10.865, de 320 de abril de 2004 ( ¹⁰ ), exonerariam a (respectiva) responsabilidade solidária da Consulente, conforme o art. 125, II, do Código Tributário Nacional (CTN) (“Art. 125. Salvo disposição de lei em contrário, são os seguintes os efeitos da solidariedade: […] II – a isenção ou remissão de crédito exonera todos os obrigados, salvo se outorgada pessoalmente a um dêles, subsistindo, nesse caso, a solidariedade quanto aos demais pelo saldo“).

S.m.j., é o parecer.

 

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( ¹ ) ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 9 ed. Tradução de João Batista Machado. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, p. 208.

( ² ) ENGISCH, op. cit., p. 219-22.

( ³ ) CARF, Processo n. 13896.721547/2013-80, Acordão n. 1402-002.143, relatoria do Conselheiro Frederico Augusto Gomes de Alencar, publicado em 23/02/2017; CARF, Processo n. 19311.720512/2013-33, Acórdão n. 1201-002.082, relatoria da Conselheira Gisele Barra Bossa, publicado em 17/04/2018; CARF, Processo n. 19311.720512/2013-33, Acórdão n. 1301-006.134, relatoria do Conselheiro José Eduardo Dornelas Souza, publicado em 02/01/2023. 13896.721547/2013-80.

( ⁴ ) REsp 834.044/RS, STJ, T1, Rel.ª Min.ª Denise Arruda, vu, j. 11/11/2008, DJe 15/12/2008.

( ⁵  ) REsp 859.616/RS, STJ, T1, Rel. Min. Luiz Fux, vu, j. 18/09/2007, DJ 15/10/2007, p. 240.

( ⁶ ) REsp 859.616/RS, STJ, T1, Rel. Min. Luiz Fux, vu, j. 18/09/2007, DJ 15/10/2007, p. 240.

( ⁷ ) SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 503

( ⁸ ) SCHOUERI, 2012, p. 503.

( ⁹ ) “Item 12: Saída, em operação interna ou interestadual, dos seguintes produtos, em estado natural:[…] h) ovo, exceto o fértil”.

( ¹⁰ ) “Art. 28. Ficam reduzidas a 0 (zero) as alíquotas da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS incidentes sobre a receita bruta decorrente da venda, no mercado interno, de: […] III – produtos hortícolas e frutas, classificados nos Capítulos 7 e 8, e ovos, classificados na posição 04.07, todos da TIPI”

 

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