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CREDITAMENTO OU PAGAMENTO DOS JUROS SOBRE O CAPITAL PRÓPRIO. ÓRGÃO COMPETENTE PARA DELIBERAÇÃO. DEVER DE PAGAMENTO PROPORCIONAL À PARTICIPAÇÃO DE CADA CLASSE E ESPÉCIE DE AÇÕES NO CAPITAL SOCIAL

Prezado(a) Senhor(a),

Na presente opinião legal, responderemos às seguintes consultas formuladas por Companhia X:

(i) Qual é o órgão da sociedade anônima competente para deliberar a respeito do  creditamento ou pagamento dos juros sobre capital próprio?

(ii) O creditamento ou pagamento dos juros sobre o capital próprio deve ser realizado conforme a proporção da participação de cada classe e espécie de ações no capital social?

I.

Para respondermos à primeira consulta, partiremos da premissa de que os juros sobre o capital próprio, à semelhança dos dividendos, são uma espécie de remuneração do capital subscrito e integralizado pelos sócios ou acionistas. Na Deliberação n. 207, de 13 de dezembro de 1996, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) concluiu que “os juros pagos ou creditados […], a título de remuneração do capital próprio, na forma do artigo 9.º da Lei n. 9.249/95, devem ser contabilizados diretamente à conta de lucros acumulados, sem afetar o resultado(grifou-se). 

Por ser uma destinação de parte do resultado apurado num determinado exercício social, o órgão competente para deliberar a respeito do creditamento ou pagamento dos juros sobre o capital próprio é o mesmo órgão competente para deliberar sobre a destinação do lucro líquido do exercício e a distribuição de dividendos: a assembleia geral. A propósito, dispõe o art. 122,  I, da Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que “Compete privativamente à assembleia geral […] tomar, anualmente, as contas dos administradores e deliberar sobre as demonstrações financeiras por ele apresentadas(grifou-se).

Com relação às demonstrações financeiras, a assembleia geral deve se reunir, anualmente, nos 4 (quatro) primeiros meses seguintes ao término do exercício social, “para deliberar sobre a destinação do lucro líquido do exercício e a distribuição de dividendos” (Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976, de 15 de dezembro de 1976, Art. 132, II).

Aparentemente, porém, o Estatuto Social da Companhia X, no inciso III do art. XVII, prevê que “Compete à Diretoria […] submeter, anualmente, à apreciação do Conselho de Administração […] a proposta de destinação dos lucros apurados no exercício social”. De igual modo, o inciso IV do art. XIV do Estatuto Social da Companhia X dispõe que “Compete ao Conselho de Administração […] manifestar-se sobre […] a proposta de destinação do resultado do exercício.

Todavia, o inciso III do art. XVII e o inciso IV do art. XIV do Estatuto Social da Companhia X, que atribuem, à primeira vista, ao conselho de administração a competência para deliberar sobre a proposta de destinação do resultado do exercício apresentada pela diretoria, devem ser interpretados à luz dos arts. 122, I, e 132, II, da Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que outorgam à assembleia geral a competência privativa para deliberar sobre a destinação do lucro líquido do exercício e a distribuição dos dividendos. Nas palavras de Nelson Eizirik, “a Lei das S.A. elencou expressamente […] as principais atribuições da assembleia geral, estabelecendo um elenco de matérias  cuja competência para deliberação é privativa de tal órgão” (). Por se tratar de competência privativa, “é ilegal qualquer dispositivo do estatuto social que disponha em sentido”(1).

De acordo com esta interpretação, competiria apenas ao conselho de administração submeter à aprovação da assembleia geral a proposta de destinação do resultado do exercício apresentada pela diretoria, nos termos do art. 176, II, § 3º (), e art. 192 () da Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Caso contrário, o conselho de administração invadiria a competência privativa da assembleia geral para deliberar sobre a destinação do lucro líquido do exercício e a distribuição dos dividendos, prevista pelos arts. 122, I, e 132, II, da Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976. 

Portanto, a assembleia geral é o órgão da sociedade anônima competente para deliberar a respeito do creditamento ou pagamento dos juros sobre capital próprio, conforme os arts. 122, I, e 132, II, da Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976. A ata da assembleia geral que deliberar a respeito do creditamento ou pagamento dos juros sobre o capital próprio deve ser arquivada e publicada, a teor do art. 134, § 5.º, da Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976().

II.

A exemplo da resposta à primeira consulta, a resposta à segunda consulta repousa sobre a premissa de que os juros sobre o capital próprio são uma espécie de remuneração do capital subscrito e integralizado pelos sócios ou acionistas. Por ser uma destinação de parte do resultado apurado num determinado exercício social, os juros sobre o capital próprio devem ser creditados ou pagos proporcionalmente à participação de cada classe e espécie de ações no capital social().

Por exemplo, se a Companhia X deliberar a favor do pagamento de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), a título de juros sobre capital próprio, então deverá pagar proporcionalmente à participação de cada classe e espécie de ações no capital social:

 

Ações Total % JCP

(R$)

Pref. A 250 25% 250.000,00
Pref. B 250 25% 250.000,00
Ord. 500 50% 500.000,00
Total 1.000 100% 1.000.000,00

 

Caso os juros sobre o capital próprio sejam creditados ou pagos desproporcionalmente à participação de cada classe e espécie de ações no capital social, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) entende que não são dedutíveis para a apuração do lucro real, como ilustram os seguintes precedentes:

“JUROS SOBRE O CAPITAL PRÓPRIO. PAGAMENTO DESPROPORCIONAL À PARTICIPAÇÃO NO CAPITAL SOCIAL. Os juros sobre capital próprio que são dedutíveis na apuração do resultado tributável são somente os que são pagos ou creditados individualizadamente a cada titular, sócio ou acionista a título de remuneração do capital. Não se enquadram como tal e são indedutíveis os juros pagos ou creditados que excederem ao que beneficiário teria direito de acordo com sua participação no capital social da empresa.”()

“JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO, NATUREZA JURÍDICA DE DESPESA FINANCEIRA. PAGAMENTO DESPROPORCIONAL À PARTICIPAÇÃO DO SÓCIO NO CAPITAL SOCIAL. A natureza jurídica dos Juros Sobre Capital Próprio é de despesa financeira para a empresa e de receita para o sócio beneficiário. Os valores pagos ou creditados aos sócios a título de Juros Sobre Capital Próprio, além do que lhes seria devido pela aplicação do percentual correspondente a participação de cada um no capital social, devem sofrer a tributação mais onerosa.”()

Portanto, os juros sobre o capital próprio devem ser creditados ou pagos proporcionalmente à participação de cada classe e espécie de ações no capital social. Caso contrário, não são edutíveis para a apuração do lucro real, de acordo com a jurisprudência do CARF.

III.

Ante ao exposto, nossas respostas às consultas formuladas por Companhia X são as seguintes: 

(i) A assembleia geral é o órgão da sociedade anônima competente para deliberar a respeito do creditamento ou pagamento dos juros sobre capital próprio;

(ii) O creditamento ou pagamento dos juros sobre o capital próprio deve ser realizado conforme a proporção da participação de cada classe e espécie de ações no capital social.

 

S.m.j., é a opinião legal.

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