Dada a deliberação dos sócios que representam 75% (setenta e cinco por cento) do capital social a favor do distrato da Sociedade Limitada X, foi proposta a devolução do capital social, equivalente à quantia de R$ 16.069.560,00 (dezesseis milhões e sessenta e nove mil e quinhentos e sessenta reais), por meio da cessão aos sócios de 13.568.136 (treze milhões e quinhentas e sessenta e oito mil e cento e trinta e seis) ações ordinárias nominativas, sem valor nominal, da Sociedade Anônima Y, avaliadas contabilmente em R$ 94.678.208,90 (noventa e quatro milhões e seiscentos e setenta e oito mil e duzentos e oito reais e noventa centavos), e do direito de crédito, a título de dividendos a receber, no valor de R$ 5.269.000,00 (cinco milhões e duzentos e sessenta e nove mil reais), devidos por Sociedade Anônima Y.
De acordo com o último balancete levantado, a proposta de devolução do capital social de Sociedade Limitada X não implicaria o auferimento de ganho de capital tributável por parte de seus sócios, porque o valor do seu patrimônio líquido seria de R$ 99.974.840,00 (noventa e nove milhões e novecentos e setenta e quatro mil e oitocentos e quarenta reais), sendo R$ 16.069.560,00 (dezesseis milhões e sessenta e nove mil e quinhentos e sessenta reais), a título de capital social, e R$ 83.905.280,00 (oitenta e três milhões e novecentos e cinco mil e duzentos e oito reais), a título de reserva de lucros.
Todavia, a despeito da isenção dos lucros ou dividendos, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, prevista pelo art. 10, caput, da Lei n. 9.249, de 26 de dezembro de 1995 ([1]), foi levantada a hipótese de que a proposta de devolução do capital social de Sociedade Limitada X implicaria o auferimento de ganho de capital tributável por parte de seus sócios, sob o argumento de que o valor de R$ 83.905.280,00 (oitenta e três milhões e novecentos e cinco mil e duzentos e oitenta reais), registrado no patrimônio líquido de Sociedade Limitada X, a título de reserva de lucros, decorreria da contrapartida do ajuste do valor do investimento, avaliado pelo método de equivalência patrimonial, em Sociedade Anônima Y. No Acórdão n. 9202-003.700, a 2. Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) teria decidido que a capitalização da reserva de lucros decorrente de receita de equivalência patrimonial reduziria artificialmente a base de cálculo do imposto de renda incidente sobre o ganho de capital auferido na alienação de participação societária.
Com relação à questão levantada, o dever de a Sociedade Limitada X avaliar o valor do investimento em Sociedade Anônima Y, com base no método de equivalência patrimonial, decorre do art. 248 da Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que dispõe o seguinte:
<<Art. 248. No balanço patrimonial da companhia, os investimentos em coligadas ou em controladas e em outras sociedades que façam parte de um mesmo grupo ou estejam sob controle comum serão avaliados pelo método da equivalência patrimonial, de acordo com as seguintes normas: I – o valor do patrimônio líquido da coligada ou da controlada será determinado com base em balanço patrimonial ou balancete de verificação levantado, com observância das normas desta Lei, na mesma data, ou até 60 (sessenta) dias, no máximo, antes da data do balanço da companhia; no valor de patrimônio líquido não serão computados os resultados não realizados decorrentes de negócios com a companhia, ou com outras sociedades coligadas à companhia, ou por ela controladas; II – o valor do investimento será determinado mediante a aplicação, sobre o valor de patrimônio líquido referido no número anterior, da porcentagem de participação no capital da coligada ou controlada; III – a diferença entre o valor do investimento, de acordo com o número II, e o custo de aquisição corrigido monetariamente; somente será registrada como resultado do exercício: a) se decorrer de lucro ou prejuízo apurado na coligada ou controlada; b) se corresponder, comprovadamente, a ganhos ou perdas efetivos; c) no caso de companhia aberta, com observância das normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários.>>
Este resultado, no entanto, não deve ser computado para a determinação do lucro real, a teor do caput do art. 426 Decreto n. 9.580, de 22 de novembro de 2018 (RIR/18), que tem a seguinte redação:
<<Art. 426. A contrapartida do ajuste de que trata o art. 425, por aumento ou redução no valor de patrimônio líquido do investimento, não será computada para fins de determinação do lucro real, observado o disposto no art. 446 ( Decreto-Lei n. 1.598, de 1977, art. 23, caput).>>
No mesmo sentido, decidiu o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF):
<<MÉTODO DE EQUIVALÊNCIA PATRIMONIAL MEP. INTRIBUTABILIDADE. APLICAÇÃO DOS ART. 389 E 428 DO RIR/99. O MEP consiste na avaliação do investimento de uma sociedade em outra sociedade em função da participação da investidora no patrimônio líquido da investida. No caso de investimentos relevantes, o registro pelo MEP é mandatório. Através do MEP a empresa investidora reflete diretamente em sua contabilidade a variação patrimonial ocorrida na investida. Se a investida apurou lucro, a investidora contabilizará igual resultado de forma proporcional à sua participação na investida. Sendo a receita de MEP na investidora mero reflexo de lucro apurado e tributado na investida, não há que se falar em tributação da receita de MEP, conforme disposto no art. 389 do RIR.>> ([2])
A partir das premissas de que a contrapartida do ajuste do valor do investimento avaliado pelo método de equivalência patrimonial não deve ser computada para a determinação do lucro real e de que e os lucros ou dividendos pagos ou creditados por pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, são isentos do imposto de renda, não concordamos com o ponto de vista de que a proposta de devolução do capital social de Sociedade Limitada X implicará o auferimento de ganho de capital tributável por parte de seus sócios.
No caso, o ponto de vista favorável à tributação encontra suporte na aplicação por analogia de precedente do CSRF, que decidiu no sentido de que a capitalização da reserva de lucros decorrente de receita de equivalência patrimonial reduziria artificialmente a base de cálculo do imposto de renda incidente sobre o ganho de capital auferido na alienação de participação societária. Trata-se do Acórdão n. 9202-003.700 da 2. Turma do CSRF:
<<[…]. OMISSÃO DE GANHO DE CAPITAL NA ALIENAÇÃO DE AÇÕES. DUPLICIDADE DE CAPITALIZAÇÃO DE LUCROS E RESERVAS.Constatada a majoração artificial do custo de aquisição da participação societária alienada, mediante a capitalização de lucros e reservas oriundos de ganhos avaliados por equivalência patrimonial nas sociedades investidoras, seguida de incorporação reversa e nova capitalização, em inobservância da correta interpretação a ser dada ao art. 135 do Decreto no 3.000, de 1999, devem ser expurgados os acréscimos indevidos com a consequente tributação do novo ganho de capital apurado.>> ([3])
Embora respeitável, o ponto de vista favorável à tributação, no caso, não traz à luz a circunstância de que a situação de fato do caso do precedente não guarda semelhança, muito menos relevante, com a do caso concreto. Na situação de fato do caso do precedente, os acionistas alienaram a participação societária com o auferimento de ganho de capital tributável. Para reduzir a tributação, aumentaram artificialmente o custo de aquisição, por meio da capitalização da reserva de lucros, decorrente de receita de equivalência patrimonial.
De forma diametralmente oposta, na situação de fato do caso concreto, a capitalização da reserva de lucros decorrente da receita de equivalência patrimonial não constitui passo de um todo maior em direção à execução de um planejamento tributário (<<step-by-step transaction>>). No caso, a capitalização da reserva de lucros decorrente da receita de equivalência patrimonial não tem o objetivo de evitar, reduzir ou diferir a ocorrência do fato gerador: inexiste ganho de capital tributável, por razão da isenção dos lucros ou dividendos pagos ou creditados por pessoa jurídica tributada com base no lucro real, presumido ou arbitrado.
Portanto, a devolução do capital social, por parte da Sociedade Limitada X, através da cessão a seus sócios de 13.568.136 (treze milhões e quinhentas e sessenta e oito mil e cento e trinta e seis) ações ordinárias nominativas, sem valor nominal, da Sociedade Anônima Y, avaliadas contabilmente em R$ 94.678.208,90 (noventa e quatro milhões e seiscentos e setenta e oito mil e duzentos e oito reais e noventa centavos), e do direito de crédito, a título de dividendos a receber, no valor de R$ 5.269.000,00 (cinco milhões e duzentos e sessenta e nove mil reais), devidos por Sociedade Anônima Y, não implicará o auferimento de ganho de capital tributável por parte de seus sócios.
Todavia, para atribuir maior segurança à operação, antes da devolução do capital social, recomendamos que o valor de R$ 83.905.280,00 (oitenta e três milhões e novecentos e cinco mil e duzentos e oitenta reais), registrado no patrimônio líquido, a título de reserva de lucros, seja incorporado ao capital social, conforme o art. 10, § 1º, da Lei n. 9.249, de 26 de dezembro de 1995 ([4]).
S.m.j., é o parecer.
([1]) <<Art. 10. Os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no País ou no exterior.>>
([2]) Ac. n. 1201-001.618, de 10/04/2017.
([3]) Acórdão n. 9202-003.700, de 27/01/2016.
([4]) <<Art. 10. Os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no País ou no exterior. § 1º No caso de quotas ou ações distribuídas em decorrência de aumento de capital por incorporação de lucros apurados, a partir do mês de janeiro de 1996, ou de reservas constituídas com esses lucros, o custo de aquisição será igual à parcela do lucro ou reserva capitalizado, que corresponder ao sócio ou acionista.>>